Quem
visite o nosso país e quem leia ou veja notícias deste torrão à beira mar
plantado poderá ser levado a concluir: vive-se num país onde não há greves, não
se verifica contestação a nada nem a ninguém – no sentido político – e até
certas instituições tão intervencionistas, como o tribunal constitucional ou
mesmo a comunicação social vivem num quase anonimato e sem se dar por eles…
Fique
claro que não sou defensor da alteração da ordem pública ou do conflito sem
mais, antes pelo contrário, advogo que se procure viver e fazer por viver em
harmonia e concórdia entre todos, particularmente para com os que pensam de
forma diferente, defendendo o direito à opinião, com liberdade e
responsabilidade.
Mas o
que me faz confusão é esta hibernação de sindicatos – em especial em setores
tão atribulados como os transportes, a educação, a saúde ou mesmo a segurança
(social ou de ordem pública) – e um certo fenómeno de eucaliptização duma
grande parte dos contestatários e seus sequazes, bem como uma espécie de
amorfismo em que estamos a viver coletiva e individualmente.
Sabemos
como o eucalipto seca tudo em volta de si, sugando as fontes de alimentação até
ao mais profundo da condição ambiente à sua volta. Não será isto que está a
verificar-se com certas forças ideológico-partidárias? Conseguidos os intentos
de atingir o poder, não há como saber calar e manietar quem não alinha nas
pretensões ansiadas… Vemos que, hoje, quem achava pensar de forma diferente da
maioria dominante ficou sem espaço de intervenção e nem mesmo uma dita
comunicação extra-regime se faz eco de qualquer discordância, por mais subtil
que possa insinuar-se…
= Ao nível
do mais alto dignitário da nação vemos que tudo está conciliado e nota-se um
clima conciliador… com cheiro a populismo. Mas será que é isso que o resto dos
cidadãos precisam? Onde está a voz tribunícia, que se ergue em defesa de quem
não se revê neste sistema de condução dos destinos coletivos? Não foi para isto
que foi eleito o presidente da república para ser uma espécie de caixa-de-ressonância
dos interesses partidários instalados na governação por acordo nas catacumbas
do parlamento… Não foi para vermos como porta-voz de conluios entre forças
patrióticas de internacionalismos, que o mais alto dignitário se limita a não
fazer ondas nem a assumir-se efetivamente como defensor dos mais fragilizados,
antes a ser visto como comensal duma parte do eleitorado, que nem foi o dele…na
origem.
=
Cresce, entretanto, uma onda de individualismo por entre as posições da maioria
dos cidadãos nacionais. Já lá vai o tempo dum certo idealismo da partilha, que
caraterizou os primeiros anos após a revolução abrilina. Excluindo os exageros
de tantos que se aproveitaram da inépcia duma parte significativa da população,
houve tempos em que éramos um povo mais solidário e nem os atropelos cometidos
por uns tantos habilidosos deixou de gerar uma força de atenção aos outros e,
sobretudo, aos mais desfavorecidos. Dessa época já restam poucos desses
idealistas…com tino e bom senso.
Hoje
vivemos – num galopante sentimento de incómodo – mais fechados aos outros,
nesse egoísmo individualista que coloca o eu em primeiro lugar e só no final da
lista os outros…mesmo familiares. As remessas de fundos vindos da Europa – com
mais fulgor na década de 90 do século passado – foram-nos tornando mais e mais
refinadamente interesseiros, fechando as mãos e cerrando os punhos, que antes
eram de contestação, para se irem tornando sinais de posse e de possessão
endeusada de bem-estar ou de exaltação dos direitos…adquiridos, sabe-se lá com
que legitimidade.
Nalguns
casos nem as instituições e os responsáveis religiosos ficaram à margem desta
onda de materialismo prático, já que os resquícios do pragmatismo dialético
foram sendo aveludados com promessas e recebimento de subsídios ao
não-trabalho. Quanta habilidade foi emergindo em tantas situações, que
descobertas mais tarde, se tornaram focos de escândalo e matéria de más
notícias…
Efetivamente,
a hibernação eucaliptal tem vindo a ser conduzida – ou será manipulada? – sem
nos darmos conta com clareza, podendo cada um de nós correr o risco de pensar à
maneira do modo como vive e não a viver à maneira daquilo que pensa… com
valores e critérios mais humanos porque mais cristãos!
António Sílvio Couto
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