Nas
primeiras horas de novo ano surgiram imagens de ‘banhos de mar’ em vários
pontos do país – de norte a sul – incluindo a prestação solitária do presidente
da república…com quase quatro décadas de iniciativa. Dumas dezenas até às
várias centenas, passando por uns poucos com história mais recente foi um ver
de afoitos a mergulharem nas águas do mar, incluindo pelas causas mais
diversificadas…
É verdade
que não sabemos quais os efeitos que tais proezas trazem aos participantes.
Poderemos auspiciar que devem ser benéficas, pois a repetição (anual e não só)
pode ser o melhor crédito para que se faça algo de bizarro e um tanto a destoar
do resto da população… em contraste com o recorrer em catadupa às urgências
hospitalares com sobrecarga de procura e insuficiência de resposta.
= Ao
vermos outras imagens dos festejos – na rua e nos espaços privados, com
organização prévia ou com grandes gastos do erário público – do final-do-ano e
da receção ao novo ano, parece que se vive uma confluência social de grande
alcance…sem lamúrias nem despesas, com música a rodos e regados com muito
álcool…ocasional ou programado.
Dá a
impressão que uma (possível) ínfima minoria se interroga sobre estes
espetáculos de luz e som, de cor e de alienação – senão pessoal ao menos
coletiva – onde parece que se faz festa, mas se não sabe quem é,
verdadeiramente, o festejado… Dá-se vivas, a quem? Exalta-se e exulta-se, quem?
Festeja-se um alguém anónimo…qual entidade sub-reptícia, sem rosto e sem
identidade…
Muitas
das rolhas ‘glorificam’ algo que não se sabe quem é nem onde está… Com efeito,
este ‘mito’ anónimo e desconhecido tem honras de festança, mas dilui-se por
entre a multidão eufórica e um tanto anestesiada pelos eflúvios exalados do
néctar de Baco, com trejeitos à celebração retardada de Dionísio…
= Quem
não entrar nesta onda, como que poderá questionar-se sobre as razões e os
objetivos de tais vivências. Quem se distanciar um tanto – e nem será preciso
fazê-lo por repulsa ou por discordância – de tais festejos, corre o risco de
entrar em questionamento sobre tudo quanto vê à sua volta…A envolvência –
social e de consumo, crescente e de (quase) paganismo – como que faz os menos
fervorosos sentirem-se à margem, se não da mentalidade, ao menos duma certa cultura
reinante e mais ou menos abrangente…
= De vez
em quando, lá surgem vozes que tentam explicar tais festejos, enumerando as
expetativas para o novo ano… Na sua maioria são ainda de teor muito subjetivo e
de motivação primária: saúde, dinheiro, melhores condições económicas, anseios
de satisfação imediatista…projetos a muito curto prazo à mistura com
reivindicações antigas e não-resolvidas como habitação, emprego, segurança
(social e de policiamento)…de forma direta ou atendendo a terceiros…
=
Nota-se, por outro lado, uma espécie de intervalo na celebração religiosa de
tal data. Muitos dos que foram preparando – mais ou menos convenientemente – a
celebração do Natal, esfumam-se dos espaços comunitários de religião. Outros
parece que suspendem o ritual um tanto cristão e mergulham na apatia geral
senão mesmo na idolatria epicurista… Como referia o Papa na mensagem para o 50.º
‘dia mundial da paz’ falta-nos maior capacidade de acolhimento de Jesus, que é,
de facto, a resposta aos anseios do nosso coração… Mas, se vemos tanta deserção
dos que se dizem discípulos de Cristo, como poderemos credibilizar a mensagem
d’Ele?
Dá a
impressão que ainda nos regemos por uma visão de religiosidade de verniz, que,
quando estala, logo deixa perceber o caruncho sobre o qual estava (ou está)
alicerçada. É forte a sedução do mundo e pálida a convicção de tantos/tantas
que percorrem os espaços duma certa fé, que mais parece uma loja de conveniência
– cada um vai onde lhe dá mais jeito e onde se escuta o que menos incomoda – do
que de caminhada em compromisso com as razões mais profundas da existência e da
crença…
Para
todos desejamos um ano de bênção e de paz…em Jesus, por Jesus e com Jesus, na Igreja,
pela Igreja… em expressão católica!
António Sílvio Couto
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