Dizia-me,
uma vez, um padre daqueles que tinha experiência de vida suficiente, simples e
longa: pela forma como vejo as pessoas a benzerem-se assim percebo quem são os
cristãos que tenho na minha frente!
De
facto, de vez em quando vemos certas imagens – de jogadores de futebol, de
pegadores de toiros e outros – a fazerem tal garatuja com as mãos… um pouco
como se fosse um gesto de bênção, que temos dificuldade em perceber se aquilo é
gesto de fé ou trejeito de benzedura… para dar sorte ou, sei lá, ao menos para,
supersticiosamente, não dar azar!
= Sinal da Cruz – «o cristão começa o seu dia, as suas orações, as suas atividades, pelo
sinal da cruz ’em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Ámen’. O batizado
oferece o dia à glória de Deus e apela para a graça do Salvador, que lhe
permite agir no Espírito, como filho do Pai celeste. O sinal da cruz
fortalece-nos nas tentações e nas dificuldades» (Catecismo da Igreja
Católica, 2157).
Eis,
duma forma simples e clara, o significado do sinal da Cruz, que envolve toda a
vida do cristão. Desde o batismo – ‘eu te batizo em nome do Pai e do Filho e do
Espírito Santo – que o uso deste sinal e a proclamação das mesmas palavras
envolvem algo de profundamente trinitário e vinculam o cristão, que usa o sinal
da Cruz, na relação íntima e profunda com a Santíssima Trindade. Tudo está
radical e serenamente centrado nesse momento de princípio da fé cristã.
= Como benzer-se ou persignar-se? – O gesto de benzer-se ou
persignar-se (isto é, o fazer o sinal da cruz) envolve a nossa condição de
cristãos, na sua dimensão mais profundamente batismal, pois rezamos a mesma
invocação trinitária, que sobre nós foi rezada, quando a água foi derramada
como sinal de vida nova e de inserção na vida de Deus em Igreja:
-
colocando a mão direita na testa, dizemos – ‘em nome do Pai’ e com isso
pretendemos confiar a nossa inteligência (pensamentos, ideias, projetos, etc.)
aos cuidados de Deus nosso Pai, permitindo-Lhe ainda que possa contar connosco
para a construção pensante da Sua presença neste tempo e neste mundo… Assim
exercitamos o dom da fé em confiança e pobreza espiritual… crescente.
–
deslocando a mão sobre o tronco, dizemos – ‘e do Filho’ e entregamos a nossa
vontade, por vezes rebelde e autossuficiente, para fazermos como Jesus a
vontade de Deus a nosso respeito e cada dia e em todo o momento. Agora
confiamos no dom da esperança em cumprirmos sempre melhor a vontade de Deus…em
atitude de obediência como Jesus.
- e, de
um para o outro ombro – normalmente na cultura latina-romana do ombro esquerdo
para o ombro direito – passando por sobre o coração, dizemos – ‘e do Espírito
Santo’, numa manifestação de abandono ao amor de Deus em nós, pelo Espírito Santo,
que é, por excelência, o amor na e da Santíssima Trindade. Assim, permitimos e
invocamos o amor de Deus para a nossa afetividade e a vivência e testemunho da
caridade cada dia…pela castidade, cada um segundo o seu estado de vida e/ou a
sua vocação.
= Benzer-se: testemunho de vida
Deste
modo poderemos compreender que o gesto de traçar o sinal da Cruz sobre nós,
nesta quase vivência invocativa da bênção divina, é, sobretudo, um testemunho do
nosso compromisso cristão, seja onde quer que seja…
É
significativo que usemos este gesto de benzer-se, particularmente, no início
dos atos litúrgicos, invocando a presença da Santíssima Trindade e ainda no
final das celebrações, quando sobre nós é invocada a bênção de envio… e nós
traçamos este mesmo gesto, aceitando a bênção pretendida.
Precisamos
de consciencializar este gesto do sinal da Cruz, benzendo-nos frequentemente e
vivendo um processo pedagógico e educativo para uma fé adulta e amadurecida.
Como
seria importante que, antes dos momentos mais significativos do nosso dia-a-dia
– desde o levantar até ao deitar, passando pelos tempos de refeição ou mesmo situações
de vivência pública – nós façamos o gesto do sinal da Cruz na simplicidade e
com convicção… de fé viva e vivida!
António
Sílvio Couto
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