Uma das
imagens mais simbólicas do tempo da semana santa é a representação de Nossa
Senhora das Dores: ela está presente em tantos dos momentos de religiosidade
(procissões de Passos ou teatros populares) e resume a vivência, por
excelência, da Mãe para com seu Filho no mistério da sua
paixão-morte-ressurreição.
Se
atendermos ainda ao tema da família poderemos ver com mais acutilância as dores
da Senhora da Soledade, da Piedade, das Angústias… a ‘Mater Dolorosa’, se bem
que Ela seja a expressão de tantas das dores da própria família.
Seguiremos,
por contraste, a narrativa de São Paulo aos coríntios (1 Cor 13,4-7) para
tentarmos aglutinar em sete (numa visão tradicional) as dores da Senhora
naquilo que à família diz (ou pode dizer) respeito: ira, inveja, orgulho,
mentira, violência, ofensa, vingança… por contraste com paciência,
aceitação/tudo espera, confiança/humildade, verdade/tudo crê, amável/sem
violência, perdão/amor, paz/tudo desculpa, tudo suporta.
Na
exortação apostólica pós-sinodal ‘A alegria do amor’ (n.os 89-119), o Papa
Francisco faz uma leitura muito pertinente sobre cada uma destas caraterísticas
do amor humano e espiritual, colocando algumas diretrizes para vivermos na
consonância da potencialidade com que os cristãos podem e devem viver a sua
relação uns com os outros e todos em sintonia com Jesus na Igreja católica…
Respigaremos
algumas dessas vertentes na consolação que queremos dar e receber de Nossa
Senhora, passando das suas dores à vivência do amor em família, como família e
para a família.
As dores
da família repercutem-se na Senhora da Soledade, que continua a acompanhar,
hoje, todos quantos se sentem submetidos às mais rudes provações, muitas delas
no seio da própria família e outras geradas e acentuadas pelos critérios
mundanos com que, de tantos modos, nos vamos socorrendo e enganando…mesmo sem
disso nos darmos conta.
* À ira contrapomos a paciência – «Uma
pessoa mostra-se paciente, quando não se deixa levar pelos impulsos interiores
e evita agredir» (n.º 91) – Entregamos à mãe das dores as situações de
agressividade, para que a família não seja, hoje nem nunca, um campo de batalha
sem vencedores…
* À inveja propomos a aceitação, tudo esperando
– «A inveja é uma tristeza pelo bem alheio, demonstrando que não nos interessa
a felicidade dos outros, porque estamos concentrados exclusivamente no nosso
bem-estar» (n.º 95) – Apresentamos à mãe das dores quantas amarguras e desesperos
que consomem as famílias, criando, por vezes, menos boa aceitação uns para com
os outros…e entre si.
* Ao orgulho contrapomos a confiança pela
humildade – O ‘amor não é arrogante’… [isto é] não se «engrandece» diante
dos outros; mas indica algo de mais subtil» (n.º 97) – Na medida em que todos
se aceitam e onde todos se procuram servir com estima, sinceridade e admiração…
* Perante a mentira propomos a verdade/tudo
crê – «Como se diz muitas vezes, para amar os outros, é preciso primeiro
amar-se a si mesmo» (n.º 101) – Com a Senhora da Soledade queremos aprender a
amar mais os outros do que desejando ser amado, sendo transparentes uns com os
outros, vivendo e dando liberdade sem aprisionar ninguém…nem pelo pretenso
amor.
* À violência (interior e exterior) responder com amabilidade – «Para
restabelecer a harmonia familiar basta um pequeno gesto, uma coisa de nada. É
suficiente uma carícia, sem palavras. Mas nunca permitais que o dia em família
termine sem fazer as pazes’» (n.º 104) – Entregando à Senhora das Angústias as
agruras da família poderemos viver a cortesia como escola de sensibilidade e de
altruísmo com pequenos gestos de ternura e carinho entre todos…sem distinção
nem preconceitos.
* Combater a ofensa com o perdão/amor – «O
perdão fundado numa atitude positiva que procura compreender a fraqueza alheia
e encontrar desculpas para a outra pessoa» (n.º 105) – Será com a Senhora da
Piedade que poderemos viver a dinâmica de sermos perdoados e de termos
capacidade de perdoar a nós mesmos e uns para com os outros… porque todos
perdoados por Deus.
* À vingança contrapomos a paz, tudo
desculpando e tudo suportando – «O amor não se deixa dominar pelo
ressentimento, o desprezo das pessoas, o desejo de se lamentar ou vingar de
alguma coisa» (n.º 119) – Quem melhor do que a Senhora de-ao-pé-da-cruz para
nos ensinar a paz e o abandono nas mãos do Pai, por Jesus, no Espírito Santo!
António Sílvio Couto
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