Nos
tempos que correm cheira a ranço o desfile das canções do (dito) festival da
eurovisão, não só pela manifesta falta de qualidade das mesmas, mas também pela
incongruência dos meios usados que não se repercute na inovação musical
desejável… Custa a crer que ainda haja quem aposte numa coisa tão lerda –
vagarosa, apática, de raciocínio lento, acomodada, sem iniciativa – e faça
disso um acontecimento de grande alcance…televisivamente com um grande
share/audiência…à falta de melhor noutros canais.
Houve
quem tenha criticado o evento recente, passado em Portugal, mas pareça
excluir-se de que foi a sua prestação – tão badalada quão manipulada – que
trouxe esta miséria – musical e artística – cá para dentro…
Olhando
para a prestação das votações, já lá vai o tempo em que as afinidades políticas
e geográficas se exprimiam nessas votações pelos concorrentes em vizinhança…
Até isso deixou de ser benéfico para tantos, sobretudo para as nossas
cançonetistas, classificadas em último lugar com uma prestação, nitidamente,
sem glória nem honra…
Quem
tenha somente lido o que foi dito – como é o meu caso – e não tenha seguido as longuíssimas
horas de emissão da televisão estatal, terá ficado a saber que foram gastos, na
organização do festival, 20 milhões de euros…à mistura com os suficientes
proveitos hoteleiros e turísticos, sem esquecer a publicidade ao país e tantos
outros ‘benefícios’ ao menos por alguns dias.
A
vitória duma canção israelita já começou a fazer fervilhar contendas políticas,
colocando alguns países a hipótese de boicote por ser onde se espera que possa
acontecer. Muita coisa decorrerá, por certo, até à data do novo festival da
eurovisão, mas será de aprender com os erros praticados, este ano, sem
deixarmos de questionar a confluência imprevista da vitória do ano transato… A
qualidade continua excessivamente fraca para que não se pretenda considerar que
a classificação portuguesa deste ano é, de verdade, o retrato da nossa
mediocridade artística e cultural…Basta de tentar disfarçar!
=
Algumas questões nos pode levantar a polarização em volta dum acontecimento que
bem espremido pouco deixa de substancial e do adjetivado são parcos os
qualificativos.
* Os
meios usados têm correspondência nos resultados – muito mais do que meramente
económicos – obtidos?
* As
apreciações intentadas antes, durante e depois do evento não sofrem dalguma
moldura preconcebida e onde alguns estereótipos se não encaixam podem ser
matéria para exclusão da qualidade e não da promoção? * Como dizia um
concorrente vencido – depois da mulher de barba, veio a galinha cantante – não
andaremos a fazer de coisas como esta um estendal de mau gosto e de
insuficiente valor no espetro europeu e mundial?
* Não
será este o critério para que haja um produto desta qualidade: não andaremos a
endeusar a música, fazendo desse culto uma religião transnacional e uma
obsessão onde se nota a categoria de novo ópio do povo?
Os
artefactos em uso em tantos festivais de música – são às dezenas em cada verão
– podem-nos fazer crer que a música se tem vindo a tornar em algo mais do que
uma arte, mas antes uma produção muito especial para consubstanciar naquilo que
arrasta multidões, gera e gere milhões, com muitos outros campos de atividade
que lhe estão adstritos…uns legais e tantos outros subterrâneos. Tudo isto com
uma difusão à medida das comunicações atuais e com os meios cada vez mais
sofisticados para aliciarem novos adeptos e consumidores. Talvez nem tudo sejam
tão limpo como se pretende fazer acreditar. Talvez nem sempre se vejam todos os
contornos do mundo da música. Talvez ainda andemos, uma boa maioria, a ser
embalados por ritmos que nos querem adormecer e iludir com melodias de enganar.
Quando
tanta coisa se estuda e esmiúça, parece-me que seria muito útil estudar mais a
fundo o que faz a música tão especial neste tempo eivado de futilidades, de
modas e de tendências. Assim haja coragem e vontade de aprender com tudo isto
que se vê e tanta outra coisa que não se consegue ver em primeira olhada. Com
efeito, depois da canção-mensagem, precisamos de discernir qual a mensagem da
canção…e da música que a suporta!
António Sílvio Couto
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