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segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

Do ‘coração de pai’ ao pai com coração


 O Papa Francisco declarou ‘ano de São José’ o tempo que que decorre na Igreja católica de 8 de dezembro de 2020 à mesma data de 2021.

Com a data do início deste ano jubilar, o Papa assinou a carta apostólica ‘Patris corde’ (com o coração de pai) – por ocasião do 150.º aniversário da declaração de São José como padroeiro universal da Igreja – onde, para além de apresentar as razões deste ‘ano de São José’, faz uma leitura teológico-espiritual desta grande e ‘apagada’ figura da dimensão católica.

Numa breve introdução situa a ‘devoção’ a São José, alicerçada em raízes bíblicas e com incidências histórico-eclesiais. Depois expõe, o documento papal, as sete vertentes essenciais da pessoa e do santo: pai amado, pai na ternura, pai na obediência, pai no acolhimento, pai com coragem criativa, pai trabalhador e pai na sombra. Numa espécie de ‘conclusão’, o Papa apresenta-nos uma singela oração de confiança e de proteção sob a intercessão de São José.

 = Razões de uma celebração

«Ao completarem-se 150 anos da sua declaração como Padroeiro da Igreja Católica, feita pelo Beato Pio IX a 8 de dezembro de 1870, gostaria de deixar «a boca – como diz Jesus – falar da abundância do coração» (Mt 12, 34), para partilhar convosco algumas reflexões pessoais sobre esta figura extraordinária, tão próxima da condição humana de cada um de nós. Tal desejo foi crescendo ao longo destes meses de pandemia em que pudemos experimentar, no meio da crise que nos afeta, que «as nossas vidas são tecidas e sustentadas por pessoas comuns (habitualmente esquecidas), que não aparecem nas manchetes dos jornais e revistas, nem nas grandes passarelas do último espetáculo, mas que hoje estão, sem dúvida, a escrever os acontecimentos decisivos da nossa história: médicos, enfermeiras e enfermeiros, trabalhadores dos supermercados, pessoal da limpeza, curadores, transportadores, forças policiais, voluntários, sacerdotes, religiosas e muitos – mas muitos – outros que compreenderam que ninguém se salva sozinho. (…) Quantas pessoas dia a dia exercitam a paciência e infundem esperança, tendo a peito não semear pânico, mas corresponsabilidade! Quantos pais, mães, avôs e avós, professores mostram às nossas crianças, com pequenos gestos do dia a dia, como enfrentar e atravessar uma crise, readaptando hábitos, levantando o olhar e estimulando a oração! Quantas pessoas rezam, se imolam e intercedem pelo bem de todos». Todos podem encontrar em São José – o homem que passa despercebido, o homem da presença quotidiana discreta e escondida – um intercessor, um amparo e uma guia nos momentos de dificuldade. São José lembra-nos que todos aqueles que estão, aparentemente, escondidos ou em segundo plano, têm um protagonismo sem paralelo na história da salvação. A todos eles, dirijo uma palavra de reconhecimento e gratidão».

O enquadramento encontra-se neste estado de pandemia, que temos estado a viver comummente. O Papa cita a intervenção que teve nesse dia simbólico de 27 de março deste ano de 2020. O sublinhado em itálico é nosso.

 

= Perspetivas de uma devoção

Embora seja um santo de grande importância no processo de revelação de Jesus, São José não cabe no role dos ‘santos populares’, como outros bem menos significativos biblicamente. Reparemos que poucos documentos do magistério encontramos com reflexões sobre São José. O Papa Francisco di-no-lo na sua carta apostólica: «o Beato Pio IX declarou-o «Padroeiro da Igreja Católica», o Venerável Pio XII apresentou-o como «Padroeiro dos operários» e São João Paulo II, como «Guardião do Redentor». O povo invoca-o como «padroeiro da boa morte».

Vejamos, então, o significado das datas destes três Papas, para tentarmos entender a sua sugestão pastoral do Papa Francisco:

* 1870 (dezembro) – Pio IX: no rescaldo da perda dos ‘estados pontifícios’ de grave prova para o Vaticano e do encerramento do Concílio Vaticano I, o Papa coloca a Igreja católica sob a proteção de São José;  

* 1955 (maio) – Pio XII: cerca de uma década após a II Guerra Mundial emergem convulsões laborais em várias partes do globo. A Igreja tenta não perder totalmente os trabalhadores e coloca-os sob a proteção de São José, tentando ainda cristianizar o ‘dia mundial do trabalhador’, cada vez mais capturado por forças anti-cristãs...  

* 1989 (agosto) – João Paulo II: estávamos naquilo que se ia lendo como mudanças no mundo do ‘bloco de leste’, que acabaria por resultar na queda do muro de Berlim, na Igreja ia surgindo focos de dissidência à catolicidade.

Neste tempos do Papa Francisco temos visto vários sinais de presença da ‘sua’ devoção a São José: foi ele quem decidiu em definitivo incluir a referência explicita de São José nas orações eucarísticas; estendeu a representação de São José dormindo... De referir que o Papa Francisco iniciou o sue ministério exatamente no dia 19 de março de 2013, dia litúrgico de São José...

Numa palavra: na carta apostólica ‘Patris corde’ encontramos um Papa que deixa falar o coração. Escutemo-lo como filhos...     

 

António Sílvio Couto

 

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