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sábado, 30 de dezembro de 2023

Família – ontem, hoje e no futuro

 


Se há conceito que está em catastrófica transformação é o da família. Aquilo que era mais ou menos certo e válido há cinquenta anos, hoje é quase motivo de chacota de uma parte dos nossos coetâneos. Aquilo que era considerado valor, hoje provoca riso em boa parte dos nossos concidadãos. Aquilo que fazia acreditar e motivar a vida de tantas pessoas, hoje tornou-se como que algo desprezível, antiquado ou mesmo sem significado.

1. Lemos na constituição pastoral ‘Gaudium et spes’ sobre a Igreja no mundo atual, do Concílio Vaticano II (1965): «A família - na qual se congregam as diferentes gerações que reciprocamente se ajudam a alcançar uma sabedoria mais plena e a conciliar os direitos pessoais com as outras exigências da vida social - constitui assim o fundamento da sociedade. E por esta razão, todos aqueles que têm alguma influência nas comunidades e grupos sociais, devem contribuir eficazmente para a promoção do matrimónio e da família. A autoridade civil há de considerar como um dever sagrado reconhecer, proteger e favorecer a sua verdadeira natureza, assegurar a moralidade pública e fomentar a prosperidade doméstica. Deve salvaguardar-se o direito de os pais gerarem e educarem os filhos no seio da família. Protejam-se também e ajudem-se convenientemente, por meio duma previdente legislação e com iniciativas várias, aqueles que por infelicidade não beneficiam duma família» (n.º 52).

À luz das propostas de há cerca de sessenta nos como que nos fica o travo amargo de que a família, para além de estar em crise de identidade, tornou-se uma espécie de caleidoscópio de influências não-assentes nem efetivamente capazes de nos darem a entender para onde caminhamos.

2. É claro que o combate à família, alicerçada nos valores judeo-cristãos, tem hoje imensos promotores, mesmo que escondidos na sombra de outras ideias trazidas à luz da convivência humana. Com facilidade vemos a palavra ‘família’ ser substituída por ‘famílias’, numa abertura a algo que ultrapassa os conceitos cristão mais básicos. Assim vemos considerar ser ‘família’ um conglomerado de pessoas sem vínculo estável, mas podem viver de forma conjunta até que resulte tal união. Podemos ver como considerado ‘família’ a união entre pessoas do mesmo género, mesmo sem vínculo legal ou legalizado. Por vezes, ouve-se considerar ser da ‘família’ até os animais de estimação ou outros.

3. A evolução dos conceitos revela e faz movimentar os comportamentos. Estes, por vezes, podem revelar o que há de menos bom na pessoa humana, como o egoísmo e os interesses mais ou menos mesquinhos, bem como elevados ideais, por vezes ofuscados pelo barulho que fazem os que contestam. É isso que acontece quando é tratado o tema da família: pretende-se impor um tipo de família onde cada um como que usa os outros enquanto lhe são favoráveis. Isto seria a tal ‘cultura do descarte’, onde as pessoas são usadas e depois deitadas fora como coisas. Onde estará nesta dimensão de família o cuidado de uns pelos outros? Como se compreenderá uma sociedade onde os outros são vistos como adversários senão mesmo como inimigos?

4. Já na década de sessenta do século passado o Concílio Vaticano II alertava, na constituição pastoral ‘Gaudium et spes’ sobre certos riscos e perigos que atentavam contra a família. «a dignidade desta instituição [a família] não resplandece em toda a parte com igual brilho. Encontra-se obscurecida pela poligamia, pela epidemia do divórcio, pelo chamado amor livre e outras deformações. Além disso, o amor conjugal é muitas vezes profanado pelo egoísmo, amor do prazer e por práticas ilícitas contra a geração. E as actuais condições económicas, socio-psicológicas e civis introduzem ainda na família não pequenas perturbações. Finalmente, em certas partes do globo, verificam-se, com inquietação, os problemas postos pelo aumento demográfico (...) as profundas transformações da sociedade contemporânea, apesar das dificuldades a que dão origem, muito frequentemente revelam de diversos modos a verdadeira natureza de tal instituição» (n.º 47). Questões como a vida, o relacionamento das pessoas, certas questões fraturantes continuam a ofuscar a dignidade da família.

5. A família é essencial. Denegri-la ou vilipendiá-la terá as suas consequências.



António Sílvio Couto

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