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sexta-feira, 22 de julho de 2022

Mentalidade, linguagem… (in)compreensão


Parece, cada vez mais acentuada, a dessincronia de linguagem entre tantas expressões culturais em confronto: com facilidade são usadas as mesmas palavras, mas os significados atribuídos são díspares; são utilizadas as mesmas palavras (mais parecem só fonemas), mas cada qual lhes dá a significância que lhe interessa; são colocadas na linguagem de conversa ideias que não passam de atropelos de uma certa mentalidade mais ou menos capciosa quanto ao interlocutor, que mais parece inimigo…

 1. Fique desde já uma declaração de desinteresse: muitos dos factos, das situações e dos episódios deambulam pelas (ditas) ‘redes sociais’, que não frequento, mas das quais ouço ressonância dos casos mais virais – termo perigoso, pois pode ser um desses vírus que minam a sociedade, sem nos darmos conta – isto é, aos quais dão interesse e/ou importância, mas que não passariam de notas de rodapé numa cultura de maior respeito de todos por todos…

 2. Numa reportagem sobre uma ‘missa nova’ – celebrada depois da ordenação do padre, normalmente, na sua terra natal – a mãe de dois padres gémeos referiu uma coisa que me deixou a refletir: se a pessoa não for católica, com dificuldade compreenderá que isto de dar um filho (no caso são dois) a Deus para ser padre é uma graça… Efetivamente para a maior parte das pessoas, imbuídas de espírito do mundo e com mentalidade hedonista de posse, com critérios materialistas de felicidade e, sobretudo, com comportamento onde Deus não conta, aquilo que esta mãe disse e fez soa a anacrónico, senão incompreensível…para muitos/as!  

 3. Circula nas tais redes sociais um pequeno vídeo, no qual se vê um padre a recusar dar a comunhão – isto é, em colocar na mão a hóstia consagrada a um ‘noivo’ que não estaria minimamente preparado para o ato, tendo recebido uma ténue bênção, dada pelo padre e sob um certo esgar de riso do não-comungante.

Por sinal conheço o dito padre. Não me parece que entraria numa brincadeira como aquela que quiseram passar no breve excerto de segundos. Pior foi a ‘inspirada’ e contundente reação do apresentador de programa televisivo, onde estavam presentes os tais ‘noivos’. Do alto da sua ignorância, ousou pronunciar-se: o que o padre fez merece repulsa, pois não se deve negar a comunhão a ninguém, seja ou não batizado, tenha-se ou não confessado…Deus veio para todos!

Esta declaração do tal apresentador – que se declara ‘católico’, quando lhe convém – está eivada de vários erros, de preconceitos e, sobretudo, de muita ignorância.

- Erros: a comunhão eucarística é para batizados, que manifestem as devidas disposições de receber a comunhão. A aproximação à comunhão eucarística tem exigências de preparação condigna do Senhor que nos é dado, entre as quais a confissão sacramental.

- Preconceitos: lavrar a sentença de condenação sobre quem não faz aquilo que acha que lhe é favorável. Com efeito, o padre deverá cuidar que, quem recebe Jesus na comunhão eucarística, o faça nas devidas disposições e não só para a fotografia, como se depreende do vídeo divulgado.

- Ignorância: estes temas trazidos para a vulgaridade de certos programas televisivos não ajuda nem credibiliza a seriedade de ninguém…e muito menos de quem de praticante só manifesta a intenção!

 4. É incontornável a dificuldade que vemos em ser aceite por uma razoável maioria as orientações da Igreja católica. Para muitos isso funciona como desculpa, pois, enquanto se demarcam dessas orientações – regras, leis, dogmas ou normativas morais – cada qual pode fazer o que lhe apetece e – como dizia o Papa Bento XVI – viver como se Deus não existisse. Seria como essa imagem da avestruz que, metendo a cabeça na areia, o perigo passaria. A dita ‘cristandade profana’ semeou muitos tiques de fazer o que quero e não me submeter ao que me constrange. Ainda mais abusivo será: recebo os benefícios de uma pretensa sociedade cristã, mas vivo ao ritmo daquilo que quero e me agrada. Veja-se o que acontece com os ‘feriados religiosos’, que implicam a participação nos atos religiosos católicos ‘de preceito’ (isto é, de regra), mas cada um faz desses dias para usufruir um certo descanso que não teriam se não houvesse ‘feriado’!

 

António Sílvio Couto 

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