Por
ocasião do recente incêndio na catedral de Notre-Dame, em Paris, circulou na
internet uma estampa, de 1956, em que era apresentada, ao estilo do tempo, uma
pintura do Sagrado Coração de Jesus, tendo nos cantos superiores do mesmo a
representação de algo parecido com a catedral de Paris e a catedral de São
Pedro, no Vaticano, ambas em chamas…
Tal
figuração seria alusiva às ‘profecias’ dadas pelos videntes Maximin e Mélanie,
na manifestação de Nossa Senhora em La Salette…uma povoação nos alpes
franceses. Com efeito, percorridas as ‘profecias’, do final do século dezanove,
aí se referia que, um dia, Notre-Dame e o Vaticano seriam consumidas pelas
chamas… Para além de alguns castigos de efeito mais ou menos imediato nos
campos e na saúde das populações, as ‘profecias’ de La Salette são algo
tenebrosas não só pelas consequências, mas em razão das causas. Pior: muitas
destas continuam ativas e atuais, podendo ser remanso para extremistas tanto
religiosos, como sociopolíticos… estenderem as suas garras, conjeturas e
suposições.
Mas será
que o incêndio da catedral de Notre-Dame pode ser lido como o cumprimento de
alguma das ‘profecias’ de La Salette? Poderemos querer confirmação de algo que
poderá ser mais do que um mero acidente? Até que ponto mais de cento e
cinquenta depois poderemos ver, neste incêndio, o cumprimento de tais
‘profecias’? Será correto, histórica e sensatamente, atribuir algum nexo de
causa-efeito, entre as ‘profecias’ de La Salette e o trágico incêndio de abril
de 2019?
Se,
porventura, dermos crédito a tais ‘profecias’ teremos de, agora, esperar que as
chamas atinjam a catedral de São Pedro, no Vaticano, corroborando a
interpretação de que o ‘mal’ tomara posse do governo da Igreja católica. Será
isto sério, sensato e aceitável? Teremos de andar a escarafunchar os meandros
da Santa Sé para confirmar tais teorias da conspiração? Será tudo isso justo,
correto e honesto?
Dá a
impressão de que, quanto mais caminhamos na senda de nos sentirmos participantes
da história deste mundo, mais surgem uns certos ‘intelectuais’ e uns tantos
‘devocionistas’ a puxarem para trás, isto é, confundirem os outros, dado que
eles mesmos estão confusos, baralhados e saudosistas em terem as pessoas presas
pelo medo e não pela capacidade de lerem, interpretarem e viverem de forma
livre, consciente e responsável…
= Mutatis
mutandis: a quem interessa continuar a insistir na ‘missa tradicional’ se vamos
perdendo clientela na missa do Vaticano II? A quem interessam certas roupagens,
para além do espavento de tempos idos e de ideias em paragem no cortejo da
vida? Não se andará em excesso a encadernar gente, que precisava de sujar mais
as mãos e não de as ter limpas de não fazerem nada?
De
facto, o recrudescimento de muitas das devoções, nos nossos dias, manifesta uma
crise profunda de identidade, tanto de quem as promove, como de tantos outros
que nelas se refugiam, tentando salvar a sua ‘alminha’, mas pouco se importando
com atanazar os demais com recursos de pouca valorização humana, emocional e
espiritual.
Pior:
muitas dessas devoções têm de ser alimentadas com proventos económicos nem
sempre claros e tão-pouco aceitáveis. Há casos em que pessoas de parcos
recursos passam mal só porque se acham na obrigação de corresponderem ao fluxo
de ‘convites’, anúncios e produtos perfeitamente escusados para quem queira ser
cristão normal e não deseje pertencer a qualquer grupo ou tendência mais ou
menos exotérica… em uso. É um abuso e violência da consciência tanta coisa que
faz por aí, explorando a ignorância das pessoas de boa fé ou em estado de
debilidade não recomendável para não respeitar…condignamente.
= A
Páscoa tem de trazer novas formas de viver a fé, despindo-a de folclores que já
não refletem a vivência que certos ritos pretendiam propor. Será numa Páscoa
que celebra a Vida e que faz dessa celebração um nexo de compromisso que
haveremos de deixar que o lume novo consuma o que de velho há em cada um de
nós. Precisamos de nos deixarmos espantar com a novidade da Páscoa de Jesus,
deixando os pingarelhos das nossas certezas no túmulo do sepultamento de Jesus.
Precisamos de sair homens/mulheres novos pela dinâmica da Páscoa da
Ressurreição…
António Sílvio Couto
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