Causou alguma surpresa a publicação da iniciativa post-mortem de uma certa figura – saída essencialmente do mundo do desporto – que deixou escrito quem não queria ou quem desejava que estivesse no seu funeral. Não fosse vir de quem veio e o assunto poderia ser classificado como de bizarro. No entanto, o ruído que a noticia deixou, faz-nos refletir mais sobre o alcance do assunto do que sobre as razões subjetivas daquelas atitudes.
1.Desde logo podemos questionar: quem é alguém para dizer quais são ou serão os que irão ou não ao velório ou ao funeral? Terá isso algum interesse ou alcance que não seja uma espécie de ridículo e quase fantasioso? Será que o futuro defunto apresentará algum sinal de desacordo quanto ao incumprimento dos seus desejos? Estas vontades não revelarão uma visão algo patética da vida do sujeito e dos seus complementos? Ou será que isto não passou de mais um número do circo em que, por vezes, certas figuras querem transformar a sua vida e a dos outros?
2. De facto é na hora da morte que se manifestam muitos dos mistérios insondáveis da vida, mesmo que tal não se deseje. Por muito que se pretenda iludir ou disfarçar será, nesse momento derradeiro, que se escreverá o que somos ou como fomos. O prazo de validade dos elogios para com alguém que morre tem a duração (ou menos) das flores que colocam como enfeite em volta do esquife. Seja qual for o entendimento que se tenha da vida – esta que se vê ou a outra que não se vê de forma natural – a etapa derradeira e verdadeira será a da passagem da morte. Salvo raras exceções cada um colhe o que semeou…
3. Brevemente celebraremos – ao nível católico – duas datas complementares deste assunto que estamos a abordar: a solenidade de Todos-os-Santos e a comemoração de todos os Fiéis Defuntos. Todos sabemos da ‘cristianização’ de festas pagãs anteriores ao cristianismo. Repare-se, neste processo de neo-paganização crescente, a valorização social (e não só) do ‘halloween’ como ritual dos mortos.
A maioria das tradições de halloween teriam origem nos antigos festivais celtas chamados Samhaim, que marcavam a passagem de ano e a chegada do inverno. Para os celtas, o início do inverno representava a aproximação entre este mundo e ‘mundo’ onde vivem os mortos. Os celtas acreditavam que no início do inverno os mortos regressavam para visitar as suas casas e que assombrações surgiam para amaldiçoar os seus animais e colheitas. Os símbolos que vemos recuperados hoje para viver o halloween eram formas utilizadas pelos celtas para afastar esses maus espíritos.
De entre as várias tonalidades para ‘celebrar’ o Halloween realçamos uma, com origem na Grã-Bretanha e que foi popularizada nos Estados Unidos na década de cinquenta, sobretudo através do cinema: aquela em que crianças vão de porta-em-porta dizendo: em inglês trick or treat (doce ou travessura). Caso a pessoa não dê algum brinde como doces ou dinheiro, as crianças fazem alguma travessura na sua casa.
Esta ‘tradição’ do halloween tem, no nosso país, expressão através do ‘pão-por-Deus’ também vivenciado nesta época do ano.
4. Ao nível cristão – e católico em especial – houve uma resposta a esta tendência que hoje está mais visível que noutras épocas. Recordemos que a ‘solenidade de Todos os Santos’ vem do século IV. Em Antioquia, celebrava-se uma festa por todos os mártires no primeiro domingo depois de Pentecostes. A celebração foi introduzida em Roma, na mesma data, no século VI, e cem anos depois era fixada no dia 13 de maio pelo Papa Bonifácio IV, em concomitância com o dia da dedicação do “Panteon” dos deuses romanos a Nossa Senhora e a todos os mártires. No ano de 835, essa celebração foi transferida pelo Papa Gregório IV para o primeiro dia de novembro.
5. A comemoração dos Fiéis Defuntos – a 2 de novembro – é uma complementaridade para com os cristãos/católicos que morreram na comunhão da fé em Igreja. Lembrá-los é gratidão e oração…
António Sílvio Couto
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