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quarta-feira, 20 de setembro de 2023

Engarrafamento automóvel e custo dos combustíveis

Por mera coincidência: no mesmo dia em que o gasóleo atingiu o custo mais elevado dos últimos tempos, vi diversos engarrafamentos automóveis em estradas e autoestradas à chegada a uma cidade deste país…por sinal congestionada nos seus acessos e não havia qualquer acidente… Na minha ténue interrogação senti que as reclamações de uns não se repercutem no comportamento de outros, bem como aquilo que se diz não tem efeitos visíveis nas vivências (teórico-práticas) de tantos outros…

1. O agravamento dos preços dos combustíveis (gasolina, gasóleo ou gás) tem vindo a oscilar de forma cíclica e quase sempre em crescendo. Se tivermos por parâmetro o tempo após a pandemia (maio de 2022), o quadro de mudanças deixa-nos uma visão significativamente agravada para quem tenha de usar os tais combustíveis fósseis como recurso para a deslocação. Com efeito, o uso destes meios de produção de energia têm custos ainda mais agravados pelos impostos lançados por quem decide: mais de metade dos custos finais ao consumidor são de alcavalas que beneficiam os decisores político-económicos. Estes impostos indiretos constituem uma fonte de receita de enorme gestão – pior ainda – com a galopante inflação…

2. Por outro lado, o crescimento dos veículos em circulação contínua imparável e nem os referidos aumentos dos fatores de gasto condicionaram a contenção das vendas, bem pelo contrário… A melhoria da qualidade dos veículos trouxe uma explosão de vendas e, consequentemente, de chapa em circulação. Quando se pensaria que o preço dos combustíveis poderia arrefecer o consumo, este cresceu de uma forma impressionante. As vias de comunicação melhoraram e encheram-se de material circulante, tornando autoestradas de três e quatro faixas contínuos parques de estacionamento em deslocação… lenta e atribulada.

3. Cada vez que aumentam os preços dos combustíveis vemos pessoas a reclamarem de forma enérgica, mas parece que tais desabafos são para que os outros recuem, não os reclamantes. Deste modo se poderá compreender que as estradas e ruas das vilas e cidades estejam pejadas de veículos, embora se tornem insuficientes os espaços para acomodar tantos carros e carrões… Há situações de famílias em que são mais os veículos do que as pessoas à mistura das viagens em que não se vê mais do que um ocupante por meio de deslocação…

4. As ténues e incipientes reclamações de alguns contra o uso de combustíveis fósseis para que seja produzida outra forma de energia para os meios de transporte mais parece uma brincadeira de crianças-em-faz-de-conta do que algo sério e com repercussão no futuro. Por estes dias ocorre uma iniciativa bizarra do ‘dia sem carros’. Certos clichés usados fazem mais sorrir do que levam a refletir: bicicletas ou patins resolvem o problema da deslocação das populações para os empregos, muitos deles a quilómetros da morada habitual? Mais do que parecer uma alteração ao sistema de transporte não deveriam incentivar-se novas formas de saber estar nas cidades e aldeias pejadas de obstáculos à população, sobretudo mais velha ou um tanto dependente na locomoção?

5. Quando se pensava que ter carro significava ‘qualidade de vida’ como que isso é posto em causa pela exigência de salvaguardar o futuro do Planeta. Para além das questões poluentes dos veículos e da exploração dos recursos da natureza, urge ter em conta que cada um não pode comportar-se como ‘senhor’ dos recursos, mas tem de cuidar da ‘casa comum’ numa ecologia integral, nas palavras e ideias do Papa Francisco, que, brevemente, nos facultará uma segunda parte da encíclica ‘Laudato sí’.

«A ecologia integral é inseparável da noção de bem comum, princípio este que desempenha um papel central e unificador na ética social. (…). O bem comum pressupõe o respeito pela pessoa humana enquanto tal, com direitos fundamentais e inalienáveis orientados para o seu desenvolvimento integral» (Francisco, Carta encíclica sobre o cuidado da casa comum, ‘Laudato sí’, n. os 156-157).



António Sílvio Couto

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