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quinta-feira, 2 de fevereiro de 2023

O escândalo do palco

 


A faceta que mais me escandaliza no assunto do palco-altar das JMJ 2023 é algo que não vi ainda referido. Com efeito, os custos podem atordoar alguns dos mais rigoristas em matéria de aspetos materiais. Outros como que se confundem com a mistura entre entidades públicas e questões privadas… se bem que a Igreja católica não pode ser lida no sentido estrito de privado. Outros ainda aproveitam para sacar da memória eventos e obras ditas faraónicas no passado, mas que agora consideram aceitáveis.

A mim cria-me engulhos bem mais difíceis de tragar: aquele espaço onde vai ser celebrada a missa e outros momentos certamente de repercussão espiritual, poderá vir a ser usado para fins soezes e contrários ao projeto primeiro… Este é o meu escândalo e pomo de discórdia…silenciosa.

1. Dizia, há dias, o lead da manchete um jornal entre o sarcástico e o provocatório: «um bispo com a mania das grandezas e um autarca ansioso por agradar à custa do erário público estão a transformar a jornada mundial da juventude num negócio pouco católico»… E, para ilustrar o assunto com algo mais religioso-bíblico, era citado Mt 6, 24: ‘ninguém pode servir a dois senhores: vós não podeis servir a Deus e ao dinheiro’. Que tem esta observação de real ou mesmo de credível? Como poderemos entender as intervenções recentes destes personagens aqui referidos? Andará o assunto a ser bem tratado ou o que tem sido dito é apenas a ponta de um icebergue em deslocação no mar atribulado da nossa sociedade com tiques de cristandade profana?

2. Como seria expetável com o aproximar das JMJ 2023 são como que plantadas – a propósito ou a despropósito – notícias para descreditar o evento naquilo que ele tem sinal religioso, como marca da presença dos cristãos no mundo e até como referência universal aos valores do Evangelho.

* As JMJ são um sinal religioso num mundo cada vez menos atento às coisas de teor espiritual. Não será isto uma espécie de pedra de tropeço para quem vive como se Deus não existisse? Não será ponto de incómodo para tantos que pretendem deixar que Deus esteja morto e enterrado na consciência dos mais novos?

* As JMJ são uma marca indelével da presença dos cristãos no mundo e difundida em todos os continentes, povos, culturas e línguas. Os jovens não estão todos, afinal, fascinados pela sociedade de consumo. Muitos ainda olham para o Alto com uma visão de futuro e de compromisso. Ao ver tantos jovens vindos de todas as partes do mundo, isso não provocará medo aos cultivadores do materialismo de vida? A ver por anteriores jornadas talvez seja preferível desdenhar do que ser confundido…

* As JMJ só tem razão de ser, se forem alicerçadas nos valores do Evangelho, esse que continua vivo e atrai quem dele se aproxima. Num tempo de alguma desorientação não será fascinante ver tantos jovens que nos alertam para que não chafurdemos só nas coisas passageiras? Com tantas promiscuidades de vária índole, não será alentador que possa haver um fermento, que pretende ser sal da terra e luz do mundo?

3. Ardilosamente tem sido trazido à colação o choque dos custos do dito palco – onde será colocado o altar para a celebração com o Papa – com as dificuldades acirradas do povo. Ora este, pelo que temos visto, continua a gastar o que tem e o que não tem, sem olhar as despesas nem esboçando a mínima economia. Dá a impressão que vivemos num país a várias velocidades, onde, quando interessa, nos fazemos passar por ricos e noutras circunstâncias entramos num miserabilismo atroz, sem saída nem futuro. Haja coragem e diga-se que os custos do palco-para-o-altar do Papa serve lindamente como arma de arremesso contra o cristianismo em geral e a Igreja católica em particular. Escusam de se esconderem sob o manto do proletarismo barato…

4. Efetivamente o meu escândalo está aí: a muito custo aceitarei que se dessacralize aquele altar para se tornar o espaço em lugar de diversão, sob a fúria do capitalismo musical ou de qualquer outra senhoria, que possa ofender Deus e os valores do Evangelho. Senhores promotores daquela obra tão polémica: não deixem que seja profanado aquilo que tanto gosto lhes deu em contestar. Sigam, no mínimo, o que deveio com o espaço onde decorreu a Expo/98 e tudo valerá a pena… Não sejamos mesquinhos nos nossos intentos!



António Sílvio Couto

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