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quarta-feira, 13 de setembro de 2023

Do irritante ao irritadiço até à crispação

 

À boa maneira de um tempo de crise, vão-se inventando epítetos e cognomes aos nossos governantes, tanto do passado como do presente. Assim, a quem tenta vender patranhas como se fossem projetos de sucesso garantido, alcunharam-no de ‘otimista irritante’. A quem não se cala, mesmo que podendo exorbitar as funções para que foi eleito, autoapelidou-se de ‘otimista realista’. Noutras épocas chamaram a um governante ‘picareta falante’ pela forma de verbo fácil (verborreia) e de comunicação fluida…

1. Nos tempos que decorrem nota-se que as pessoas estão cada vez mais irritadiças e com pouca (ou quase nenhuma) paciência para com os outros. Vemo-lo nas filas de atendimento (público ou privado), nas estradas e ruas com o trânsito automóvel, nas circunstâncias normais ou nas extraordinárias, desde os acontecimentos desportivos até aos de índole religiosa ou mesmo em espaços de peregrinação… Numa palavra: as pessoas andam irritadas consigo mesmas e manifestam-no para com os outros.

2. Nota-se que é privilegiado mais o protesto do que a aceitação das contrariedades, com sinais que podem tender a crescer, se houver abaixamento do poder económico-financeiro, tanto das famílias como das pessoas. Aos grupos de protesto – numa certa visão reivindicativa quase assanhada e impertinente – parece que as pessoas têm agora a tendência a viver na contestação de tudo e a todos, por vezes sem respeito pela opinião ou pensamento alheios, mas numa linha ‘democrática’ de eu contra todos… Há processos complexos e situações que podem eclodir com consequências imprevisíveis.

3. Alguns dos focos de irritação percetíveis parecem corresponder mais às agendas político-partidárias do que às reais necessidades das populações. Por onde têm andado os políticos ‘profissionais’ para só agora perceberem que o tema da habitação subjaz a muitas das situações de mal-estar do grosso dos cidadãos? Quando optaram pelos (ditos) bairros sociais isso não foi criar novos problemas, sobretudo aos mais desfavorecidos, já de si fragilizados? Não juntar pessoas complicadas (social, económica ou culturalmente) nos mesmos espaços não seria previsível para não fomentar novos conflitos? Não será que certas soluções encontradas para alguns problemas se têm tornado focados de maiores conflitos?

4. Efetivamente somos, hoje, confrontados com uma crise quase insolúvel; falta capacidade de liderança e quem a execute de forma digna, atenta e correta. Dizemos isto em relação ao nosso âmbito autárquico, mas também na dimensão nacional e mesmo internacional, com a Europa à testa. Quem tenha um mínimo de memória recordará alguns dos grandes líderes, esses de estatura humana e cultural, que até ultrapassavam as fronteiras das suas agremiações ideológico-partidárias, homens e mulheres dos mais variados setores e campos de intervenção… ao nível europeu: figuras como Helmut Kohl, François Mitterrand, Jacques Delores, Margaret Thatcher, João Paulo II ou Mikhail Gorbachev; por cá: Mário Soares, Francisco Sá Carneiro, Adriano Moreira…e gerações subsequentes de outros dirigentes da segunda vaga da construção da União Europeia ou da ‘democracia’ portuguesa…

5. Vivemos numa época que se apresenta mais propensa às intrigas – palacianas e não só – e mal crenças, onde se tenta confundir o secundário com o essencial: hoje mais do que no passado recente vemos serem cilindrados os competentes pelos oportunistas, os bem-preparados pelos arrivistas sem estofo, os que podem construir pelos que mais não sabem ser senão detratores inconsequentes. Precisamos de reafirmar a consciência na boa-fé para com os outros, incentivando ao cultivo dos valores humanos mais básicos, como a honestidade, a lealdade e a verdade. A rebaldaria de uns quantos precisa de ser combatida com os princípios alicerçados nas Sagradas Escrituras: nelas e por elas saberemos encontrar quem possa tornar-se servo e ministro do bem-comum… que é muito mais do que o serviço público e estatal de tantas forças eivadas de crenças num deus sem rosto e sob a ética republicana anquilosada de outros tempos. Assim saberemos combater a ansiedade quanto ao futuro, a depressão para com o passado e o stress sobre o presente…



António Sílvio Couto

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