Partilha de perspectivas... tanto quanto atualizadas.



segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Sinais de fé... na vida e nas ruas

Depois de um processo algo titubeante parece estar prestes a concretizar-se um sonho: vai ser erigido um monumento, na rua, a Nossa Senhora da Boa Viagem, na Moita.

Atendendo às circunstâncias sócio-políticas, aos momentos económico-financeiros e até às motivações religioso-cristãs, esta iniciativa poderá ser considerada vulgar – isto é, normal, bem aceite e até patrocinada – noutras paragens, mas quase uma ousadia em certos espaços ao sul do Tejo...

Atendendo às condições do calendário a inauguração deste monumento público a Nossa Senhora da Boa Viagem, deverá acontecer no próximo dia oito de setembro... em vésperas de eleições autárquicas, no contexto do ‘ano da fé – a decorrer na Igreja católica – e com a difusão que for conveniente e a divulgação oportuna... Mesmo em tempos de crise/austeridade parece que os custos não são exorbitantes! Assim haja vontade e ousadia para não envergonhar a padroeira da Moita.
Perante este ‘episódio’ local parece-nos um tanto incisivo abordar a temática dos sinais da fé, na sua expressão pública, tanto na vida pessoal, familiar, social ou eclesial como nas ruas.
= Sinais coerentes de fé?

De muitos modos e por várias formas, a fé se exprime por gestos e sinais, por palavras e silêncios. Nalguns casos estes silêncios suplantam as oportunidades de manifestarmos a nossa fé, que é muito mais do que crença ou até do que mero sentimento... religioso. De facto, num tempo em que se pretende privatizar a fé, em que fomos confrontados com múltiplas sugestões de espiritualidades – muitas delas ‘à la carte’ – e até por expressões que envolvem ignorância do essencial da fé, os cristãos/católicos foram desafiados a viver um ‘ano da fé’. Decorridos três meses de vivência já notamos diferença na nossa fé? Está a nossa fé mais esclarecida e é vivida mais comunitariamente? A fé proclamada tem impacto na nossa vida? Já entendemos as exigências do testemunho da fé, hoje?

Mais do que a rotina de uma proposta vinda do Papa, este ‘ano da fé’ precisa de criar raízes na nossa consciência de vida, tornando-nos sinais coerentes de fé. Precisamos de assumir muito para além dos muros – as paredes, por vezes, esconder barreiras entre os que dizem celebrar a mesma fé! – do templo, as implicações da nossa fé... cristã. Não serão (somente) os ritos que nos farão comprometer, mas antes o sujar as mãos com projectos de fé. Tal como dizia o cardeal Ravasi, em Fátima, em Outubro passado, de pouco adiantará ter as mãos limpas se não as sujarmos com iniciativas de fé ou se isso significar vazio de obras...

= Sinais de fé na rua

Em vários locais do nosso país e mesmo na sociedade ocidental vemos estátuas alusivas a figuras da fé cristã, tanto de santos e santas como de Nossa Senhora (nas mais diferentes invocações e evocações) e de Cristo. Há, na nossa cultura – para inquietação dalguns sectores laicos mais ressabiados! – uma grande diversidade de sinais de fé cristã. No entanto, muitos desses exemplares são de épocas anteriores ao nosso tempo... apesar deste ser pródigo em figurações simbólicas, muitas delas neo-pagãs.

A estatuária reflecte não só a sensibilidade duma época como também revela muita da devoção popular, criando um ambiente fora do templo muito para além dos rituais esteriotipados. Quantas vezes foi em momentos de dificuldade – económica e social – que se ergueram grandes monumentos que perpetuam a memória colectiva. Quantas vezes foi unindo pequenos esforços que surgiram grandes obras de simbologia patriota e mesmo cultural. Quantas vezes gestos de pessoas simples suplantaram a arrogância dos poderosos... políticos ou financeiros.

Neste tempo que nos é dado viver, precisamos de ousadia para que Deus não seja expurgado da memória pública nem que Cristo possa ser varrido dos valores mais elementares e humanos. A rua pode e deve ser, hoje, o púlpito da nossa fé comprometida, professada e testemunhada... com simplicidade e amor!

António Sílvio Couto (asilviocouto@gmail.com)

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Com a verdade (ainda) me enganas?


Por estes dias temos como que sido levados a reflectir sobre questões do foro político, de âmbito social e até de natureza ético-espiritual. De facto, quando ouvimos certas figuras a falar dos problemas que tentam resolver como que temos de questionar se nos estão a falar verdade ou, se não sendo totalmente verdade o que nos dizem, terão possibilidade dalgum crédito as sugestões que nos apresentam... como novidade ou recauchetadas na ideologia (partidária, religiosa ou humanista) a quem parecem, antes, servir e/ou adular.
 
- Quando vemos serem apresentadas medidas para combater o ‘nosso’ actual regime de pobreza, perseguindo com impostos, preferencialmente, os ricos, como que nos fica a dúvida se pretendem acabar com os pobres ou, antes, com os ricos! Estes poderão – quando evangelizados correcta e ousadamente – combater os focos de pobreza, criando empregos e novas condições de vida. No entanto, com a proliferação da cultura dos pobres não sairemos do fosso para onde nos empurarram certos (ditos) combatentes em favor dos tais pobres! Efectivamente, a pobreza dá de comer a muito rico... de orgulho, de ideias feitas e até de pretensões de poder!

Como poderemos crescer se ‘matamos’ quem nos pode ajudar? Como poderemos viver em paz se faltar a justiça? Como poderemos sair da crise se esta nos entristece, amesquinha e envergonha?

 - Muitos contestam – nalguns casos bem e noutros suficientemente mal! – as medidas da (apelidada) austeridade. É verdade que as medidas tocam (quase) sempre aos mesmos, isto é, àqueles que dependem do seu trabalho. Como alguém dizia: hoje já não há operariado, mas precariado... tal é a insegurança dos meios de subsistência. Num caleidescópio de posições vemos que quem governa (normalmente) não tem sabido capaz de explicar as razões e que quem contesta pouco mais tem acescentado do que dizer não e fazer barulho... sem apresentar outras medidas exequíveis no atual estado do país. Até quem pretende eleições não fará – se for mentalmente honesto – diferente do que tem de ser feito, pois assim nos obrigam os credores...

Até onde irá o patriotismo (mais ou menos (inter)nacionalista) se estivermos desacreditados? Se tirarem a contestação alguns (políticos, sindicalistas, comunicação social, etc.) poderão ainda sobreviver social, económica e politicamente?  

- Na proliferação de visões culturais a que estamos, hoje, desafiados a viver temos de ir aprendendo a situar-nos nos diversificados campos de actuação, pois alguns dizem-se inspirados nalguns valores humanistas, mas como que distorcem as metas/objectivos quando têm de servir (mais) a quem os influencia, patrocina ou promove... De facto, há quem reclame reconhecimento das suas ideias, no espaço público e até na comunicação social, mas como que contestam as ideias e os ideais dos outros (só) porque são servidas por valores éticos que nos se coadunam com aqueles mentores. Já todos sabemos como na ‘casa da democracia’ com que classificam (eufemisticamente) o Parlamento se degladiam múltiplos interesses – uns mais visíveis e assumidos e outros mais subterrâneos e quase esotéricos – onde alguns são mestres na contenda e outros – enquanto não aprendem – meros figurantes de manipulações em maré de votação...

Como poderá ser conjugável a liberdade de consciência com a disciplina partidária? A quem servem os deputados: aos que os elegeram ou às forças (do partido, dos interesses ou das ideologias) que os designaram? Para quando a liberdade e o compromisso, ligando os eleitos aos eleitores e vice-versa?

= Nesta etapa da história da humanidade torna-se fundamental criar laços de verdade onde aquilo que se diz condiga com o que se faz e este acto do fazer tenha condições para se concretizar em novas ideias de prossecução da verdade traduzida em projectos de vida, de compromisso e de valorização dos outros, onde cada um de nós é parte e sinal da Verdade total, que é Deus.

Que sejamos dignos de tal viver e testemunhar, aqui e agora!  

 

António Sílvio Couto

(asilviocouto@gmail.com)

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Sinais de (in)coerência... mais ou menos (re)conhecidos


Num tempo eivado de múltiplas notícias – onde umas são factos e tantas outras surgem de meros episódios, há quem lhes chame de ‘não-factos’ – somos continuamente desafiados a ver como é a coerência entre as palavras e o comportamento – tanto do nosso como o dos outros – num quadro de vivência colectiva... mais ou menos (re)conhecida.

Atendendo a que por trás de cada facto está alguém – com perfil aceite e/ou reconhecido – tentaremos – para evitar tocar em melindres e com isso provocar resposta de ‘ofendidos’! – dizer das acções ainda que não descriminando (totalmente) os intervenientes. 

= Quando se fazem campanhas em defesa de um certo cão – provocador da morte de uma criança – com milhares de proponentes... até onde irá caminhar a degradação da nossa condição humana?. Vida de criança e vida cão não têm – assim cremos! – comparação. Mas, se do canídeo todos sabem o nome, como poderemos acreditar na salvaguarda da nossa condição humana, se a criança (já sepultada) se reduz a um simples número! ‘Animal’ vale mais do que humano? Quantas vezes a defesa de redutos animais têm custado o adiamento de obras públicas! Quantas vezes o simples azedar de razões faz com que se cuide mais dos animais do que dos direitos dos humanos! Quantas vezes certos vegetarianos de fachada guerreiam para que os seus pontos de vista se sobreponham aos deveres para com os humanos mais simples e marginalizados!

= Centenas de pessoas vão, diariamente, ao hospital... público ou privado, sob taxas moderadoras ou com taxas já cobradas... em idade mais nova ou na senectude...com problemas habituais ou em momentos ocasionais. Ora, por estes dias, um senhor de provecta idade da nossa praça política teve de recorrer à assistência hospitalar. Politicamente – tanto quanto se sabe da sua ideologia – deveria servir-se do sistema nacional de saúde – que criou, patrocinou e, teoricamente, defendeu – embora – pela capacidade e pelos recursos económicos que deve possuir, tal como as influências que move – possa ir aos serviços do privado. Como se pode classificar quem conteste a solução – do paciente e do seu (anterior!) projecto político – onde aquilo que se diz até parece estar um tanto desfazado do que se faz? Será de cobarde porque se explora o (‘pobre’) necessitado ou de incongruente porque não se segue aquilo que apresenta aos outros? Como se pode viver a exigir aos outros e se é mais tolerante quando isso nos atinge... nem que seja aos mais próximos? Até onde irá a lógica de regime se o regime falha e os seus utentes estão descapitalizados? 

= Repetidamente se diz que o país está em crise e que as pessoas têm dificuldade em prover às suas necessidades essenciais. Há campanhas de ajuda, tendo as mais diversificadas intenções, intervenientes e beneficiários. No entanto, quando se fala de futebol, as coisas mudam de cenário... sobretudo se estão em contendas emblemas rivais – sejam do espectro desportivo, sejam da área sócio-regional ou ainda dos interesses mais ou menos explorados em maré de crise – e se faz dum jogo uma questão de honra... Quem viu a multidão dos especetadores a sair do estádio onde se deu a recente resfrega dos principais competidores do campeonato de futebol terá ficado com dúvidas: mais de sessenta mil – o custo do jogo (viagens, bilhete, comes-e-bebes, etc.) nunca terá andado abaixo dos cem euros – não estão a passar mal, pois ali não se entra sem dinheiro em caixa!... Há imensos interesses em causa, por isso um jogo desta natureza serve de alienação para quem do povo se serve, ao menos, explorando as (suas) paixões clubísticas... Os adversários ainda estão conscientes na hora de dirimirem os lances (mais ou menos) polémicos? Nem sempre a racionalidade tem espaço nas questões desportivas... pois, por muito poucos erros que se cometam, com dificuldade as pessoas os assumem... ontem como hoje!     

Outros tantos sinais de (in)congruência se praticam, embora poucos os assumam, os (re)conheçam e tanto pouco o tentem corrigir! Coerência a quanto obrigas!

 

António Sílvio Couto (asilviocouto@gmail.com)

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Água como bem comum... essencial e vivificador


Por decisão da ONU, 2013 foi declarado ‘Ano internacional para a cooperação pela água’. Embora já haja um ‘dia mundial da água’ – 22 de Março – neste ano temos uma nova focagem no tema da água, onde a cooperação pela água tem múltiplas dimensões, incluindo os aspectos culturais, educacionais, científicos, religiosos, éticos, sociais, políticos, jurídicos, institucionais e económicos.

Em razão da problemática que envolve o tema da água vamos tentar abordar alguns aspectos (mais ou menos) pertinentes:

= Água é vida!

Sendo um recurso natural, a água é essencial para a vida. Dois terços do planeta Terra é água. Sempre que falta a água – seja da chuva, seja do fornecimento potável, seja ainda para a forma mais comum de higiene e mesmo de via de comunicação – como que periga a nossa condição terrena. As zonas áridas – particularmente por ausência de água – como que significam uma quase morte presente ou anunciada.

Talvez possa ser conveniente vermos números da significação e da utilização da água:

- No corpo humano a água é o principal constituinte (entre 70% a 75%) e sua quantidade depende de vários factores estabelecidos durante a vida da pessoa, tais como a idade, o sexo, a massa muscular, o aumento ou perda de peso, o tecido adiposo, e até mesmo a gravidez ou lactação.

- Cerca de 70% da água doce do mundo é consumida pela agricultura.

- Estima-se que, em 2025, mais de metade da população mundial sofrerá com a falta de água potável.    

= Água: negócio ou poupança?

Perante este elemento de bem essencial, que é a água, como que poderemos entender a sua gestão: vendo-a na perspectiva da poupança e como bem comum gratuito ou podendo-a entregar ao negócio especulativo?

Se atendermos à nossa condição portuguesa, desde há quarenta anos, que o fornecimento de água às populações em geral e não só no tecido urbano tem cada vez mais qualidade, tanto em razão do investimento autárquico bem como das infra-estruturas colectivas.

Hoje é habitual termos em casa água de boa qualidade e, normalmente, a um preço acessível. Também sabemos – infelizmente pelas razões sociais mais recentes – que a água é dos bens em que se corta, quando há dificuldades económicas ou quando outras necessidades se sobrepõem... Por isso, as questões de higiene – onde o uso da água também entra – denotam, hoje, um dos campos mais atribulados e em restrição...

Tem-se falado na hipótese da privatização da água, enquanto outros ripostam contra essa pretensão... mas que isso não sirva para criar conflitos à volta deste bem tão essencial. Que seja feito o melhor possível para termos água de boa qualidade, a preço acessível e com abertura ao cuidado dos outros!...

= Para uma espiritualidade da água

A água é considerada como purificadora na maioria das religiões, no hinduísmo, no cristianismo, no judaísmo, no islamismo e no xintoísmo. O baptismo nas igrejas cristãs é praticado com água, simbolizando o nascimento de um novo ser, purificado pela remissão dos pecados.

No judaísmo e no islamismo, é ministrado aos mortos um banho de água purificada, simbolizando a passagem para a nova vida espiritual eterna. Na Bíblia, o termo ‘água’ é mencionado 442 vezes.

Talvez seja útil, neste ‘ano internacional para a cooperação pela água’, que possamos viver numa nova atitude quer da utilização da água nas nossas tarefas quotidianas, quer na simbologia mais de índole espiritual. Será certamente diferente usar a água como elemento utilitário ou como entidade da natureza que nos foi concedida por Deus, desde a mera lavagem até à envolvência em purificação e como força regeneradora da nossa existência em condição terrena...

Mergulhados na água do baptismo viveremos a força da fé, tanto em dimensão pessoal como comunitária!

 

António Sílvio Couto

(asilviocouto@gmail.com)

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Sacrifícios, facturas e devaneios


Agora, que iniciámos um novo ano civil, talvez seja, no mínimo, de nos aferirmos às realidades, de nos adaptarmos às pessoas e de nos conferirmos com os objectivos mais ou menos congruentes com a nossa vivência pessoal, familiar, social, política, económica e psicológica.

Desde já uma nota: retomaremos a escrever com a grafia de antes do (pretenso) acordo ortográfico, pois, se o Brasil só lhe confere validade, em 2016, porque havemos de reduzir a nossa expressão escrita à maneira deles, se eles (os brasileiros) nos consideram sem valor de igual respeito! 

= Sacrifícios não explicados... valerão a pena?

«São muitos, e cada vez mais, os que se interrogam sobre a razão dos sacrifícios que lhes são exigidos e se esses sacrifícios serão realmente necessários e úteis. Os cidadãos anseiam saber se vale a pena o esforço que estão a fazer e se, no final, o País chegará a bom porto».

Este breve excerto da mensagem de ano novo do Presidente de República portuguesa como que foi entendido na linha de correcção deste ao governo perante as (mais) graves medidas preconizadas para este ano de 2013. Com efeito, temos de concordar que, quem nos governa, não tem sabido explicar aos governados todas as implicações dos sacrifícios exigidos... nem sequer a discrepâncias para com os reformados mais ‘ricos’, obrigando-os a serem taxados de forma um tanto dura e desigual!

Para além das tricas politiqueiras com que certas forças partidárias e seus apaniguados nos têm tentado entreter, vemos com preocupação que nem sempre quem nos governa se mostra adequadamente preparado para exercer os cargos que lhes foram confiados. Tem havido atitudes de responsáves – tanto no governo como nas oposições – de quem ninguém conhece outra ‘profissão’ do que a verborreia do mando, ora contra, ora a favor e quase sempre aspirando a mandar mesmo que sem as qualidades mínimas – humanas, culturais, intelectuais, cívicas, morais e até psicológicas – exigidas... Não basta fazer carreira sob a alçada de algum padrinho influente nem sequer percorrer as etapas do carreirismo, pois, quando se é elevado, logo se percebe o (des)valor!

Temos, entretanto, visto e ouvido que as forças ideológicas valem mais do que as ditas partidárias, sendo que algumas delas são transversais aos vários elencos partidários. Não deixa, no entanto, de ser preocupante que alguns se achem mais patriotas pelo facto de recusarem a União Europeia, apesar de usufruirem dos benefícios que ela lhes tem trazido e até concorram a cargos de representatividade no Parlamento europeu – seria lógico que não se candidatassem e que recusassem os proventos que auferem pagos pelos inimigos capitalistas! – muito embora perdessem o palco para a contestação e um certo enriquecimento social!

De facto, a coerência não é virtude que esteja em boa cotação pelas esferas públicas e políticas deste nosso país. Precisamos de verdade e de sentido de responsabilidade, deixando a quem for mais capaz a possibilidade de servir e não de se servir... dos lugares de governo, seja qual for a instância do seu exercício.

 

= Cultura do bem comum: facturas, sim ou não?

No passado mês de Agosto, foram publicados em Diário da República os Decretos de Lei n.º 197/2012 e n.º 198/2012, que apresentam alterações substanciais ao nível das regras de facturação, com aplicação já a partir de 1 de Janeiro de 2013.
Entre as principais alterações, destaca-se: passa a ser obrigatória a emissão de facturas para todas as entidades, independentemente do valor de emissão; são eliminados todos os tipos de documentos "equivalentes à factura" (tais como vendas a dinheiro, talões de venda, etc.); passa a ser obrigatória a comunicação de todos os documentos de facturação emitidos à Autoridade Tributária (AT), até ao dia 8 do mês seguinte à emissão do documento; os sujeitos passivos são obrigados a comunicar à AT os elementos dos documentos de transporte processados, antes do seu início; a comunicação efectuada à AT pode ser automática, através de um webservice.

- Na factura deve constar: data, número sequencial, nome ou denominação social e número de identificação fiscal do fornecedor dos serviços prestados, quantidade e denominação social dos bens transmitidos ou serviços prestados, preço líquido de imposto, as taxas aplicáveis e o montante do imposto devido ou o preço com a inclusão do imposto e taxas aplicáveis, NIF do adquirente ou destinatário, identificação e domicílio do adquirente ou destinatário, data em que os bens foram colocados à disposição do adquirente ou que os serviços foram realizados, se diferente da data da factura, motivo de isenção do Iva, quando aplicável. 

Desde as primeiras horas deste ano que vemos uma certa aversão a esta medida, pois nem todos estão – consciente ou inconscientemente – preparados para fazer deste comportamento uma atitude cívica e económica normal. Quando ouvimos dizer que, um quarto da economia portuguesa, é paralela de fuga ao fisco, como poderemos sair do atoleiro em que nos fomos enterrando? Para quando criarmos uma consciência cívica que deseje participar no bem comum e em que abandonemos essa propensão – quase congénita – de fuga aos deveres?

De facto, a lealdade, infelizmente, não tem grandes cultivadores neste nosso país. Nunca tivemos – como na maior parte da Europa – de unir forças para recuperarmos da desgraça comum! Temos, urgentemente, de viver numa cultura de combate à mentira e à aldrabice, sem vivermos acima das nossas possibilidades... reais e assumidas. 

Basta de devaneios, mãos ao trabalho honesto, competente e sincero! O futuro merece melhor.

 

António Sílvio Couto

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Entre ‘já’ e ‘ainda não’... vivendo ‘talvez’!


Se usarmos a linguagem teológica, decorrente da mentalidade expressa, de sobremaneira, no Concílio Vaticano II, saberemos que a conjugação das expressões ‘já’ e ‘ainda não’ se reportam à condição de contingêngia da presença da Igreja no mundo, na medida em que já vive a plenitude de Deus, mas ainda não a exprime de forma plena... Concretamente na constituição dogmática, Lumen gentium, sobre a Igreja (números 48 a 51) se fala na índole escatológica da Igreja peregrina e a sua união com a Igreja celeste, bem como na constituição pastoral, Gaudium et spes, sobre a Igreja no mundo actual (números 40 a 45) se refere a função da Igreja no mundo... pela cidadania cristã onde cada qual vive e aponta para mais Além...

1. Situação do ‘já’... presente e escatológico

Sem pretendermos entrar em lições de natureza teológica, poderemos interpretar o tempo em que vivemos – concretamente o futuro do novo ano – como a oportunidade que nos é concedida para percebermos o que ‘já’ aconteceu de real e vivenciado, tendo em conta a força radical em Jesus, Verbo encarnado e redentor: n’Ele, por Ele e com Ele o ‘já’ da história tem novo significado e a nossa condição terrena e temporal de crentes, sobretudo, em Cristo, ganha outra dimensão e actualização.

Num tempo bastante marcado pelo relativismo imediatista, onde, por vezes, cada pessoa faz de si mesma uma espécie de ‘absoluto’, que tenta aniquilar os outros relativos, como que se torna urgente encontrar as marcas divinas em cada um dos nossos companheiros de caminhada e/ou interlocutores: assinalados pela dimensão divina – onde pela força do baptismo será ainda mais notável e indelével da graça de Deus em nós! – somos chamados a viver no ‘já’ de relação com os outros, apresentando uma dignidade divinizante e divinizadora.

2. Condição do ‘ainda não’... em memória prospectiva

De facto, há vivências – sobretudo para os cristãos – que têm no desígnio divino a marca do presente escatológico em situação do ‘já’, embora em proposição do ‘ainda não’: estamos salvos, mas em contingência de pecadores; estamos glorificados, mas em condição de penitentes; estamos a viver o Reino de Deus, mas em condescendência de sementes... para a eternidade.

Quantas vezes sentimos e vivemos o ‘ainda não’ da vitória sobre a nossa condição pecadora. Quem não se escandaliza com as faltas – leves, graves ou mortais – de tantos dos cristãos, a começar pelos seus ministros! Quem não será susceptível à vaga de críticas aos erros da Igreja – sobretudo na dimensão católica – particularmente por ocasião das principais festas religiosas tradicionais, do Natal e da Páscoa! Com que furor – nalguns casos a roçar a fúria! – são expostas algumas das mazelas morais de membros do clero, desde que possam desviar a atenção de outros grupos e influentes sectores mais ou menos conhecidos... no âmbito da política contra a família, anti-vida e (até) no alcance da justiça... adiada!

3. Vivendo sob conjugação do ‘talvez’!

De verdade a ditadura do relativismo em que nos movemos como que pode condicionar a atitude de vida de muitos dos cristãos: vivemos numa certa era do descartável, onde pessoas e coisas se tornaram aparentemente importantes se delas nos aproveitamos mais ou menos com interesse... Depois duma moral rigorista – e quase estóica, senão no pensamento pelo menos na práxis! – agora vivemos num quase epicurismo popular e num hedonismo inteletual, procurando cada qual tirar proveito de si e dos outros como se fôssemos meros objetos de consumo... a curto prazo.

Nesta etapa do ‘talvez’ torna-se fundamental uma nova educação para os valores, tendo em conta os transcendentais – uno, bem, belo e verdade – e a sua aplicação à cultura de cada um. Com efeito, o ‘talvez’ poderá fazer a ponte entre o ‘já’ do ser e o ‘ainda não’ do existir, criando as condições mínimas e suficientes para que possamos viver nesta condição terrena de designados por Deus para sermos, neste mundo e neste tempo, os sinais divinos de Cristo e as centelhas do Espírito de Deus em cada lugar...

António Sílvio Couto (asilviocouto@gmail.com)

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Para uma nova ética da paz


«A paz pressupõe um humanismo aberto à transcendência; é fruto do dom recíproco, de um mútuo enriquecimento, graças ao dom que provém de Deus e nos permite viver com os outros e para os outros. A ética da paz é uma ética de comunhão e partilha. Por isso, é indispensável que as várias culturas de hoje superem antropologias e éticas fundadas sobre motivos teorico-práticos meramente subjetivistas e pragmáticos, em virtude dos quais as relações da convivência se inspiram em critérios de poder ou de lucro, os meios tornam-se fins, e vice-versa, a cultura e a educação concentram-se apenas nos instrumentos, na técnica e na eficiência. Condição preliminar para a paz é o desmantelamento da ditadura do relativismo e da apologia duma moral totalmente autónoma, que impede o reconhecimento de quão imprescindível seja a lei moral natural inscrita por Deus na consciência de cada homem».

Na sua mensagem para o 46.º dia mundial da paz (1 de janeiro), o Papa Bento XVI centra a sua atenção na proclamação da bem-aventurança dos que fazem a paz.

Respigamos algumas das ideias que o Papa nos deixa como pistas de reflexão de conduta de vida... cristã neste tempo... colocando, por nossa parte, breves conclusões:

- Bem-aventurados os obreiros da paz – ‘as inúmeras obras de paz, de que é rico o mundo, testemunham a vocação natural da humanidade à paz. Em cada pessoa, o desejo de paz é uma aspiração essencial e coincide, de certo modo, com o anelo por uma vida humana plena, feliz e bem sucedida’.

- A bem-aventurança evangélica – ‘Jesus Cristo dá-nos a paz verdadeira, que nasce do encontro confiante do homem com Deus’.

- A paz: dom de Deus e obra do homem – ‘A paz envolve o ser humano na sua integridade (...) A realização da paz depende sobretudo do reconhecimento de que somos, em Deus, uma única família humana (...) A Igreja está convencida de que urge um novo anúncio de Jesus Cristo, primeiro e principal fator do desenvolvimento integral dos povos e também da paz’.

- Obreiros da paz são aqueles que amam, defendem e promovem a vida na sua integridade – ‘Caminho para a consecução do bem comum e da paz é, antes de mais nada, o respeito pela vida humana, considerada na multiplicidade dos seus aspetos, a começar da conceção, passando pelo seu desenvolvimento até ao fim natural. Assim, os verdadeiros obreiros da paz são aqueles que amam, defendem e promovem a vida humana em todas as suas dimensões: pessoal, comunitária e transcendente. A vida em plenitude é o ápice da paz. Quem deseja a paz não pode tolerar atentados e crimes contra a vida’.

- Construir o bem da paz através de um novo modelo de desenvolvimento e de economia – ‘Para sair da crise financeira e económica atual, que provoca um aumento das desigualdades, são necessárias pessoas, grupos, instituições que promovam a vida, favorecendo a criatividade humana para fazer da própria crise uma ocasião de discernimento e de um novo modelo económico’.

- Educação para uma cultura da paz: o papel da família e das instituições – ‘Ninguém pode ignorar ou subestimar o papel decisivo da família, célula básica da sociedade, dos pontos de vista demográfico, ético, pedagógico, económico e político. Ela possui uma vocação natural para promover a vida: acompanha as pessoas no seu crescimento e estimula-as a enriquecerem-se entre si através do cuidado recíproco’.

- Uma pedagogia do obreiro da paz – ‘Há necessidade de propor e promover uma pedagogia da paz. Esta requer uma vida interior rica, referências morais claras e válidas, atitudes e estilos de vida adequados (...). Pensamentos, palavras e gestos de paz criam uma mentalidade e uma cultura da paz, uma atmosfera de respeito, honestidade e cordialidade. Por isso, é necessário ensinar os homens a amarem-se e educarem-se para a paz, a viverem mais de benevolência que de mera tolerância (...). Isto requer a difusão duma pedagogia do perdão. (...) A pedagogia da paz implica serviço, compaixão, solidariedade, coragem e perseverança’.

= Perante estes desafios de Bento XVI como que podemos e devemos perscrutar os desígnios de Deus para nos comprometermos na construção da cultura da paz, pelo serviço à vida, tendo a família como espaço pedagógico e cultural, anunciando, em Igreja católica, de forma nova e ousada a Pessoa e a mensagem de Jesus, o Príncipe da Paz, ontem como hoje e por toda a eternidade!

 

António Sílvio Couto

(asilviocouto@gmail.com)