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quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

Ó céus do alto rociai

 


Escutei, há dias, este cântico:

Ó céus do alto rociai. / O justo, ó nuvens chovei.

Germine a terra o seu Deus. / O Adonai, nascei, nascei’.

 Embora seja apresentado, nos meios da internet, como de autor desconhecido e com sabor popular, recordo-me de escutar este cântico em contexto litúrgico e sendo atribuído a um autor bracarense.

Como expressão orante do tempo do Advento pode servirnos para reparar nalguns aspetos nesta preparação em ordem ao Natal.

Desde logo o que significa: ‘rociai’? É uma palavra de origem latina (roscidare, roscidus) e significa: cair orvalho, orvalhar...numa súplica voltada para o Alto e em atitude de abertura à condução divina...na terra.

 1. Por vezes ouve-se de algumas pessoas uma observação que tem tanto de interessante quanto de esquisita: vou ao menos à ‘missa da galo’... no resto do ano não tenho tempo e nem sempre me apetece. Quem tal refere poderá ter as suas convicções religiosas, mas talvez não assentem em alicerces cristãos. Quem tal se considere ‘praticante’ poder-se-á iludir com rituais, mas sem fundamentação cristã. Quem tal faz será crente ou meramente religioso, à sua maneira?

 2. Por outra perspetiva vou constatando que alguns dos nossos fregueses – no sentido etimológico do termo, da procedência do latim: ‘filius ecclesiae’ (filho da igreja) – frequentam as celebrações do Natal, mas não fizeram com os outros a preparação do mesmo, pela caminhada do tempo do Advento, esse mesmo colocado na dinâmica liturgico-eclesial para ser preparação da ‘vinda do Senhor’. Efetivamente muitos dos nossos ritos, ainda sociais de cristandade, parecem ter pouco a ver com aquilo que se poderá designar de compromisso, isto é, cada um vai ou não, conforme lhe dá jeito; cada um vai aqui ou ali à missa (de domingo ou outra) mais em conformidade com os seus interesses do que com o vínculo que sente e que vive com aqueles com quem celebra a fé; cada um – e são tantos – usa das coisas da Igreja mais em função da sua conveniência do que em razão de uma caminhada comprometida...

3. Os ecos e repercussões deste tempo de pandemia como que vieram agravar o razoável descompromisso de uma boa parte dos nossos fregueses. Estamos a pagar a fatura de termos andado a dar sacramentos a pessoas não-evangelizadas. Muitas das celebrações do batismo são realizadas mais em razão da festa do que em consonância com a fé mínima e suficiente. A maior parte dos casamentos são feitos na igreja, mas muito pouco em sintonia com a Igreja. Uma percentagem dos crismados são aceites mais no termo de um tempo de ‘catequese’ do que pela catequização desenvolvida... o sinal vê-se nos dias seguintes à cerimónia – quando devia ter sido celebração – na ausência à assembleia celebrante...

 4. De que adianta haver uns tantos que se dão ao cuidado de denunciar, de esgrimirem razões ou de se empenharem em soluções, senão houver um plano diocesano no qual todos se comprometam? Está em desenvolvimento o processo sinodal em toda  a Igreja e nas igrejas particulares (dioceses e paróquias), mas quem leu os textos de preparação emanados da Santa Sé? Quem quis refletir sobre as dez questões preparatórias do Sínodo? Quem já designou os dinamizadores dos grupos sinodais?

5. Por estes dias soube do estado de saúde de duas pessoas que muito estimo: o Padre Francisco de Jesus Graça e a Professora doutora Manuela Carvalho. Por interposto amigo escutei o desprendimento de ambos desta face da vida: um e outra sentem-se a ir para o Natal eterno da ressurreição. Não será isto o orvalho de Deus a espargir-se sobre a Terra?

 

António Silvio Couto

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