No
linguajar português há expressões que revelam muito daquilo que nós somos,
mesmo que nem sempre o consigamos atingir na totalidade.
A
expressão em análise – ‘de pé atrás’ – pode traduzir-se por sinónimos como:
estar desconfiado, com medo, inseguro… tanto nas questões pessoais, como nos
aspetos sociais, sem negligenciar o que se possa referir às incidências
culturais mais ou menos assumidas ou até subterrâneas…
Atendendo
à época em que nos exprimimos teremos subjacente essa espécie de metamorfose
que percorre muitos dos comportamentos visíveis… de tanta gente (já) em férias,
sem esquecermos alguns outros assuntos da vida política do passado, no presente
e para o futuro.
= Coisas e loisas de férias: dá
para perceber, nesta sociedade de papel de lustro – isto é, do faz-de-conta, do
julgar os outros pela marca que vestem (ou não), de ter imagem à custa do
engano – há quem se arvore em julgador pela aparência que tenta ostentar.
Traduzido com a expressão ‘estar de pé atrás’ quererá significar que estaremos
perante alguém que talvez seja muito mais (ou menos) do que aquilo que tenta
parecer.
Neste
tempo de veraneio devemos exercitar como atitude o ‘estar de pé atrás’ perante
tantas e tão diversificadas situações que podemos ver nos outros – e por eles
questionar-nos a nós mesmos – desde logo pelo lugar onde se diz ter ido de
férias: será real, ficcionado, concreto ou virtual… pois há locais que não
passam de palcos de vaidade, onde ser visto por lá como que parece dar estatuto
social em maré de ‘détente’!
= Absurdo dos absortos: na
imensa incongruência da vida em política à portuguesa assistimos, nos últimos
tempos, à discussão em volta dumas golas que se inflamaram mais pela palavra –
dita, mal dita ou menos bem escrita – do que pelas consequências que se
pretendiam obviar… Com tantas conjeturas sobre a lei em vigor houve uns tantos
mais absortos – distraídos, alheados, sonhadores – que, fazendo parte da
ideologia reinante e reinadora, pouco se incomodaram com aquilo que impendia
sobre as cabeças dos prevaricadores, qual espada de Dâmocles do mito grego… Com
efeito, será de boa recomendação que nos coloquemos de ‘pé atrás’ sobre algumas
das peripécias da nossa vida partidária, pois aquilo que seria um chinfrim de
contestação, agora tornou-se uma espécie da ressalva de opinião; aquilo que
deveria provocar a queda dos usufrutuários, agora serve para flutuar na boa
onda de reinação; aquilo que daria para que o protesto dos mais defensores do
regime de estado absoluto, agora cingem-se à mudez num manto de absoluto
silêncio cúmplice, concordante e hipócrita.
Porque
será que alguns, quando estão no poder, se acham acima da lei, da legislação e
mesmo da justiça? Porque será que se verificam tantas coincidências nas
prevaricações e quase nunca há castigos nem sancionamentos? Porque será que os
executores das leis se consideram fora da abrangência das mesmas e atiram para
fora da sua governação os malefícios que lhes deviam ser imputados?
Este é
um filme – ou mesmo uma série – ‘dejá vu’ na nossa sociedade tão complacente
quando tem dinheiro para gastar, mesmo que não saiba de onde lhe veio…2011 foi
há pouco tempo!
= ‘Sealy season’ em campanha
eleitoral: a dita época de descanso em que pouco acontece de
relevante, este ano tem um novo figurino, pois, no início de outubro, haverá
eleições e os candidatos andarão numa roda-viva a disputar a atenção dos
eleitores pouco interessados nas ‘promessas’ de ontem, recauchutadas para
amanhã. Temos de saber estar ‘de pé atrás’, isto é, na desconfiança com aquilo
que nos querem impingir, pois a maior parte das questões são rançosas de
novidade, parcas de compromisso e negligentes de sentido. Bastantes dos
figurinos estão gastos de inutilidade e ainda continuam a apostar no seu
contributo. Muitos dos estribilhos de propaganda estão esfarelados de conteúdo.
Bastantes dos intervenientes estão fora de validade, mas, porque não há melhor,
continuam a apostar nesses menos credíveis, aceitáveis e verossímeis.
De facto,
estar de ‘pé atrás’ tem de ser uma atitude para com tanta gente que continua a
empestar a nossa cultura com arranjos de classe ‘b’ e a promover figurinhas
secundárias, sabe lá até quando. Precisamos de escolher com a cabeça e não só
com o estômago…de ricos falidos!
António Sílvio Couto
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