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quarta-feira, 16 de setembro de 2020

Ignorantes e oportunistas


Vindo de quem vem, dito como foi, explicado à sua maneira, a afirmação – ‘no que toca ao desporto, as nossas autoridades são ignorantes e oportunistas’ – é do responsável máximo do clube mais representativo da segunda cidade do país.

Contrastando a situação da maior parte das modalidades desportivas, incluindo o futebol, o tal dirigente insurgiu-se contra outras situações – de tauromaquia, concertos musical e espetáculos com comediantes, bem como eventos políticos e até religiosos – onde já há público a assistir, enquanto isso está vedado aos estádios e espaços desportivos.

Explicou ainda as razões para os dois adjetivos: Ignorantes porque não sabem reconhecer a importância social e económica de atividades que envolvem milhões de pessoas, como espectadores e como praticantes, que pagam muitos milhões de euros em impostos e que contribuem para o prestígio do país. E são oportunistas porque há certos momentos em que nunca faltam. Seja nas finais da Taça, nos jogos da seleção ou nas alturas em que se assinala algum feito relevante de um desportista português, lá estão sempre os políticos prontos para aparecer e para se colarem ao sucesso que a maior parte das vezes não ajudaram a construir”.

 

= Reconhecendo o verbo fácil daquele dirigente associativo, será que tem razão naquilo que diz e dos cognomes que coloca às autoridades – sanitárias, políticas e sociais? Efetivamente não haverá algo assaz fundamentalista na exigência sanitária quanto às modalidades desportivas? Será à falta da força da razão terá de ser usada a razão da força? Estas palavras do dirigente desportivo não soarão mais a mentira do que a denúncia em verdade, pois, noutras ocasiões também ele não procurou usar os tais ‘ignorantes’, através da sua artimanha mais ou menos oportunista? Como se poderá limpar esta espécie de conluio mais ou menos tácito entre dirigismo desportivo e responsáveis políticos, sejam autárquicos ou do governo central? Não andarão a usar-se mutuamente, admirando-se que não sejam adulados quando mais precisam? Não será este mais um habilidoso mecanismo de pressão que quer influenciar a mudança de atitude dos responsáveis que podem decidir no sentido pretendido?

 

= A fazer fé naquilo que se conta de outras paragens (ditas) desportivas, o aproveitamento de uns (dirigentes) e de outros (políticos) é algo que só escandaliza quem for de cor – clubística ou partidária – diferente daquele que está em causa, pois, parafraseando uma frase bíblica, ‘quem não tiver pecado, atire a primeira pedra’!

Haja, por isso, contenção verbal, pois as televisões e jornais têm uma coisa que se chama arquivo e com muita facilidade se pode perceber a incongruência e a falta de concordância entre o se diz/escreve hoje e o que já aconteceu num passado mais ou menos recente.

O desporto em geral e o futebol em particular têm funcionado como arma de arremesso, de conquista e de afirmação da maior parte dos regimes políticos e dos de pendor ditatorial em especial. Isso não é coisa do passado, continua hoje, só que de uma forma mais dissimulada e sob alguma forma económica. Não será isso que revela a compra de clubes por magnatas do petróleo e de outros impérios? Alguns investimentos não são uma capciosa forma de lavar dinheiro?

 

= Enquanto vivermos a fazer-de-conta que esta ‘santa aliança: política-futebol’ não existe verdadeiramente, iremos andar com dificuldade em ter palavras que não sejam de desculpa ou que mais pareçam pundonores agravados e não uma leitura atenta dos factos, das razões e das consequências. Não basta haver ‘códigos de conduta’, se os primeiros infratores forem os autores das propostas, pois saberão tornear aquilo que queriam combater…nos outros.

Importa encontrar quem são os oportunistas, onde, quando e como se manifestam…o resto será ignorância invencivelmente errónea…

Os ignorantes reinam, os oportunistas governam-se, ontem como hoje!

 

António Sílvio Couto

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