‘Lealdade’
significa a qualidade de alguém que é leal. ‘Leal’ tem origem no termo latino
‘legalis’, estando, por isso, relacionado com o conceito de lei. Assim leal
seria alguém em quem era possível confiar e que cumpria as suas obrigações
legais, não faltando aos seus compromissos, demonstrando responsabilidade,
honestidade, retidão, honra e decência… Podem ainda tomar-se como sinónimos de
lealdade termos como fidelidade, dedicação e sinceridade.
Ora,
diante de certos acontecimentos e situações; perante várias circunstâncias e
casos; tendo em conta inúmeros comportamentos e atitudes…poderemos questionar
se a lealdade será virtude/qualidade que norteie tanta gente, desde os aspetos
mais simples e privados até aos mais complexos e públicos…
Talvez
hoje se viva mais num clima de desconfiança, onde os outros se tornam, com
relativa facilidade, mais adversários – e, nalguns casos, até inimigos – do que
parceiros duma caminhada, onde todos teremos a aprender uns com os outros,
desde as facetas mais normais e quase impercetíveis até às mais complexas e
necessitadas de desmontagem para serem, suficientemente, compreendidas.
= Comportar-se
de forma leal será, em grande medida, integrar-se num projeto comum, onde cada
qual não reivindica para si os resultados, mas antes quer fazer parte duma ação
mais ampla e significativa. Dado que vivemos num tempo onde a ponderação nem
sempre é a forma mais comum e o bom senso dá a impressão de estar em maré
contínua de saldos, torna-se importante detetar por onde anda a lealdade,
fazendo dela uma atitude de vida e, sobretudo, um modo de estar no
relacionamento com os outros.
* Ser
leal é dizer o que se pensa e pensar o que se diz. De facto, muita gente
reclama que diz o que pensa, mas nem sempre pensa o que diz. Quantas vezes é
preciso dizer pouco, sabendo muito mais do que aquilo que é referido…
* Ser
leal é saber calar, quando se não tem a certeza daquilo sobre o qual se é
chamado a pronunciar-se. Quantas vezes o silêncio é a forma mais sábia de
falar, mesmo que possa parecer um tanto atribulado pelo constrangimento em
dizer só o que se sabe e nada mais…
* Ser
leal é saber tomar posição, mesmo discordando, sem com isso ofender o oponente
nem tão pouco faltar à verdade. Quantas vezes se pretende impor uma posição
menos bem amadurecida e com isso pode-se arriscar a ser menos ponderado e
sensato…
* Ser
leal é ter por grande desejo a valorização dos outros, sem que com isso se viva
na adulação nem tão pouco em fazer-se passar por ‘amigo’, quando se anda a
levar-e-a-trazer. Quantas vezes deveríamos conjugar o verbo escutar nas suas
formas mais variadas, nos tempos mais diversos e nas proposições mais
reflexivas…Como pode alguém ser digno de crédito se passa o tempo a maldizer e
a difundir maledicência?
= A
palavra ‘leal’ aparece no brasão de armas de, pelo menos, três cidades em
Portugal: Porto, Évora e Lisboa…como que a realçar o vínculo de tais cidades e
outras, como Macau, onde o espírito português se foi desenvolvendo sob o signo
da lealdade, tanto das gentes como do vínculo histórico a momentos
significativos do seu passado…
Será que
a lealdade continua a ser critério pelo qual se pautam os governantes dessas
cidades apelidadas de ‘mui nobre e sempre leal’? Poderemos contar com a
exaltação dos valores da lealdade, quando isso implica liberdade e respeito
pelos outros? Até que ponto não será de cultivar estes valores da lealdade, da
responsabilidade e da honestidade…sem ser em conotação ideológica, mas como valores
éticos, muito para além dos meramente republicanos e laicos?
Neste
século XXI, que foi proclamado como dos ‘valores éticos’ por teólogos e ávido
de sinais de bom senso, bem como de convivência entre os povos, torna-se, cada
vez mais claro, que temos de encontrar mais aquilo que nos une e menos aquilo que
nos separa, tentando discernir o essencial e depreciando o secundário. Ora, a
lealdade é e deve ser algo que nos faça encontrar na luta, mas também na
fraternidade; algo que exige de nós compromisso em criar uma corrente de
sabedoria, descobrindo tanto daquilo que nos humaniza e abjurando muito daquilo
que nos bestializa…a começar em nós mesmos!
António Sílvio Couto
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