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segunda-feira, 17 de setembro de 2018

Civismo, a quanto obrigarias



Recordo que um dos quatro parâmetros das notas de comportamento – estávamos em finais da década de 60 do século passado – era o da ‘civilidade’. Para quem era quase criança essa palavra soava a esquisita. Com o tempo e as lições de educação recebidas fui-me percebendo que civilidade vinha de ‘civitas’, que tem a ver com o aprender a estar na cidade, refere-se à condição de cidadão – até por contraste com pagão, o que vivia no ‘pagus’, no campo – e a uma panóplia de requisitos para quem quer estar com os outros em relacionamento de respeito, de boa convivência, seja pela normalidade de trato, seja pelas regras que advêm de estarmos em sociedade.

Ora, o que vi nos últimos tempos no espaço físico-geográfico em que vivo é tudo e o seu contrário de civilidade, de civismo, de educação, de respeito pelos outros, pelo ambiente, pela limpeza ou mesmo pelo mobiliário público… Dá a impressão que muita gente faz da rua o espaço mais mal tratado da convivência consigo mesma e com os demais, tornando-a um esterqueiro a céu-aberto, lançando toda a forma de dejetos – a palavra é mesmo essa – para o espaço que é de todos e não só de alguns, mesmo que possa ter a sua forma de ver, de viver e de estar.

Diante deste ‘espetáculo’ de subdesenvolvimento – chamar-lhe terceiro-mundista seria uma ofensa a quem viva nessas condições em razão da extrema pobreza e da falta de condições de higiene – tentei aperceber-me das razões mais profundas e generalizadas com que vimos a confrontar-nos cada vez mais e num maior número de lugares, de situações e de condições.

Será que um pequeno aumento de folga económica faz-nos tornar os outros – sobretudo os que cuidam da nossa limpeza pública – limpadores daquilo que sujamos sem respeito nem vergonha? Será que os sinais de sujidade pública são o retrato duma negligência de higiene privada, tanto das pessoas, como das casas? Porque se vai generalizando essa impunidade de sujar ou mesmo destruir as coisas públicas, sem que as autoridades intervenham pela admoestação ou mesmo pela repressão?

Agora que se inicia um novo ano escolar não seria de introduzir mais claramente nas escolas sessões de civilidade, de civismo e de cidadania – as palavras podem ser parecidas mas contêm matérias diferentes – em ordem a educar, desde a mais tenra idade, os cidadãos de amanhã, ensinando-se as regras básicas da convivência, já que, parece, as famílias não o têm conseguido?

Não podemos continuar a gastar imensos recursos em assuntos que são da mais básica conduta de quem está com os outros. Urge, por isso, saber ler os sinais emitidos por ocasião de grandes festas – particularmente se se prolongam por vários dias – ou em ajuntamentos de pessoas. Nessas ocasiões como que sobe ao consciente duma boa parte desse anónimo a quem chamam ‘povo’, uma espécie de desculpa coletiva onde poucos se assumem como portadores dalguma civilidade e se confundem na massa do faz-de-conta que ninguém vê, mas cujos resquícios se percebem quando o tal anónimo se afasta do lugar onde esteve… Sinal disso e talvez revelador de algo ainda pior é aquilo que fica no recinto do santuário de Fátima, após dias de peregrinação: algo de imundo invade aquilo que se pensaria podia e devia ser um lugar de educação, de civismo e de educação…em função dos valores cristãos recebidos e dados! 

Em certos lugares de uso público é habitual vermos escrito: deixe como encontrou ou como gostaria de encontrar…colabore na limpeza deste lugar… Estas e outras recomendações certamente já vimos e fizemos como nos pediram. O problema é quando se abandalha o espaço público, tornando-o alvo de menos agradável, criando condições para que se agrave a sujidade e se revele que, quem por ali passou, não teve em consideração quem viria depois e se degrada o que podia ser aprazível e útil a todos.

Há lições da mínima educação que podem modificar o estado de coisas a que chegamos, bastando que cada um de nós limpe, ao menos, um metro em volta da sua porta, seja de casa, seja do seu prédio ou mesmo do perímetro da sua estatura. Não podemos continuar a nada fazer, considerando que outros limparão o que sujamos ou aquilo que nos compete a nós assear. Se considerarmos que cada um de nós produz 1,2 Kg de lixo por dia, veremos a árdua tarefa de adquirirmos hábitos que ajudem a fazer da nossa convivência diária uma batalha que não pode ser dada por adquirida, mas dela cuidar todos os dias…                

 

António Sílvio Couto

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