Por estes dias – digamos nas duas últimas semanas – vivemos uma espécie de
terrorismo à la carte, isto é, conforme cada um quer e deseja, prevê ou
interpreta, vê e consente…
O facto mais revelador desta intentona terrorista foi servido na noite da
passada sexta-feira, dia 22 de julho, com as arrojadas leituras sobre um tal ato
tresloucado dum rapaz com dezoito anos e com vítimas – ainda não se sabe qual o
verdadeiro enquadramento – ocasionais ou escolhidas.
Foi, no entanto, patético muito daquilo que foi dito e insinuado nos canais
de televisão nacionais e estrangeiros, umas vezes tentando colar o
acontecimento a fações terroristas internacionais e noutras vezes alinhando
pela conspiração dos nacionalismos, sobretudo, xenófobos e de extrema-direita…
excluindo outras colorações partidárias e ideológicas bem mais abespinhadas e
contundentes nas palavras e nas ações… A quem tentam iludir: a eles mesmos ou a
nós? A quem servem nas leituras pretensamente feitas: aos donos dos órgãos de
informação ou ao público em geral? A quem estão ligados os noticiadores: aos
que lhes pagam ou a quem precisa de ser informado com isenção e com maior independência?
Dá a impressão que, em muitos dos relatos e reportagens sobre os
acontecimentos mais recentes, se nota uma capciosa intenção de quererem que,
quem ouve, quem vê e quem lê, fique com o filtro distorcido de fações
noticiosas e manipuladoras… ao perto e ao longe.
Ora, nem sequer a mortandade resultante do abalroamento em Nice (França)
escapa à tentativa de nos quererem dizer que o autor estaria conotado com
forças mais ou menos subterrâneas… Com efeito, a exploração doentia de tais
acidentes revela que ainda vivemos numa fase insípida de evolução da
humanidade, a qual parece que se compraz em ver sangue e em ser explorada nos
sentimentos mais básicos da nossa condição de fragilidade e de contingência…
Nem nas corridas de toiros se enfatiza tanto esse filão sanguinário e sádico!
= Desde 11 de setembro de 2001, com o ataque às ‘torres gémeas’, em Nova
Iorque, que temos vindo a assistir à radicalização de muitos atentados, desde
Inglaterra a Espanha, em países africanos com proximidade ao Ocidente – tanto
na bacia do Mediterrâneo como na África sul-sariana – ou passando por França –
vários nos últimos dois anos – e Bélgica, no próximo e no médio Oriente,
acrescentando na Turquia e nos países de influência do autodenominado Daesh, sem
esquecermos os múltiplos atentados evitados ou sem publicidade… temos estado a
viver numa cada vez maior insegurança de pessoas e de nações, de culturas e de
religiões, de povos e de condutas em pretensa democracia ou roçando as
ditaduras.
Efetivamente há quem tenha excluído Deus da vida de pessoas e de comunidades,
mas que foram introduzindo cada vez mais medos, que manipulam e que servem a
gosto, pois assim sabem que podem controlar os mais vulneráveis e suscetíveis de
serem aliciados pela causa da ‘nova era’… numa pseudolibertação da religião, mas
criando outros tentáculos mais aliciantes e aliciadores… no conteúdo e na
forma.
= Este terrorismo à la carte serve bem os intentos dos mais poderosos
económica e financeiramente, pois sabem que as pessoas podem ser conquistadas
pela boca, isto é, por aquilo que se lhes dá de comer ou que favorecem os
prazeres epicuristas reinantes. Veja-se a forma subtil com que os festivais de
comida e de bebida, de música e de recursos aos desejos mais libidinosos, de
musicalidade e de danceteria, de religiosidades e de festivais… vão pululando
país afora. Reparemos com que (aparente) normalidade é mais fácil conquistar
pessoas para programas de diversão do que de religião… nalguns casos mais
tradicional do que vivencial.
Nem tudo é uniforme ao longo do país, mas, em muitos casos, parece ser mais
fácil cativar público para iniciativas onde os prazeres da carne – e não
estamos a falar no conceito mais moralista do termo – são servidos e
exercitados do que para momentos psicológicos e espirituais onde a dignidade
humana possa acrescentar algo à condição terrena da nossa vivência mais normal e
natural. Tal como noutras épocas parece que nem tudo o que se diz/faz
corresponde à verdade…
António
Sílvio Couto
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