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segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

Via-sacra com as profissões

                                   
                                 
A devoção da via-sacra tem razoável aceitação entre os católicos, sobretudo, do sul da Europa, naquilo que é um exercício de piedade popular em ligação à vivência da Quaresma.

Há muitas e várias formas de meditar os mistérios da Paixão-Morte-Ressurreição de Jesus. No contexto atual das propostas de esquemas há, pelo menos duas, que têm alguma aceitação: uma mais tradicional (onde se incluem as três quedas de Jesus e os encontros com a Verónica e Maria) e outra dita mais bíblica, que foi proposta pelo Papa João Pulo II, por ocasião do jubileu do ano 2000.
Quanto aos temas a desenvolver em cada sugestão de via-sacra, podem ser vários e devem ajudar a rezar algum aspeto mais particular da vida humana e eclesial.
Ao longo dos anos tenho procurado não cair na rotina do ritmo da via-sacra, tendo – nalguns casos – sido essas propostas publicadas pela Paulinas Editora. Já foram desenvolvidas sugestões de via-sacra versando os seguintes temas: obras de misericórdia (2007), com os pecados capitais e sociais (2010), nas mãos de Deus pelas mãos dos homens (2012), via crucis - via lucis (2013), na via-sacra olhamos...na via lucis somos olhados (2014)... Outros temas foram rezados (como a família ou a Igreja, caminho de Deus nos caminhos dos homens...e até houve uma via-sacrea para crianças), mas sem publicação de maior difusão.
Este ano senti a necessidade de enfrentar um outro desafio: colocar as etapas da Paixão de Jesus em confronto com as diversas profissões, numa leitura cristã das mesmas e numa consonância com aspetos subjacentes aos textos bíblicos. Sigo a proposta de via-sacra bíblica de João Paulo II.

Em sumário as ‘estações’ da via-sacra e as profissões em análise/oração:

1. Jesus em ao Jardim das Oliveiras (Mt 2,3-38) – o setor do ensino pode ser colocado aqui nesta etapa da Paixão de Cristo, pois, à semelhança de Jesus em agonia, assim esta área social e profissional tem estado em caminho duro de via-sacra. Os problemas e as dificuldades, as contestações e os anseios desta profissão têm feito correr muito tempo de discussão.

2. Jesus, traído por Judas, é preso (Mt 26,47-49) – as forças de segurança mais na sua função de ordem pública do que de repressão sobre quem não-cumpra as leis e possa perturbar a convivência social.

3. Jesus é condenado pelo sinédrio (Mt 26,57-59) – o mister de exercer a justiça – juízes e advogados – ao nível de tornar a sociedade mais equilibrada nas leis, nos comportamentos e nas relações humanas das pessoas umas com as outras.

4. Jesus é renegado, três vezes, por Pedro (Mt 26,69-74) – a comunicação social – escrita, falada ou visionada – como espaço e oportunidade de testemunhar Jesus, mas onde, tantas vezes, os cristãos se envergonham de manifestar o seu seguimento de Jesus.

5. Jesus é julgado por Pilatos (Mt 27,11-14.25-26) – os que fazem a vida politica – desde a mais simples até à mais complexa, da sincera e verdadeira até à mais rebuscada e ardilosa…Também aqui podemos encontrar ou não cristãos que podem servir ou se servem dos lugares de decisão.

6. Jesus é flagelado e coroado de espinhos (Mt 27,27-30) – consideramos a profissão de representação com atores, nos diversos palcos da arte e da vida. Na subtileza de fazer sonhar, os atores podem também ofender a dignidade da pessoa humana, não respeitando nem sendo respeitados na sua vida artística.

7. Jesus é carregado com a cruz (Mt 27,31) – olhamos para as várias formas de trabalho mais ou menos esforçado, como a construção civil, na agricultura, nas pescas, isto é, no designado ‘setor primário’ como aquele que produz resultados económicos devido ao uso da força do trabalho.

8. Jesus é ajudado pelo Cireneu a levar a cruz (Mt 27,32) – de atividades profissionais de atenção aos outros podemos enquadrar aqui quem trabalha na área da saúde, do voluntariado ou mesmo em ações de benemerência.

9. Jesus encontra as mulheres de Jerusalém (Lc 23,27-32) – olhamos para quem trabalha no setor da solidariedade social – santa casa da misericórdia, centro paroquial e outras associações organizadas da caridade na Igreja católica – tanto os órgãos sociais como os profissionais, na área da infância/adolescência e de velhos.

10. Jesus é crucificado (Mt 27,33-38) – o desporto, desde o amador e simples até ao profissional e mais complexo. De facto, este setor socioprofissional, por vezes, torna-se um espaço difícil para dar testemunho do ser cristão, pois, entre vitórias e derrotas nem sempre é fácil manter o equilíbrio, o bom senso e a total verdade…

11. Jesus promete o seu reino ao «ladrão arrependido» (Lc 23,39-43) – olhamos para o setor do turismo, como atividade humana, na sua dimensão cultural e como fator económico.

12. Jesus na cruz: a mãe e o discípulo (Jo 19,25-27) – quem dedica a vida vocacionalmente aos outros, como as congregações de religiosas e de religiosos, que tantas vezes se dedicam aos seus irmãos... sobretudo nas situações de maior condicionamento humano, social e também eclesial.

13. Jesus morre na cruz (Mt 27,45-50) – olhamos para aqueles que fazem dos meios de viação espaço de vida, isto é, quantos andam na estrada, pelos mares e pelos ares, servindo outros cidadãos que igualmente viajam e percorrem os caminhos da vida rumo à eternidade.

14. Jesus é colocado no sepulcro (Mt 27,57-61) – para aqueles que exercem a profissão de darem sepultura ao corpo dos outros, seja pelo enterramento seja pela mais recente vivência da incineração. Para além de uma atividade humana podemos olhar para esta função social como uma obra de misericórdia.

Esta sugestão de vivência da ‘via-sacra com as profissões’ – estas aqui vistas ou podiam ser outras – pode ajudar a ver as nossas ocupações de vida à luz e na referência à Paixão de Cristo. Assim o vivamos e rezemos.



António Sílvio Couto




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