Eis os
produtos mais vendidos nos hiper e supermercados, dependendo da fonte de
informação e dos postos de venda: leite, pão e bananas...
É
significativo que a lista inclua, sobretudo, produtos de âmbito alimentar,
dando a impressão que ainda se nota – muito mais do que seria desejável – que
falta, ao nível geral, a resolução de necessidades essenciais como aquelas que
envolvem a comida. Talvez nos possamos aperceber melhor destas lacunas se
formos às compras – como os outros e com olhos de ver – e aí compreenderemos
quais são os cuidados das pessoas, tanto daquilo que compram como naquilo em
que investem as suas economias.
Há, por
vezes episódios, que manifestam de forma mais ou menos inconsciente, esta fome
encoberta. Bastará estar atento a alguma festa ou convívio, a algum momento
onde entre a hipótese de comida, para vermos pessoas a devorarem avidamente tudo
o que lhe põem à frente. Brevemente iremos viver, neste local onde há cerca de
oito anos estou a morar – em razão do trabalho pastoral – um ataque à comida e
à bebida de forma quase irracional: custa imenso ver certas cenas duma quase
animalidade… em cada canto e em certas circunstâncias.
Já foi
há anos, mas continua na minha memória com um ferrete atroz essa cena de ver
pessoas, num almoço com bastante gente (mais de meio milhar), que julgava
civilizada, a atirarem-se de forma desalmada sobre as mesas de doces, levando
tudo numa revoada de ataque, quais gaivotas esfomeadas…e tudo desapareceu num
ápice, enquanto outros ficaram sem ter acesso mínimo à (dita) sobremesa… Vi,
duma clara e incisiva, o que será alimentar pessoas em maré de descontrolo e,
sobretudo, de açambarcamento, sem olhar a meios nem respeitando nada nem
ninguém…
=
Olhemos com mais acutilância para o mundo subjacente àquilo que comemos e,
particularmente, na forma como o fazemos. Imensas artes se desenvolvem em volta
da comida, desde a sua confeção até à sua utilidade, passando pelos benefícios
ou congestionamentos até às subtilezas que nos fazem sermos apreciadores ou
detratores dalguma manifestação cultural e/ou cívica onde aquilo que se come ou
não pode ser mais do que um fator de alimentação.
A mesa e
aquilo que nela se coloca revela muito da nossa identidade, na medida em que
nós somos o que comemos. De facto, muito daquilo que manifestamos de forma mais
ou menos explícita vem-nos daquilo que vivemos e convivemos à mesa, bem como
daqueles com quem o fazemos. Estes tornam-se ‘companheiros’ – etimologicamente significando
‘os que comem do mesmo pão’ – mais do que comensais, pois com aqueles estamos
em consonância e com estes talvez apenas em concomitância. Deste modo a ‘arte’
dos restaurantes não nos faz estar em comunhão mas talvez em parceria, o que
não é a mesma coisa nem traz as mesmas consequências.
Será
preciso, então, recuperar a ‘arte’ da cozinha familiar onde se aprende com a
vida e não se está ao lado de quem connosco come, mas com quem poderemos não
sentir mais do que mera utilidade ou justaposição. Muito daquilo que temos
vindo a desfazer na nossa sociedade vem deste abuso em ir ao restaurante, como
se aquilo que nele se recebe fosse melhor do que aquilo que partilhamos à mesma
mesa e com pessoas que nos fazem crescer na vida e não engordar na socialização…
= Agora
que parece termos caído nos aspetos que mais nos faziam ser, como é a família,
precisaremos de retomar aquilo que unia o tecido familiar e não continuarmos a
viver neste faz-de-conta de que se tem meios de riqueza – como esse de ir comer
fora – mas onde se vão estiolando as razões da nossa vivência e convivência
humana e familiar. À boa maneira de encontrar culpados para o estado familiar a
que chegamos há quem aponte o micro-ondas como um dos causadores da dissensão
da família: aquece-se o que não se cozinhou nem apurou com a arte da
paciência…e isso, sendo tão repetido, quase se torna um hábito que desfoca do
essencial.
Usemos
os meios para vivermos unidos e reunidos com paciência e condimentos quanto
baste…
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