Por
razões institucionais e/ou representativas estive, por estes dias, na
celebração do aniversário de uma associação ligada à ajuda aos reformados,
idosos e pensionistas – não reproduzo a identidade de forma correta de propósito
– mas sei a quem me refiro… Relato, então, as minhas impressões.
Durante
uma espécie de sessão de palavras, houve quem estivesse na conversa e até na
rua… mas, na hora da comida, foi de ver o ‘assalto’ às mesas. O repasto não era
lauto, mas as pessoas entraram numa espécie de sofreguidão para comerem… Havia
gente mais velha, que talvez não tivesse tais iguarias em casa e que aquela
parca mesa apresentava, mas, a mim simples convidado e ainda sem ter feito a
digestão da refeição anterior, custou-me ver jovens – com unhas de gel e tlm a
tira-cole – correrem avidamente para os simples petiscos em forma de lanche e de
confraternização…
Foram como que dardos de acusação e de
intimidação, ver pessoas com fome a tentarem suprir, numa simples outonal tarde
de domingo, lacunas da sua fatura familiar e, sei lá, daquilo que vão
encobrindo sob a capa do faz-de-conta… até que seja descoberta tanta fome
envergonhada!
- Havia
minutos atrás tinha ouvido discursos dalguma contestação – diga-se, este ano
com menos gás de acusação, mas com suficiente azedume contra quem governa ao
longe… porque os que estão perto (mesmo sem fazerem muito) como autarcas são
como que ‘heróis’ adulados e aduladores – e fui surpreendido com gestos de
fome… arrolhada (isto é, contida como se fosse uma garrafa de espumante prestes
a ser aberta) à custa de promessas eleitoralistas e com bandeiras de
contestação sem consequência…prática e sincera.
- Vi
figuras que sabem dizer – mesmo que acintosamente – o que lhes vai na alma
amedrontada, mas que se encolhem quando têm de fazer mais do que espicaçar umas
tantas animosidades, devendo dar a ração de sustento a quem procura ser digno
daquilo que lhe devem… comprometendo-se naquilo que fará parte da solução e não
do problema…hoje como amanhã.
- Infelizmente
há pessoas que parecem ser boas a denunciar, mas que quase se diluem na hora de
solucionar… mesmo no âmbito da Igreja católica, pois como que colocam as garras
em atitude de ataque, mas encolhem as mãos na hora da dádiva… Por favor, sejam
coerentes e façam de cada episódio de denúncia um ato profético de vivência da
compaixão e da misericórdia, feita ato de fé na esperança pela caridade.
= Agora
que a noite cai mais precocemente, em razão da recente mudança da hora, como
que sinto uma provocação a que sejamos todos dignos de rasgar horizontes dessa
miopia preconceituosa e que façamos com que os tempos que se aproximam –
enfeitados com esse tal ‘espírito natalício’ – possam revestir essoutra força
de solidariedade, pois, se nem por ocasião do natal, já não olhamos os outros,
então poderemos fechar para balanço a tasca da convivência humana mais simples
ou até deveremos abrir uma espécie de época para saldos de fim de negócio…em
humanismo e resiliência cultural.
= Em
breve surgirão propostas em ordem à desejada colaboração para que tentemos
entrar em iniciativas de ajuda aos ‘mais desfavorecidos’ ao perto e/ou ao
longe. Quem nos tenta seduzir usa (ou vai usar) palavras que tocam o coração
dos (pretensos) participantes. Estes podem ser os mais próximos ou aqueles de
quem nos aproximamos… aí onde se traça a fasquia entre o partilhar e o dever
fazer…pois, se continuarmos a dar o que nos sobra, nunca perceberemos que os
outros são irmãos e não uns meros recetadores daquilo que já não nos faz falta…
seja em que setor da nossa vida for!
Vão-me
desculpar os que não precisam tão claramente, de ajuda, na Moita, mas já vi
muita gente saída das catacumbas quase não humanas, suplicando ajuda e
estendendo a mão em forma de súplica… Uns saem dos escombros da pobreza e
tantos outros esperam que nós lhes estendamos a mão e os façamos subir… daí
onde se refugiaram e que esperam o nosso compromisso humano e cristão… Basta de
exploração e manipulação de quem espicaça a revolta, mas não alimenta… para a
paz!
Com
tantas sobrancerias… em breve poderemos cair vencidos…
António
Sílvio Couto
Concordo com o seu ponto de vista e com a necessidade urgente de se olhar para o lado e de estender a mão aos que mais precisam, mas acho que o problema, na minha opinião é bem mais grave do que o que relata.
ResponderEliminarO correr à comida e a tentativa de chegar primeiro à mesa é na maioria uma necessidade não de fome mas de gula… Quantas vezes eu vejo isso acontecer sem ser necessário ir muito longe. Aniversários, festas ou qualquer iniciativa que envolva comida, eu, a minha mulher e os meus filhos, somos geralmente dos últimos a chegar à mesa, pois não nos alarmamos por faltar a comida, nem mesmo nos importamos se não chegar para nós. Com isto posicionamo-nos numa posição preferenciada para ver de fora a cegueira e a loucura de quem corre à messa, como se não houvesse amanhã. Será por fome? Na minha opinião e no que tenho vivido não. É apenas por uma necessidade de ter primeiro que o outro, de comer antes que acabe, do eu vim para comer e tenho que sair daqui com o bandulho cheio... Quantas vezes vemos isto mesmo na nossa família, amigos, conhecidos e desconhecidos. Parece-me uma questão cultural, pois nunca vi nada disto em outro país que não Portugal. Somo um país de gula, que só olhamos para o nosso umbigo e não nos preocupamos com quem precisa na realidade, desde que eu consiga encher o meu bandulho…. Somo um povo desprezível… Não que todos sejam assim, mas muitos são…