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terça-feira, 5 de julho de 2022

Combate à pobreza na (freguesia) Moita, no âmbito católico


 «O nosso compromisso não consiste exclusivamente em ações ou em programas de promoção e assistência; aquilo que o Espírito põe em movimento não é um excesso de ativismo, mas primariamente uma atenção prestada ao outro, considerando-o como um só consigo mesmo. Esta atenção amiga é o início duma verdadeira preocupação pela sua pessoa e, a partir dela, desejo de procurar efetivamente o seu bem»
(Papa Francisco, Exortação apostólica ‘Evangelii gaudium’, 199).

Esta citação do Papa Francisco, há nove anos atrás (2013), pode nortear a abordagem que pretende-mos fazer ao tema em causa neste colóquio: quem é o sujeito do combate contra o empobrecimento?
Situemo-nos na freguesia da Moita e no quadro da ação da Igreja católica, O âmbito concelhio terá, necessariamente, outras componentes e mesmo dados mais abrangentes...
Seguimos o percurso de três ações de natureza de ‘solidariedade social’, no quadro da Igreja católica presente na freguesia na Moita: a conferência vicentina, o centro paroquial de acção social da Moita e as famílias com esperança...

1. Enquadramento social de ontem para hoje

A ‘conferência vicentina’ surgiu em 21 de abril de 1947 e o ‘centro paroquial’ em 26 de maio de 1952... ambos pela mão do pároco ao tempo, Padre João Evangelista e em condições sociopolíticas de extrema gravidade e alguma indigência, isto é, poucos anos após o final da II guerra mundial.
A freguesia da Moita tinha em 1950 - 8.769 habitantes e em 1960 - 9.504...isto é, cresceu numa década 735 pessoas... Não podemos esquecer-nos que foi na década de 60 que deflagrou a ‘guerra colonial’ e se deu início à vaga de emigração de norte a sul do país.
A configuração socioeconómica da Moita de há setenta e de há sessenta anos era de uma sociedade fechada, embora progressivamente crescente e daí surgirem respostas, dadas sobretudo no âmbito da Igreja católica, para atenuar as dificuldades familiares e sociais.
Com a revolução de ‘abril de 74’ novos horizontes e necessidades surgiram: em 1978, foi criada a resposta no ‘centro paroquial’ às questões de infância...
Nestes 70 anos de existência do Centro Paroquial de Acção Social da Moita terão sido ajudados ou cuidadas mais de seis mil crianças e adolescentes e, certamente, mais de três mil idosos...de forma contínua ou circunstancial!
Por ocasião da ‘crise de 2010-2014’, surgiu, em 2012, um outro trabalho de acompanhamento-ajuda-aconselhamento às famílias, intitulado: ‘Famílias com esperança’, que pretendia, à data da sua iniciação, «apoiar famílias carenciadas com crianças até aos cinco anos, envolvendo ainda mães jovens e/ou adolescentes, através da oferta ou empréstimo de bens materiais para bebé e criança, bem como apoio jurídico, moral e espiritual». podendo ser concretizado «através da entrega e doação de bens, empréstimo, bem como através de donativos em dinheiro ou disponibilizando algum do seu tempo».

2. Respostas ontem como hoje

Os censos da população de 2001 davam à freguesia da Moita - 16.727 moradores; em 2011 - 17.853; em 2021 - 17.653... perdendo, segundo estes dados, duzentos habitantes em dez anos.
Se tivermos em conta que a paróquia da Moita inclui as freguesias da Moita, Gaio-Rosário e Sarilhos Pequenos teremos, atualmente, um total de 20.030 habitantes.
Por grupos etários podemos encontrar os seguintes dados:
Nos censos de 2001 - 0-14 anos: 16,3% da população; 15-24 anos: 15,2%; 25-45: 56 %; > de 65 anos: 12,4%.
Nos censos de 2011: 0-14 anos: 15,4%; 15-24: 10,4%; 25-64: 56,3%; > de 65 anos: 17,4% da população.
Nota-se alguma correspondência entre as duas franjas populacionais que ocupam a ‘assistência’ dos trabalhos desenvolvidos pela Igreja na Moita - os mais novos e os mais velhos.
Vejamos uma breve resenha atualizada, fornecida pela ‘conferência vicentina’, o ‘centro paroquial’ e as ‘famílias com esperança’:
* Conferência vicentina - neste momento atende 56 famílias, num total de 112 pessoas; neste universo há 3 famílias ucranianas, num total de 11 pessoas. De referir ainda que duas outras famílias que eram apoiadas regressaram à Ucrânia. Foram-nos ainda referenciadas 3 famílias pela emergência alimentar, estando reduzida esta ajuda a uma família de 4 pessoas, pois as outras duas não compareceram ao primeiro acolhimento. O apoio do Banco Alimentar tem diminuído sistematicamente e neste momento é escasso face ao número de famílias que solicitam apoio, sendo completados os cabazes com produtos adquiridos com os donativos da paróquia e pela quotização dos consócios.
* Centro paroquial - com serviços prestados à infância (creche, jardim-de-infância e atividade de tempos livres) envolve duas centenas de crianças; o serviço aos seniores (estrutura residencial para idosos e centro de dia) presta serviço a cerca de quatro dezenas de pessoas...numa quebra acentuada após os anos mais recentes de pandemia. Atendendo aos custos, compromissos e valias destes serviços, o centro paroquial tem os ordenados com os funcionários em dia, bem como os compromissos com fornecedores e os encargos com o Estado. Anseia o centro criar novas e adequadas condições para os mais velhos com a construção de um novo lar... os dados estão lançados, esperando que haja bons ventos e melhores decisões...
* Famílias com esperança - desde 2012 já prestou ajuda a 370 famílias das freguesias que compõem a paróquia da Moita. São ajudadas com regularidade quinzenal trinta famílias com crianças até aos doze anos. De referir que, no contexto recente de recolha de bens para a Ucrânia, as ‘famílias com esperança’ foram um ponto de referência na vila da Moita. Desde 2014 funciona uma ‘loja social’ com roupas a custo reduzido, sendo este um meio de ajuda às famílias com necessidades e de angariação de fundos para este serviço da paróquia...

3. Perspetivas, desafios e propostas... para o futuro

Se seguirmos o profético princípio do Padre Américo, da obra da Rua, diremos que, se cada paróquia cuidar dos seus pobres, muitos dos problemas de pobreza e de empobrecimento serão ou estarão resolvidos.
Tal como se dizia na frase citada do Papa Francisco, é preciso cuidar da pessoa toda e não reduzir aquilo que se faz ou pretende fazer a iniciativas de solidariedade...estatais e quase-estatizantes. Valha-nos, neste contexto, o velho aforismo da cana e do peixe, pois será preciso dar o peixe para ter capacidade e força de querer aprender a pescar e, depois, sobreviver com os meios adquiridos, aprendidos e capacitados. Tenho a convicção de que ‘os pobres alimentam muita gente’, pois se forem retirados dos espaços de propaganda como sobreviveriam alguns setores? Mais do que criar condições de reprodução de empobrecimento precisamos de saber se queremos erradicar a pobreza com a maior brevidade possível, de forma honesta, sincera e verdadeira.
- As perspetivas económicas a curto e médio prazo não são favoráveis à diminuição dos pobres, no entanto, precisamos de querer combater nos nossos ambientes os sinais de prolongamento da pobreza, valorizando as pessoas e dando-lhes capacitação de saberem aproveitar os meios que têm à disposição não meramente para reivindicarem em protesto, mas para construir saídas dignas e dignificadoras das suas condições atuais e futuras... Não podemos hipotecar as gerações mais novas com alienações e subsidiodependências... recorrentes e falaciosas.
- Desafios sempre contínuos em ordem a fazer das pessoas, que agora precisam de ajuda, em futuros construtores de novos caminhos e de respostas alicerçadas na pessoa e não no Estado...este, com habilidade política e ideológica, vai criando fatores de desmotivação com o recurso a manter os pobres presos pela boca...
- Propostas que envolvam a proximidade, fazendo de cada cidadão um ativo de soluções e não um enxame de reclamações... O futuro constrói-se hoje com verdade e humildade!

(*) Intervenção no colóquio: O empobrecimento da sociedade e o papel das IPSS, Seixal, 5 de julho de 2022.

António Sílvio Couto

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