Na sua
88.ª edição, a ‘feira do livro de Lisboa’ é, durante cerca de três semanas, um
grande espaço de apresentação de novidades editoriais, de lançamentos e
autógrafos, de miscigenação de culturas, tendo por denominador comum o texto
impresso, sobretudo, em papel.
Em razão
da minha participação no lançamento e apresentação do último livro – ‘Nesta
Igreja que amo e sirvo’ – bem como da sessão de autógrafos no dia seguinte,
pude ver a grande afluência – num domingo e numa 2.ª feira – de visitantes,
compradores e cultivadores da cultura através do livro. Nota-se a presença de
muitas crianças, normalmente, acompanhas pelos pais, que as vão introduzindo ao
gosto pela leitura, certamente, cultivada em casa e aprimorada na instrução e
aprendizagem nas escolas. Nesta faceta da habituação ao texto escrito tem muita
importância a cativação desde tenra idade, pois isso também se aprende a gostar
como outros hábitos que fomos adquirindo desde novos.
Há, no
entanto, dados e situações que podem favorecer ou desmotivar quem leia ou quem
escreva. Desde o preço dos livros e a sua aquisição por necessidade, por gosto
ou mesmo por educação. Aqui se poderá ver com mais acentuada conexão a
distinção entre instrução e cultura, pois esta pressupõe aquela e a segunda se
aprofunda usando os meios mais adequados para o seu enraizamento. Será sempre
de questionar se os professores são instrutores da palavra e da novidade pela
leitura. Quantas vezes se pode exigir que se saiba o mínimo, mas não se lançar
as sementes para que se possa crescer pelos próprios meios. Isto consegue-se
quando se for criando o gosto pelo estudo, tanto dos assuntos de escolarização,
quanto de aprendizagens para que o pensamento se eduque e cresça com
ferramentas de que cada um sente necessidade socorrer-se.
= De
entre a multiplicidade de propostas e sugestões que a ‘feira do livro’ coloca
poderemos considerar que a especialização do livro precisa de ser assumida.
Cultura e livros não podem ser dois binómios de uma campanha onde a literatura
(dita) criativa e (mais ou menos) vendável seja uma espécie de efabulação
veiculadora de ideias, de sensibilidades e de correntes a pedido. Com efeito,
escrever é comunicar e todos sabemos que, se ao lermos seja o que for, a escrita
não estiver clara, simples e apelativa, com facilidade abandonamos esse texto e
procuraremos quem nos comunique algo que seja percetível à nossa cultura.
Não é
tão grande quanto seria desejável o leque de autores que escrevem em português
e dizemo-lo sobretudo atendendo às questões de fé, que não de mera religião. Se
virmos os pavilhões específicos onde se podem encontrar abordagens à dimensão
espiritual, à intelectualidade e à formulação de questões de âmbito religioso
cristão poderemos perceber que, em Portugal, há muita religiosidade com cariz
cristão/católico, mas que poucos, muito poucos, o exprimem em forma de
escrita…correndo o risco de exporem-se e de serem criticados (no sentido
positivo e/ou negativo) pelo que dizem ou pensam.
Para
além de certos escritos devocionais – muitos deles de qualidade gráfica e
doutrinal a roçar o sofrível – não tenho visto, na ‘feira do livro’,
publicações mais ou menos desenvolvidas – a volumetria e as páginas nem sempre
são o critério supremo para avaliação – segundo a capacidade dos nossos
leitores. Há questões que devem ser levadas ao terreno da ‘feira do livro’,
pois ninguém sabe se não andará por lá alguém à procura de Deus e do sentido
para a sua vida. Não podemos embarcar na onda de certos critérios editoriais só
porque nos foi proposto um tema – vindo de Roma ou de alguma diocese – e
enquanto dura o ‘ano de qualquer coisa’ saem a propósito ou a despropósito
muitas publicações. Há questões que precisam de ser aprofundadas, estudadas e
esmiuçadas sempre. Eis algumas sugestões: o tema da Igreja será sempre útil e
atual; as questões acerca da vida não pode ser abordadas por atacada só quando
são introduzidas questões fraturantes; assuntos de âmbito moral e não só
afunilada nas tribulações sexuais; os temas de compromisso social, como a
economia e o trabalho, os direitos/deveres sociais, a vivência política, etc.
Com o
devido respeito e a máxima compreensão, ouso sugerir que talvez fosse desejável
que os ínclitos professores das nossas universidades com formação e compromisso
católico se dessem mais a conhecer, publicando com regularidade e numa linha de
reflexão/partilha com os seus irmãos na fé. Até mesmo os membros de
congregações e institutos religiosos, bem como os padres diocesanos precisam de
deixar escrito algo mais que façanhas ocasionais de obras materiais e de
arranjos em monumentos…
António Sílvio Couto
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