Causou grande alarido a posição de uma autarca da zona de Santarém quando disse que a sua autarquia ia passar a avaliar os sinais exteriores de riqueza das famílias que se candidatem à atribuição de subsídios escolares. A questão tem tanto de simples quanto de normal, mas deixou em polvorosa elementos do seu partido e como que se submeteu a um labéu popular... de tantos outros, mesmo autarcas.
1. Vejamos, citando, as palavras da senhora autarca, proferidas num reunião de câmara e que serão submetidas a votação da assembleia municipal ainda neste mês de dezembro. «Quem vai avaliar é a autarquia. Os sinais exteriores de riqueza são sinais visíveis, saltam à vista, são situações que são conhecidas de toda a gente. Por exemplo, uma família que tenha um carro de alta cilindrada, que custa 30 ou 40 mil euros (...) ou um telemóvel que custa mais de mil euros. Há critérios que a lei impõe e há critérios que eu determino. O município determina que nestas situações devem ser valorados estes sinais... Há famílias que têm sinais de riqueza muito evidentes, que depois ocultam nas declarações de rendimentos».
2. Por que será que se geraram tantas e tão díspares reações? O que a senhora disse é evidente, pois os subsídios são para quem precisa e não para quem engana, o público e/ou as finanças... Será que alguns dos reacionários (isto é, os que reagiram) se viram denunciados num comportamento a descondizer da teoria social que propagam? Quem não conhece casos destes e comenta, mas se cala? De conhecimento pessoal, me dá alguma repulsa a estes ‘ofendidos’, mas nitidamente prevaricadores...
3. Neste contexto convém lembrar o ‘nosso’ ditado popular: quem cabritos vende e cabras não tem, de algum lado lhe vem! Com efeito, torna-se abusivo e mesmo provocador que vejamos pessoas que ostentam ‘sinais exteriores de riqueza’, como carros, casas, adereços e vestuário, jantaradas, tendo uma profissão de razoável salário, mas aquilo que mostram – ou será que ostentam sem consistência? – não se coaduna com os proveitos-e-ganhos. E pior que isso: fazem-nos de forma desavergonhada ou querendo levar-nos a acreditar que acreditam naquilo que exibem como sendo autêntico e sincero.
4. Efetivamente falta-nos uma educação e verdadeira consciência para a participação nos destinos comuns, mesmo através do pagamento correto e honesto dos impostos, que nos são devidos. Esta mentalidade algo portuguesa de fugir aos impostos, tentando fazer justiça pelas próprias mãos, gera que vivamos num ambiente de desconfiança para com tudo e em relação a todos, incluindo o Estado. Com efeito, não se vai construir um país ou uma sociedade onde se vive no desleixo ou no engano, senão explícito ao menos tácito. Poderá ser neste aspeto tão simples quão perigoso que flutuam muitos dos ‘sinais exteriores de riqueza’, na medida em que muitas pessoas pensam enganar os outros, mas não conseguem sempre, da forma articulada e de modo consistente. Mais um ditado popular se pode aqui rifonar: a verdade é o como o azeite: vem sempre ao de cima!
5. Quando se descobre o desfasamento entre o que se mostra e aquilo que verdadeiramente se é, já foram estruturadas muitas forma de ser e de estar, criando, na hora da denúncia ou da descoberta, o tal escândalo, que parece só o próprio não admitir. Neste aspeto somos um país/sociedade de fachada, que facilmente se desmorona, se atendermos com cuidado aos sinais que suportam tal comportamento. Mais ainda tudo se cultiva como se fosse verdadeiro, embora todos conheçamos a mentira em que laboramos.
6. Recordamos novamente o aforismo: só no dicionário é que sucesso aparece antes de trabalho. Por isso, cultivemos o trabalho e poderemos ter algum sucesso...
António Sílvio Couto
Sem comentários:
Enviar um comentário