Por ocasião das comemorações do ’25 de abril’ contou-se aquilo que tinha sido guardado como uma espécie de mito do ‘cravo vermelho’ associado àquela revolução. Foram novamente reproduzidas umas declarações daquele que é considerado o executor da peleja.
Aquando
da manhã da revolução, passando pelo Rossio (Lisboa), eram distribuídas flores
– sobretudo cravos sobrantes do aniversário de um restaurante nas redondezas –
de várias cores, entre os quais vermelhos. Só estes foram destacados pelas
fotografias da comunicação social, por haver nessa coloração alguma afinidade,
dizem, com a esquerda.
Este
breve depoimento foi relembrado num programa televisivo há dias, reproduzindo
as declarações do guia-militar no terreno… Embora se tenha ouvido isso de viva
voz, ainda houve quem quisesse considerar que tal não era tão credível como as
estórias que nos têm vindo a impingir… neste quase meio século!
A
difusão do cravo vermelho no cano da espingarda teve, segundo histórias
desencantadas na memória, na receção aos carros de combate no mesmo local do
episódio referido, pois, uma senhora não tendo um cigarro, pedido pelo soldado
na chaimite, deu-lhe o que tinha: flores, que ela foi distribuindo pelos
restantes militares, imitadores do primeiro e que colocaram a flor nas armas…E,
se a senhora, de facto, fumasse?
À vista
desta explicação-narrativa poderemos considerar que a ‘revolução de abril de
74’ – efetiva e afetivamente – aloja vários arquétipos – inventados, cultivados
ou explorados – a cuja sombra se acolhem conotações nem sempre abonatórias daqueles
que delas se apropriaram, ontem e também hoje.
A quem
interessa continuar a laborar nesta mentira e com estas patranhas? A quem serve
uma tal comunicação social com tiques de não-independência, hoje como ontem?
Por que se cultiva esta censura de factos e de situações, maquilhando-os com os
mesmos retoques anteriormente contestados?
«Numerosas realidades do planeta – e mais
ainda neste tempo de pandemia – dirigem ao mundo da comunicação um convite a
«ir e ver». Há o risco de narrar a pandemia ou qualquer outra crise só com os
olhos do mundo mais rico, de manter uma «dupla contabilidade». Por exemplo, na
questão das vacinas e dos cuidados médicos em geral, pensemos no risco de
exclusão que correm as pessoas mais indigentes. (...) Na comunicação, nada pode jamais substituir, de todo, o ver
pessoalmente. Algumas coisas só se podem aprender, experimentando-as. Na
verdade, não se comunica só com as palavras, mas também com os olhos, o tom da
voz, os gestos. (...) Os discípulos
não só ouviam as suas palavras, mas viam-No falar (...). A palavra só é eficaz,
se se «vê», se te envolve numa experiência, num diálogo. Por esta razão, o «vem
e verás» era e continua a ser essencial.
Pensemos na quantidade de
eloquência vazia que abunda no nosso tempo, em todas as esferas da vida
pública, tanto no comércio como na política (...) A boa
nova do Evangelho difundiu-se pelo mundo, graças a encontros pessoa a pessoa,
coração a coração: homens e mulheres que aceitaram o mesmo convite – «vem e
verás» –, conquistados por um «extra» de humanidade que transparecia brilhou no
olhar, na palavra e nos gestos de pessoas que testemunhavam Jesus Cristo».
2. Quem ainda não viu que a
uniformidade noticiosa esconde a preguiça na busca dos casos a tratar? Quem
ainda não percebeu que tanto daquilo que vemos e ouvimos é pago com benefícios
e protagonismos? Quem ainda não descobriu agora que estão a ser usados os
mesmos métodos dos acusados pré-absolvidos?
3. Como dizia na sua
quase-inocência um candidato presidencial: será que a maioria dos que fazem a
comunicação conhecem a variações climatéricas reais para além das que lhes
apresentam para ler? A quem interessa surgir em roupagem leve se está frio ou
encapotado se o sol escalda? Os cravos podem ser tingidos!
António Sílvio Couto
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