Partilha de perspectivas... tanto quanto atualizadas.



quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Poder da palavra versus palavra do poder


Hoje, mais do que nunca, temos de exercer ‘o poder da palavra contra a palavra do poder’, disse Adriano Moreira, que intervinha numa das conferências do Simpósio do clero de Portugal, a decorrer, em Fátima, de 31 de agosto a 3 de setembro, subordinado ao tema: «O padre, irmão e pastor».

Para aquele professor universitário, ‘nós vivemos numa época marcada pela falta de autenticidade’, pois, muitas vezes, dizem-se umas coisas e fazem-se outras… política e socialmente. Referindo-se ainda à condição do projeto europeu, Adriano Moreira, salientou que falta ‘uma comunhão de afetos’ e que tem vindo a aumentar um certo ‘desamor europeu’, seja por ausência de um conceito estratégico da própria Europa, seja porque ‘consentimos que o credo dos valores tenha sido substituído pelo credo do mercado’.

 = Embora estas declarações e o evento do oitavo simpósio tenha sido destinado ao clero – cerca quatrocentos de todas dioceses estiveram presentes – nele se fez uma reflexão sobre a dimensão do cristianismo na cultura e da intervenção dos padres na vida da Igreja e da sociedade portuguesa.

De facto, mais do que lições – algumas delas ministradas por leigos nem sempre visto e entendidos na esfera da Igreja católica – colhemos atitudes de proposta e alguns elementos de reflexão para a arte de ser padre neste tempo… cinquenta anos depois do Concílio Vaticano II e cinco séculos após o nascimento de Beato Frei Bartolomeu dos Mártires.

 = Deixamos breves respigos de frases ditas… mesmo sem identificarmos os autores, tendo em conta a simbologia da provocação e mesmo a sinceridade da entoação:

- Aos padres exige-se-lhes que saibam ler o seu tempo… tendo em conta uma atitude acolhedora de todos.

- As pessoas escolhem [quando vão a uma e não a outra celebração] os seus padres.

- A voz da Igreja surge, muitas vezes, como a voz autorizada sobre a ciência.

- Nada na vida se fez por receita ou por decreto… precisamos de olhar o mundo com otimismo.

- Necessidade de conhecer-se a si mesmo…numa maturidade da afetividade.

- Capacidade de diálogo… aberto, sensato, atento e interpelativo.

- Cuidar da fé adulta daqueles a quem servimos.

- Atenção aos distantes (periferias) psicológicos e materiais.

- Mais do que recriminar, saber consolar.

= Vivemos num tempo e num mundo que apresenta novas e inauditas possibilidades, seja no âmbito cultural, seja nas condições sociais…onde, por vezes, a figura e a pessoa do padre está em contínuo escrutínio pelos ‘seus fregueses’ e pelos que observam a Igreja – sobretudo na sua expressão católica – para dela tirarem lições… embora, na numa parte significativa dos problemas, possa ser (mais) em jeito de acusação. Pede-se compreensão e até misericórdia à Igreja e para com ela e os seus ministros colocam-se exigências (quase) insuperáveis.

- Tentando unir alguns aspetos supra citados poderemos considerar que a palavra que a Igreja usa para a sua comunicação deve gerar autenticidade porque alimentada na Palavra de Deus, sem se deixar coartar pela palavra do poder, tomando a dimensão profética e a ousadia à maneira de Jesus.

- Perante esta economia que mata – nas palavras do Papa Francisco – porque não respeita os outros, urge que tenhamos uma nova visão humanista/cristã, onde as relações entre os povos, as nações e as suas memórias sejam respeitadoras da própria natureza e desta como rosto da beleza de Deus, de que a pessoa humana usufrui sem se apropriar, mas tão-somente como administrador fiel e prudente…da casa comum.

- Numa simbologia usada no ministério sacerdotal – particularmente por ocasião da eucaristia – poderemos considerar que, em cada missa, se dá uma entrega das dores e dos sofrimentos de toda a humanidade, tendo em conta o ‘credo dos valores’, semeando, cuidando e tratando de que a mesa da festa seja partilhada por todos, onde o padre é irmão (pecador e santificado) e pastor (como ovelha do mesmo redil), à maneira de Jesus e não imitando qualquer outro que possa ofuscar a imagem correta e verdadeira… do Mestre e Senhor.   


António Sílvio Couto

Sem comentários:

Enviar um comentário