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quarta-feira, 20 de julho de 2022

‘Óculos de Penafiel’

Foi com surpresa que ouvimos um treinador de futebol luso a dizer no Brasil: procurem entender o que significa – ‘óculos de Penafiel’… Ele falava num comentário à apreciação que dele tinham feito, na comunicação fofoqueira do outro lado do Atlântico, uns certos detratores da sua prestação – embora bastante vencedora – a consideravam mesmo assim suscetível de críticas…

1. A expressão ‘óculos de Penafiel’ deu-me nos ouvidos e quis saber mais sobre a fundamentação social, económica e cultural da mesma. Colhi o seguinte de uma consulta na internet: ironicamente, os habitantes de Penafiel (Portugal) são conhecidos como "albardeiros" porque o fabrico de albardas era uma atividade tradicional naquela cidade. Por este motivo, os «óculos de Penafiel» correspondem às palas que os burros usam nos olhos de modo a que concentrem a atenção no caminho, visto que os herbívoros têm um largo campo visual lateral e, por isso, dispersam facilmente a atenção.

2. Que lições podemos recolher desta descrição? Que elementos compõem esta expressão? Onde poderemos entender, então, o recurso a esta expressão pelo tal treinador de futebol, por sinal oriundo daquela região? Quais serão as talas ou entreolhos que impedem certas pessoas de ver? Haverá entreolhos de vária qualidade e possível diversidade? Aqueles ‘óculos’ são recomendáveis ou dispensáveis?

3. É um facto que, hoje, as pessoas têm razoáveis dificuldades em serem capazes de perceberem as milhentas distrações a que estão submetidas. Com relativa dificuldade não conseguem concentrar-se ou fixarem a sua atenção no essencial. Precisamos de incentivar a educação para a capacidade de não nos derramarmos por coisas e/ou assuntos dispersos, que nos distraem e não nos permitem cuidar daquilo que é importante, isto é, de fazermos o essencial e de não andarmos ao ritmo do urgente.

4. Claramente temos de ter uma disciplina que não nos deixe viver na superficialidade, mas que tenhamos um método de mergulhar no mais importante das coisas, das situações, das pessoas e mesmo de nós mesmos. Com efeito, a capacidade de tocar vários instrumentos ao mesmo tempo não é tão comum como alguns desejariam, mas temos de aprender uma espécie de mentalidade de parafuso, que aperta sempre mais porque está interessado em ir ao fundo das questões, dos problemas, tanto pessoais como alheios.

5. Se quisermos convencer seja quem for não será com futilidades da era do ‘coppy-paste’, mas teremos de estar mais alicerçados na construção do pensamento e de uma linha de vida que pese bem as palavras a dizer e, particularmente, seja mais capaz de fazer pensar do que querer entreter com vulgaridades ou inutilidades sem consequência… Quem gasta tempo a cultivar a reflexão no seu dia-a-dia? Não seremos mais da verborreia do que do pensamento?

6. Os ‘óculos de Penafiel’ poderão e deverão ser recomendados muito mais do que só para os asinos da nossa praça, mas aconselháveis a quantos têm de atender ao bem dos outros, sem se derramarem pelas banalidades facebokianas com que tantas vezes nos entretemos e com as quais ocupamos muito do nosso tempo.

7. Felizmente o tal treinador português de futebol trouxe para a luz do dia uma expressão que contém mais do que críticas às críticas, mas faz-nos aprender a ver muito para além do visível aos olhos em observação. Tirem ou ponham os óculos, mas vejam em dimensão de mais Além…

António Sílvio Couto

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