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quarta-feira, 2 de setembro de 2020

‘Novos leprosos’ expostos em aplicação...suspeita


Lemos nas sagradas letras: «O Senhor disse a Moisés e Aarão: «Quando alguém tiver na pele uma inflamação, um furúnculo ou qualquer mancha que produza suspeita de lepra, será levado diante do sacerdote Aarão ou de um dos seus filhos sacerdotes. O sacerdote examinará a parte afectada. Se no lugar doente o pêlo se tornou branco e a doença ficou mais profunda na pele, é caso de lepra. Depois de o examinar, o sacerdote declará-lo-á impuro (...) Quem for declarado leproso deverá andar com as roupas rasgadas e despenteado, com a barba coberta e gritar: "Impuro! Impuro!" Ficará impuro enquanto durar a sua doença. Viverá separado e morará fora do acampamento» (Lv 13,1-3.45-46).
Era este o tratamento preconizado para com os leprosos no ambiente cultural do Antigo Testamento.
Por seu turno, nos Evangelhos vemos Jesus numa contínua demanda em integrar os proscritos leprosos, curando muitos deles - Mt 8,2-4; Lc 5, 12-14; Mc 1,40-44. De entre os textos alusivos à cura dos leprosos destaca-se aquele em Jesus curou dez, mas só um foi agradecer-Lhe - Lc 17,11-19. 

= Temos que a lepra era uma visão e uma vivência que deixava marcas nas pessoas, na família e na sociedade. Por isso, quando alguém era curado era reintegrado, sendo isso motivo de grande alegria pessoal e social.

Vistas as coisas nestes termos, questionemos com mais rigor o que temos andado a fazer para com milhares de pessoas infetadas, contaminadas e doentes de ‘covid-19’. Elas são os ‘novos leprosos’ não meramente no sentido religioso-social da compreensão, mas na atitude mais ou menos declarada do tratamento higiene-sanitário. Agora a declaração de ‘lepra’ tem outros ‘sacerdotes’ com conhecimentos mais científicos, embora nem sempre acertadamente humanitários… Agora a exclusão de contato com os demais é apelidada exageradamente de ‘quarentena’, reduzida convencionalmente a catorze dias com tendência para encolher, por razões dúbias, para dez… Agora vive-se num afã economicista que tem vindo a fazer da (dita) necessidade de produção um foco para apressar o desconfinamento, a descontaminação, a recuperação dos índices de trabalho…o querer mostrar serviço mais depressa do que seria desejável. 

= Por estes dias foi apresentada com parangonas de sucesso ainda mal-amanhado uma aplicação para tlm. Os gurus do artefacto garantem que tudo está controlado… Citamos a informação veiculada pela ‘sacrossanta’ DGS: «Como funciona a app StayAway Covid? O funcionamento é simples: cada utilizador que tenha testado positivo poderá inserir o código do teste na app. Depois da validação da Direção-Geral da Saúde (DGS), a aplicação irá alertar outros utilizadores que tenham estado próximos do utilizador infetado – durante 15 minutos ou mais -, sempre sem revelar a sua identidade, os seus contactos ou os de outros utilizadores.
Quando não há registo de contactos de proximidade com elevado risco de contágio, a página inicial da app apresenta uma cor verde que mudará para o estado amarelo sempre que o utilizador tenha estado próximo de alguém a quem foi diagnosticada Covid-19
». 

= Num tempo que já era de suspeição, isto não introduz ainda mais desconfiança? Numa época onde temos tido uns para com os outros atitudes de progressivo fechamento e de crescente isolamento, isto não criará ainda mais crispação para com o desconhecido?

Esta ‘aplicação’ não poderá ir nessa onda de subverter os direitos pessoais com interesses coletivos – numa neo-coletivação assaz subtil – expondo as pessoas sem pejo, desde se possa cumprir o objetivo de mostrar que controlamos tudo e todos, à custa da invasão da privacidade e dos direitos mais fundamentais, como a reserva e a confidencialidade da própria doença?

Deixo, a título de exemplo, um caso de que tive conhecimento. Um padre que foi infetado, esteve internado e está declarado ‘curado’, pretendia ser acolhido numa casa sacerdotal, mas foi-lhe negado o acesso, pois podia ser um perigo para os outros residentes…

Se fosse estória seria grave, mas como aconteceu, será o quê?

     

António Sílvio Couto

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