Por
estes dias, li mais uma caraterização do nosso tempo como marcado pelo
subjetivismo, isto é, em que cada qual faz ou pode fazer a sua própria vivência
humana, psicológica e mesmo espiritual sem contar nem ‘precisar’ do confronto
com os outros… tenham eles a religiosidade que possam ter ou viver.
Ora,
aliando esta vertente com outras dos nossos dias – como individualismo,
egoísmo… e tantos outros ‘ismos’ de concentração sobre nós mesmos – como que se
nos coloca alguma urgência em tentarmos entender como pode e/ou deve um cristão
católico viver a ‘sua’ celebração do sacramento da penitência e reconciliação…
enquanto vivência pessoal com incidências de âmbito comunitário.
Espero
que não haja quem se escandalize com esta consideração que agora apresentamos: muitos
daqueles/as que se aproximam do sacramento da penitência e reconciliação,
sobretudo neste tempo da quaresma, não são os que têm mesmo pecados, mas antes
fazem-no dentro duma certa tradição mais ou menos ritual, embora até possa
parecer que falta uma consciência correta e efetiva do pecado e das exigências
autênticas da celebração deste sacramento.
Certamente
que há muitas pessoas que já sentiram a verdadeira moção da graça divina, mas
não será difícil de encontrar quem não faça, correta e simplesmente, o seu
percurso preparatório desde o exame de consciência até à etapa mais consequente
da penitência de vida e não tanto de ‘rezas’ ou boas intenções rotineiras…
Duma
forma um tanto abusiva como que ousamos considerar que quem se confessa não tem
esses designados pecados – graves, mortais ou essenciais – embora, quem não se
confessa, não tenha a correta consciência desses mesmos pecados, tendo em conta
a ‘classificação’ mais ou menos aceitável e recorrente… aferidos e qualificados
na maturação da moral mais simples, personalista e atual.
= Penitentes e confessores… em
misericórdia
Na
oração para o jubileu da misericórdia rezamos:
‘Vós quisestes que os vossos
ministros fossem também eles revestidos de fraqueza para sentirem como justa a
compaixão pelos que estão na ignorância e no erro: fazei com que todos os que
se aproximem de cada um dos vossos ministros se sintam acolhidos, amados e
perdoados por Deus’.
Eis como
temos de viver com humildade a celebração do sacramento da penitência e da
reconciliação: ninguém pode dar aquilo que não recebeu e, na medida em que o
viver, melhor o poderá testemunhar e sentir como dom, graça e presença de Deus.
- Cada
vez mais está – ou dever estar – afastado da linguagem e da prática a escusada consideração
ao ‘tribunal divino’, para caraterizar o abeirar-se do sacramento da penitência
e reconciliação, onde quem se vai confessar seja induzido a tremer diante das
possíveis perguntas, se perturbe pelas irrazoáveis considerações e até mesmo se
possa deixar intimidar por algumas das (im)piedosas penitências…sugeridas ou
impostas!
- Dá a
impressão que, só quem possa ter passado por uma salutar experiência de
penitente, poderá entender a libertação gerada e geradora de nova vida, a
partir do essencial da celebração deste sacramento da penitência e
reconciliação.
- Urge
que sejamos capazes, em Igreja e como Igreja, de propor uma caminhada cristã
que não se atenha só às possíveis faltas para com Deus, mas que considere
também as faltas, falhas ou pecados para com os outros, sem esquecer ainda as
ofensas para consigo mesmo, tendo em conta a infidelidade que pode percorrer a
nossa vida no ser, no agir e no arrepender-se.
-
Precisamos de continuar a crescer na maturidade humana e espiritual,
amadurecendo a nossa condição de pecadores, mas sem tentarmos fazer de Deus uma
espécie de esponja, que nos convém utilizar nas horas de maior aflição… Somos
fiéis ou pecadores para com Alguém que nos ama e cujos atos de amor se
repercutem na intimidade e proximidade que nos afere ao perdão, feito
misericórdia e compaixão.
- Só
quem ama sente que ofende. Deus é, de verdade, a nossa máxima referência?
António
Sílvio Couto
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