Quando
alguém está prestes a terminar um determinado trabalho, que exerceu durante
algum tempo com maior ou menor eficiência, podem gerar-se movimentações para
que possa haver alguma ‘homenagem’ antes da sua saída. Deste modo como que se
pretende dar a entender, a quem sai, algo que possa ter a ver com o
reconhecimento pelo que foi feito.
Poderia
haver muitos campos de intervenção para analisarmos este tema da homenagem à
saída de alguém de um trabalho/tarefa/função feito, mas cingiremos a nossa
observação sobre o setor eclesiástico, que nem sempre significa especialmente
eclesial, mas antes reduzido a algum afunilamento para com os padres…em maré de
mudança de serviço, de paróquia ou de espaço de presença pastoral mais visível.
Talvez
iniciativas desta natureza da homenagem pretendam mais camuflar do que
reconhecer qualquer trabalho realizado, pois, na hora da despedida podem-se
cometer exageros e muitos deles parecerão ainda desculpa para algum
descompromisso recauchutado de pseudo-arrependimento.
Efetivamente
custa muito ver enquadrado no caixilho da homenagem aquilo que deveria ser o
contentamento do dever cumprido, esse que faz de nós cidadãos/ministros que
servem os outros e que não necessitam de certas adulações para continuarem a
dedicar-se àquilo que é a razão de ser disso que se pretende ser, de verdade.
= Nunca
aceitei qualquer festa ou festinha por ocasião da cessação de algum serviço e,
se tolero que possam promover no começo, é porque não está nas minhas
capacidades diretas, evitá-lo. Com efeito, a nossa capacidade de servir deveria
estar mais acertada com essa norma do Evangelho: ‘quando tiverdes cumprido tudo
o que vos mandarem fazer, dizei – somos servos inúteis, fizemos o que devíamos
fazer’. É nesta frase provocadora das conveniências com que vemos ou podemos
ser vistos que deveríamos ancorar o nosso comportamento, não permitindo –
direta ou indiretamente – que sejam feitas homenagens e tão pouco dadas ou
recebidas comendas, condecorações ou promoções…por mais aplaudidas ou desejadas
que forem.
Em
certas circunstâncias encaixa com simbolismo redobrado a frase latina –‘asinus
asinum fricat’ – de tradução: ’um burro coça outro’, numa interpretação de que
‘quem não presta, elogia quem lhe faz o mesmo’. Ora, certos momentos de
homenagem ou propostas de reconhecimento de tarefas quase poderiam ser enquadrados
nesta simbologia, pois alguém fará o mesmo para com quem lho fez
antecipadamente… e andaríamos à volta ou à procura de idênticos argumentos para
voltarmos ao princípio.
= A
melhor homenagem ou reconhecimento – no caso de trabalhos que envolvam a
presença de outros – é esse da participação, quando se é chamado ou se deve
prontificar para fazer parte da solução e não poder continuar a ser fator de
problema pelo desinteresse ou a recusa em participar. Em quantos dos momentos
da vida de uma paróquia, de uma associação ou de um grupo organizado se pode e
deve fazer parte e não ficar a assistir para ver quando falha, periga ou
colapsa. Quantas oportunidades são desperdiçadas para construirmos em comum,
sem reclamar protagonismo, com esses que temos e não com os desejáveis que
nunca chegam ou se interessam. Em quantas das etapas poderíamos usufruir dos
dons e qualidades de cada um em vez de nos atermos a viver da crítica, da
maledicência e até da má-fé. Enquanto as nossas paróquias, grupos ou
associações forem espaços não de comunhão, mas de competição, estaremos a
perder o tempo…na programação de festas e de homenagens que soam a oco, porque
falsas e falseadoras daquilo que somos e do que devíamos ser todos…cristãmente.
Urge,
por isso, purificar com critérios do Evangelho tantos dos nossos comportamentos
eivados de sinais mundanos e fabricados à semelhança de outros interesses que
não os do serviço desinteressado, fraterno e solidário.
Com
todo o gosto preferiria dizer ter recusado uma condecoração/comenda do que
ostentá-la por mais simbólica que fosse… Custa muito ser cristão de vida!
António Sílvio Couto
Sem comentários:
Enviar um comentário