Parece
que não há canal televisivo – em sistema aberto ou por cabo – onde não apareça,
de forma habitual ou circunstancial – um programa onde se cozinhe, se aprenda a
fazê-lo melhor ou mesmo onde sejam avaliados os confecionadores e aquilo que é
cozinhado… E, assim, de repente, a arte da cozinha virou moda e o comer – mais
o bem do que o muito – um atributo cuidado e valorizado pelos entendidos na
matéria e mesmo pelo grande público.
= Qual
poderá ser a razão desta efervescência sobre a matéria da cozinha e da comida?
Que temos agora de tão importante para estarmos a interessar-nos por uma das
mais básicas necessidades humana, o comer? Andaremos ainda a resolver o
essencial, quando julgávamos estar noutra fase evolutiva da sociedade? Com
tanta exaltação da arte de cozinhar, estaremos a atender a quem não tem ainda o
mínimo para comer, no seu dia-a-dia? Porque é que os cuidados de alimentação
não se repercutem na qualidade de saúde, de forma mais generalizada? Até onde
irá esta ‘religião da comida’, com tantos gurus e mentores avalisados? Não será
que muita gente vive mais para comer do que come – melhor ou menos bem – para
viver?
= Não
deixa de ser, suficientemente, sintomático que muitas das festas religiosas de
teor tradicional, sobretudo, de âmbito cristão, sejam mais aferidas pela
gastronomia do que pelas razões que levam a usar tais ingredientes, condimentos
e pitéus… Talvez nem toda a gente atenda, por exemplo, que o cabrito – ou
noutras regiões o borrego, o anho ou outra denominação – tem raízes na tradição
da páscoa judaica, que, por seu turno, se alicerça na experiência libertadora
da páscoa egípcia… Precisamos, com toda a urgência, de passar daquilo que
reputamos de tradicional para o que dá sentido às coisas e aos (pretensos)
momentos de festa… ou ficaremos a usufruir das consequências sem aceitar –
racional e razoavelmente – viver as causas. Dá a impressão que a comida vai-nos
preenchendo, mesmo sem sabermos os motivos mais profundos…
= Neste
mundo globalizado estão como que criadas as condições para sabermos elevar a
componente humana e cultural da vertente da gastronomia, fazendo-a subir ao
patamar de ação que faz das pessoas alguém mais fraterno/solidário e não
meramente comensal de ocasião. Com efeito, a proliferação de restaurantes tem
vindo a destruturar a família, tornando-a um mero espaço onde já nem se
cozinha, com as consequências de a casa de habitação se ir esfriando, pois o
lugar da confeção dos alimentos deixou de irradiar o calor físico e, por vezes,
humano compartilhado entre todos. De facto, se se apagar a lareira como irá
subsistir o lar? Este faz-se, alimenta-se e cimenta-se à volta daquela… aí onde
as estórias de todos são assimiladas por cada um e onde cada qual se torna
construtor de algo que faz e dinamiza a sua família. Por isso, alimentar-se à
mesma mesa não pode ser uma exceção, mas a exceção é que nunca poderá deixar de
ser a regra…
= Sem se
pretender encontrar culpas nem ir à caçar de culpados, parece que temos – digo,
particularmente, de forma cristã – de valorizar cada vez mais a mesa de
família, revendo métodos e tratando de cuidar as razões que têm vindo a criar
crises à família, começando pelo mais simples e fazendo o esforço por fazer das
refeições os momentos mais sagrados de cada dia, sem aceitarmos desculpas ou
outros artefactos sociais, associativos ou mesmo eclesiais. Neste tempo tão
agressivo para com a família, vigiemos para que não se introduzam venenos nem
vícios que poderão trazer consequências devastadoras no presente e no futuro
próximo. Encontradas algumas das razões em estar contra a família, tentemos ser
corajosos e ponhamos em prática as medidas que salvaguardem a nossa família…
Não aconteça de estarmos todos à mesma mesa, mas fazendo cada qual conversa
através do tlm ao longe ou mais perto…
Por
certo cada família tem uma especialidade gastronómica que todos apreciam.
Recorramos a ela para vivermos mais unidos e familiarmente em maior comunhão! Façamos
festa à mesa do nosso lar e a nossa família sem manterá mais viva e com vida…
António
Sílvio Couto
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