Porquê a
pressa em querer legislar – despenalizando/legalizando – a eutanásia? Se não
constava no programa dos partidos, qual a causa desta mudança? A quem interessa
trazer o assunto – fraturante quanto baste, antes, durante e depois da
discussão/votação – para o areópago dos temas políticos? Não será este ‘assunto
de consciência’ – como alguns lhe chamam – um tema de civilização e não de mera
conjuntura?
Eis
algumas das questões escutadas e discutidas sobre a eutanásia, agora designada
de ‘morte medicamente assistida’. Nesta, como em ocasiões em que esteve em
debate e em causa o tema da vida, os defensores do ‘sim’ – ao aborto, à eutanásia
e a temas relacionados com sexo não-reprodutivo – surgem como culturalmente
mais avançados e mais humanistas do que os que se reclamam do ‘não’ mudar a
legislação ou da concretização da pretensa despenalização/legalização. Será que
temos de engolir todos os argumentos e afrontas daqueles que se julgam senhores
da verdade, que não seja a sua?
= É
verdade que desta vez o assunto só tem andado no quadro do parlamento. O
referendo talvez não mudasse nada nos resultados. Mas diga-se em leitura menos
apaixonada do assunto: a maioria que possa aprovar a mudança, poderá, mais
tarde ou mais cedo, mudar e fazer reverter o assunto, coisa que a vinculação do
referendo – os que tivemos até agora não foram não-vinculativos, dado que não
atingiram a percentagem de votantes exigida – traria com mais incidência, mesmo
que pudesse haver uma vitória pírrica.
Nos
últimos tempos surgiu, vindas de vários quadrantes, uma posição nova: quem
aprovar a eutanásia não merece o voto em futuras eleições…até porque foi
subvertido o quadro ideológico e mesmo o do programa sufragado em eleições
anteriores.
Em
grande parte concordo com esta posição: pela minha parte, que sempre votei no
mesmo partido e confiava na boa-fé dos seus dirigentes – mesmo quando a
qualidade não era tão merecedora do benefício da dúvida – que agora querem
fazer crer que são muito humanistas, só porque não lhes repugna matar a pedido
ou em aliviar a dor mais ou menos circunstancial…No mínimo isto não é sério nem
merece que se confie neles depois, quem agora nos engana, sobrepondo aos outros
o seu esquema para sobreviver nas lutas de triângulos e aventais.
= Os
meus valores dizem: a vida una e inviolável, é dom de Deus, que tenho de velar
para se desenvolva entre a conceção e a morte natural. Tudo o resto – o
intervalo entre aqueles dois momentos – deve ser para que vivamos com a melhor das
dignidades e não aos solavancos e segundo os interesses de cada etapa. Com
efeito, o tema da dignidade é hoje um conceito que tem tanto de interessante,
quanto de casuístico, pois o que para uma pessoa – grupo, setor, associação ou
mesmo igreja – é ou não digno pode ser considerado por outros como sem
dignidade e vice-versa. Por isso, trazer para a discussão da eutanásia a
dignidade de vida duma determinada pessoa, poderá ser visto como muito
diferente por outra. Bastaria incluir aqui a discussão a componente do
‘sofrimento’ para podermos estar a falar de coisas diametralmente opostas,
dependendo da perspetiva que se pode dar ao assunto, desde a mais simples até à
mais espiritualizada. Será que alguém cresceu na sua personalização sem
sofrimento, dificuldade ou dor? E isso foi razão para desistir de viver, como
se propõe na dita ‘morte medicamente assistida’?
Nesta
como noutras circunstâncias de discussão sobre temas atinentes à dinâmica da
vida, falta serenidade e seriedade em muitos/as dos intervenientes e nem a
comparação com outros países onde o assunto foi introduzido na vida social e
cultural tem servido para que haja ponderação e amadurecimento sem ataques a
quem pensa e age de modo diferente daquele que se julga maioritário…
= O
futuro dirá se esta iniciativa em querer impor a eutanásia não se voltará
contra os mentores, defensores e legisladores. Não esqueço a nota já referida
noutra ocasião em que uma das maiores paladinas da eutanásia, quando caiu
doente, o que pedia era que não a deixassem só e tanto quanto consta não
recorreu à estratégia da ‘morte doce’…tendo inclusive tido ritos religiosos,
que não apreciava tanto assim em público. Dá a impressão que há gente que diz
uma coisa, mas na sua hora da verdade tem outro comportamento…
António
Sílvio Couto
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