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terça-feira, 31 de dezembro de 2024

Segurança versus liberdade? – Nova confrontação

 

O equilíbrio entre estas duas forças, ideais ou valores – segurança e liberdade – torna-se, por vezes, de difícil conjugação até porque uma e outra quase se têm tornado antíteses político-ideológicas: a segurança conotada com as forças (ditas) de direita e a liberdade mais aplaudida pela (rotulada) esquerda. No entanto, de forma regular são colocadas em confronto como se uma tenha de ter precedência sobre a outra e não sejam conciliáveis no seu antagonismo subliminar.

1. Quando é realizado algum serviço mais musculado para afirmar a segurança logo emergem os defensores da liberdade para que esta não possa ser ofendida na sua ínclita demonstração ética, sobretudo se for republicana. Com efeito, os mesmos paladinos da exaltação da liberdade tornam-se beneficiários da segurança para que a liberdade não seja ofendida nem beliscada. Pior é quando esses intrépidos mentores da liberdade se esquecem que foram alguns dos maiores securitários do Estado que suspenderam a liberdade para prosseguirem os seus intentos ditatoriais… Será sempre de trazer à memória os acontecimentos dos regimes alicerçados na ideologia marxista-leninista-trotskista, como no ex-bloco de leste europeu (até 1989), nalguns países latino-americanos (ainda em vigor) ou mesmo em certos regimes do extremo oriente: a liberdade foi subjugada pela segurança estatal…



2. Efetivamente a liberdade é uma das marcas essenciais da condição humana, tão preciosa que corre o risco de ser mais apreciada quando dela somos privados, tanto pessoal como coletivamente. No entanto, este valor não pode – como tantas vezes acontece – ser absolutizado e tornado como um critério individualista. De facto, temos assistido a uma exaltação quase doentia da liberdade, onde parece que cada um se torna ‘rei’ do seu mundo, fazendo vassalos os que gravitam à sua volta, quais borboletas em volta da luz incandescente.



3. Nota-se, em situações mais do que seria desejável, que as pessoas se consideram intocáveis nos seus direitos e pouco atentas ou quase negligentes quanto aos seus deveres para com os outros. Um exemplo meramente factual é o respeito (ou não) pelo silêncio na convivência de moradores/vizinhos: de uma forma quase rural há quem se ache no direito de impor as suas músicas e gostos, sem cuidar em ter atenção àqueles que vivem a seu lado… Certos conflitos de vizinhança poder-se-iam evitar se cada um tivesse para com os que ocupam os espaços contíguos à sua residência. Casos há que a própria ‘habitação social’ precisaria de melhor processo de integração de quantos, sem disso terem culpa nem o pedirem passaram, a viver sob o mesmo teto, isto é, no mesmo prédio…



4. De pouco valerá a liberdade usufruída se não houver segurança, se vivermos na incerteza em não podermos estar sem preocupações para com quem nos cruzamos e com quem temos de fazer as nossas tarefas quotidianas ou excecionais. Aquilo que se considera como a segurança de pessoas e bens é um valor também e deve ser vivida e sentida numa sociedade bem organizada ou estruturada. Perante riscos e perigos precisamos de ter a certeza de que somos respeitados todos, sem exceção. Por isso, cheira a populismo barato e demagógico defender uma liberdade sem segurança e uma segurança sem liberdade: uma e outra são o equilíbrio de sociedades alicerçadas na sã convivência e correta harmonia entre todos.



5. «A liberdade é um tesouro que só é verdadeiramente apreciado quando o perdemos. Para muitos de nós, habituados a viver em liberdade, muitas vezes parece mais um direito adquirido do que um dom e uma herança a ser preservada. Quantos desentendimentos em torno do tema da liberdade, e quantas visões diferentes se confrontaram ao longo dos séculos! (…) Para sermos verdadeiramente livres, precisamos não só de nos conhecer a nós mesmos, a nível psicológico, mas sobretudo de sermos nós mesmos verdade, a um nível mais profundo… A liberdade deve inquietar-nos, deve continuamente fazer-nos perguntas, para que possamos ir cada vez mais a fundo no que realmente somos» (Papa Francisco, ‘Audiência geral’, 6 de outubro de 2021). Seremos seguramente livres?



António Sílvio Couto

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