Contaram-lhe por estes dias. Alguém ia entrar numa área de serviço e ter-se-á esquecido de colocar a máscara, ao que o vigilante recomendou: ‘alembre-se de colocar a focinheira’… isto em sotaque alentejano, que foi onde o caso se passou, tem outro sabor e até a sua graça.
De
facto, este novo e imprescindível adereço da nossa vida coletiva, a máscara,
tem aqui uma boa significação: resguarda e defende, evita e cria (possível)
segurança, põe de sobreaviso e, possivelmente, torna-nos mais atentos uns aos
outros…
Na
designação descritiva de ‘focinheira’ vemos que é um acessório que visa impedir
que um animal, geralmente um cão de grande poste, morda alguma pessoa ou outro
animal enquanto é tratado, treinado ou quando realiza algum passeio em lugar
público.
Não é
isto mesmo que a máscara nos faz fazer esta figura? Não terá sido fácil colocar
o tal açaime (focinheira) no animal potencialmente agressivo, como também não
tem sido de boa vontade que colocamos a máscara, aquando do contacto com os
outros.
Agora
que nos taparam a boca e condicionaram o nariz, torna-se necessário aprender a
viver neste novo normal, pois já se verificam alguns defeitos no trato social.
Julgando que os outros ouvem menos bem – talvez se considerem a bitola na
audição – há pessoas que falam ainda mais alto do que anteriormente, dando a
entender que a máscara atrofia o ouvido, enquanto resguarda a boca. Escusando a
maquilhagem vemos surgirem as mais bizarras mascarilhas, numa tentativa de
disfarçar alguma da vaidade contida em muitos rostos nem sempre adequadamente
pintalgados. Dizem com sarcasmo que a máscara favoreceu certas caras, pois no
encobrimento se dilui o que tantos/as pagam de tributo â pouca-beleza.
=
Atendendo à palavra que usamos no título deste texto – ‘focinheira’ – podemos encontrar,
sem grande necessidade de procura, alguns exemplos do trabalho de fuçar com ou
sem o artefacto colocado. Com efeito, anda por aí muita gente a fuçar em busca
de mais subsídios a conceder à população, mas sem ver se tais propostas são capazes
de passar do papel ou do discurso ilíquido sem conteúdo. Depois do ‘RSI’ –
rendimento social de reinserção – pode vir a ser acrescentado ou substituído
pelo ‘rendimento social de cidadania’ (bloquistas), sugerindo outros o aumento
inusitado (embora queiram que seja o correto para uma maioria de não-privados)
do salário mínimo e ainda a sugestão de um ‘rendimento básico de emergência’
(pelos seguidores/adeptos dos animais)…numa ansia de querer trazer para a vida
política questões tentaculares do espaço partidário. Para já parece que vão
fuçando onde se pode encontrar algo que alimente tais pretensões, mas em breve
se verá que não passam de miragens, pois a distribuição pode ser benéfica, mas
sem a criação efetiva de riqueza não seremos capazes de fugir a novos resgates
e a golpes de garote dos (ditos) capitalistas…
= É
isso: estamos de focinheira armada, não se sabendo para não mordermos ou para
não sermos mordidos. De um dos lados estaremos nem que seja a contragosto.
Agora que ainda palitamos os dentes das sobras procedentes da União Europeia,
preparemo-nos para os sacrifícios que se advinham atrozes e por mais tempo do
que no passado recente.
Temos de
mudar de hábitos e até de fraseologia. Um exemplo bizarro. Após a celebração de
um batizado, os participantes perfilaram-se para a foto geral. O fotógrafo de
serviço, usando a linguagem de há uns meses atrás, salientou: ponham um sorriso
para a fotografia… mas como podiam fazê-lo, de modo que se visse, se estavam
todos de máscara.
Basta de
enganos: estamos todos de focinheira e não sabemos até quando durará a
situação. Digam-nos a verdade, senhores governantes. Não se escondam nem façam
propostas a pensar no ontem, mas atendendo, responsavelmente, ao amanhã… O hoje
é curto e passa depressa!
António Sílvio Couto
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