Parece
que quem pretenda ser falado – padre ou leigo, cristão ou agnóstico…seja qual
for a religião ou a tendência ideológica – poderá dizer umas coisas – sobretudo
contra – sobre Fátima e logo anda nas bocas do mundo…mesmo que por efémeros
segundos de menos boa fama.
Quem
recorda ainda a petição lançada, em outubro do ano passado, contra a visita do
Papa a Fátima agora em maio? Acabei de consultar a adesão – ou foi antes
visita, como eu, por curiosidade – conseguiu o número de 1.070 (mil e setenta) peticionários…
Por
estes dias um ex-membro dum governo estendeu-se nas suas considerações contra o
que aconteceu em Fátima há cem anos e muito daquilo que, desde então, foi
vivido por milhões de pessoas, crentes ou não… O tal articulista-deputado não
deixou de mostrar, minimamente, o ferrete do avental, tal era a argumentação
triangular, mas deixando perceber que o texto pareceu mais sermão por
encomenda…do que contributo de reflexão intelectual séria, sensata e serena.
= Quem se
fizer visitador de Fátima – santuário e recinto, basílicas e capelinha, zona
próxima e espaços envolventes…até comerciais e de restauração – é tocado pela
expressão de tantos e tão díspares peregrinos. Mas quem entrar naquele espaço
restrito ou alargado em atitude de peregrino é confrontado com milhentas
vivências de pessoas, de famílias, de situações e de problemas… A questão é
essa: Fátima tem uma policromia de espiritualidades, em que cada um precisa de
ser visto, acolhido e sentido como cada qual…
Mal vai
a nossa sintonia com Fátima se houver quem pretenda impor aos outros a sua mais
pessoal (íntima ou intimista) experiência. Por isso, não se pode dar lições nem
tão pouco fazer nivelar por si o que faz parte do património humano e cultural
de tantas fés… mais ou menos conscientes, mais ou menos cristãs, mais ou menos
católicas.
= Mesmo
que à sombra da ‘revolução de abril de 74’, Fátima continua a ter sentido e a
dar identidade ao nosso parco país. Quem não terá já tido a vivência, no
estrangeiro, de lhe ser perguntado de onde é e não saberem onde fica Portugal,
mas logo percebem donde somos e quem somos, se dissermos que somos do país onde
está Fátima.
A
política dos três ‘fês’ – fado, futebol e Fátima – não foi invenção do Estado
novo para entreter e camuflar as oposições ao regime. Tal como tão sabiamente
disse o senhor cardeal Cerejeira: não foi a Igreja que impôs Fátima, foi Fátima
que se impôs à Igreja…
Neste
tributo de centralidade, poderemos entender o incómodo de certas forças que se
viram vencidas pela promessa da Senhora vista pelos pastorinhos. Talvez seja um
tanto confrangedor que se pretenda combater a quem não se reconhece existência
nem possível credibilidade. Talvez possa ser um tanto quixotesco que ainda se
dê ouvidos a pessoas que nada seriam se não andassem em busca dos seus
fantasmas alumiados pelo fenómeno de Fátima…em Portugal e no mundo.
= Ainda
temos, cem anos depois, um longo caminho a percorrer para irmos passando da
religião natural – das velas, das promessas, das situações meramente humanas e
até algo mundanas – à capacidade de interpelação pelo Evangelho que Fátima e a
sua mensagem nos trazem continuamente. Também aqui precisaremos de estar mais
perto daqueles/as que fazem da sua ida a Fátima a sua expressão religiosa sem
comunidade de fé. Também aqui precisaremos de passar do culto do sacrifício –
desde o mais simples até ao percorrer de quilómetros a pé – mais ou menos por
si mesmo e pela sua salvação individualista para a capacidade de aproveitar
tudo o que me proporcionar oferecer em sacrifício pela salvação dos outros e do
mundo pecador.
Queira
Deus que a celebração do ‘centenário das aparições’ não se fique só pelas
coisas exteriores, mas antes consigamos todos viver um processo de conversão,
aproveitando as críticas que nos possam fazer, desde que sinceras e
bem-intencionadas.
Como
dizia um padre (já falecido) num título dum livro contrapondo ao de outro (mais
acintoso): Fátima, nunca mais ou nunca menos? Sim: Fátima sempre mais cristã e
católica!
António Sílvio Couto
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