Vivia-se
a penumbra do Natal e eis que numa sessão hiper-rápida o parlamento fez jus
àquilo que o devia envergonhar: aprovaram os deputados a mudança na ‘lei de
financiamento dos partidos políticos’… Quase tudo esteve em banho-maria até que
o presidente da república vetou o assunto nos primeiros dias deste ano…
– Já não
é pouco que o assunto seja de autoria dos beneficiários, mas parece que se
torna ainda mais acintoso que o façam melhorando, substancialmente, as
condições de acesso aos meios económicos que os possam suportar. Do espetro
representado no parlamento só dois partidos destoaram deste unanimismo,
chegando alguns – ditos de inspiração à esquerda – quase a considerarem uma
espécie de traição que estes dois se venham agora arvorar em paladinos duma
ética republicana, que, por ser tão concordante, quase se torna ofensiva desses
valores igualitários propagandeados mas não seguidos…
– Dá a
impressão que ainda não se enfrentou a questão de fundo que este assunto,
levado à socapa à votação, mas amadurecido em quase ano de reuniões secretas
entre todos os intervenientes, que é o do financiamento dos partidos políticos:
com fundos do estado, com subvenções privadas, gerando e gerindo meios próprios
dos partidos ou aceitando contributos de particulares e até que montante…
A lei
orgânica sobre o assunto é de 2003… com várias anotações e correções em anos
subsequentes: 2008, 2010, 2013, 2015 e 2017…
Das
receitas próprias para o financiamento dos partidos políticos se faz uma lista
de sete situações, salvaguardando a obrigatoriedade de ser depositada em cheque
ou noutro meio bancário de controlo que permita identificar a procedência do
montante… Este montante, quando envolva donativos de pessoas singulares, nunca
poderá ultrapassar, ao longo dum ano, vinte e cinco salários mínimos mensais.
Dos
meios de subvenção estatal enumeram-se o pagamento de cada voto recebido pelo
partido, tendo em conta o resultado eleitoral – cada voto vale, em média, 3,15
euros – mesmo que não tenha sido eleito nenhum deputado, mas possa ter
angariado mais de cinquenta mil votos, desde que requeiram isso ao presidente
da assembleia da república.
A
angariação própria de fundos dos partidos políticos não pode exceder,
anualmente, mil e quinhentas vezes o valor do IAS (indexante dos apoios
sociais) – neste ano é de quatrocentos e vinte e oito euros e noventa cêntimos –
salvaguardando que o produto da angariação de fundos resulta da diferença entre
as receitas e as despesas em cada atividade de angariação de fundos…
A dita
lei orgânica apresenta ainda (no artigo 10.º) os benefícios para os partidos:
não estão sujeitos a IRC e estão isentos de imposto de selo, de sucessões e
doações, de IMI, do imposto automóvel, do IVA (sobre aquisição de bens e serviços,
que envolvam a transmissão da sua mensagem política), das taxas de justiça e de
custas judiciais.
– As
‘grandes mudanças’ desejadas pela nova lei pretendiam envolver a alteração dos
montantes auferidos pelas iniciativas de angariação de fundos e o alargamento
do benefício da isenção do IVA a todas as atividades partidárias.
Para
fundamentar o veto presidencial foi aduzido que faltou ‘fundamentação
publicamente escrutinável’ quanto ao assunto… Agora que já se discutiu a
‘coisa’ será que vai mudar a posição do Presidente ou a dos partidos tão
‘necessitados’ de novos fundos e recursos?
Seja
qual for a solução encontrada, dá a impressão que ficou bastante mal o tema
incluído um tanto à revelia na vida política, tão necessitada de credibilidade.
Isto também não ajudou à sua credibilização. Seria como mudar as regras de jogo
para que os contendores possam tirar benefício das jogadas que o público não
conhece, não percebe e está desmotivado para querer entender…
A arte
da política não precisa de espertos, que tentem ludibriar os mais incautos,
antes tem de fazer-se creditar pelas atitudes de serviço aos outros e não
servindo-se da ignorância dos outros. Não basta parecer sério, é preciso ser
mesmo muito sério. Verdade a quanto obrigas!
António Sílvio Couto
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