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sexta-feira, 24 de outubro de 2014

Difamação, pecado sem perdão?




Consultando a wikipédia encontramos a seguinte definição de difamação ‘é um termo jurídico que consiste em atribuir a alguém fato determinado ofensivo à sua reputação, honra objetiva, e se consuma, quando um terceiro toma conhecimento do fato. De imputação ofensiva que atenta contra a honra e a reputação de alguém, com a intenção de torná-lo passível de descrédito na opinião pública. A difamação fere a moral da vítima, a injúria atinge sua moral, seu ânimo’.

Tomemos alguns aspetos em consideração:

- Na maior parte dos casos a difamação recorre à sinistra figura do anónimo, que se esconde sob a capa do sem-rosto para criar suspeição sobre a vítima… Muitas vezes a forma de lançar as atoardas envolve capciosas insinuações, desconfianças e, na maior parte das vezes, difusão de conjeturas de pessoas com baixo teor de autoestima e menos boa confiança em si próprio… em desfavor de outros/as que lhe podem fazer sombra ou provocar ciúme.

- Os fautores da difamação tentam ganhar proveito com o menosprezo de quem querem atingir, pois com isso ofendem a reputação e honra dos atingidos e como que procuram ocupar, em protagonismo, o espaço ou a visibilidade de quem difamam. Certamente esta arma de arremesso poderá voltar-se contra quem a usa, mas, enquanto funciona, poderá dar conforto aos réus… Dir-se-á que a difamação é filha das trevas e reinará enquanto a luz não iluminar os casos e resolver as situações…

- Muitas vezes as vítimas da difamação são pessoas que, pelo seu estatuto humano e cultural, podem aparecer como alvos de inveja, podendo criar motivos de intolerância e mesmo de má-fé… particularmente em setores de incidência de maior proximidade, seja na convivência, seja na promoção de ações que envolvem perdas-e-ganhos de âmbito sócio/cultural mais imediato… Quantas difamações surgem em círculos de associações, de coletividades, de igrejas/capelas, de locais de grande vizinhança ou mesmo de intromissão abusiva na vida alheia…tendo por foco algumas questões pessoais mal resolvidas e até problemas sociais mais complexos.  

= Um exemplo de caminhada

Se recorrermos à vida de um santo pároco, poderemos encontrar algo que nos pode ajudar a interpretar esta dimensão da difamação duma forma mais profunda e tão atualizada.

Meu Deus, concedei-me a conversão da minha paróquia; aceito sofrer tudo aquilo que quiserdes por todo o tempo da minha vida!”. Foi com essa oração que começou sua missão o P.e João Maria Vianney (cura d’Ars). Na era da razão, do “penso, logo existo”, um sacerdote que nem mesmo podia confessar seus paroquianos enquanto não terminasse o curso de Moral, mostra, pelo “rezo, logo existo”, um caminho de felicidade. Ars é um vilarejo esquecido do mundo. Tem uma população de aproximadamente 200 pessoas, vários botequins, mentiras e falsidades nas negociações. Reinam as danças, os roubos (desde pequenas frutas das árvores até mesmo na demarcação da terra), as bebedeiras, enfim. Pouco povo, muitos problemas...

= Questões do foro humano

Atendendo que a difamação e a maledicência em geral podem configurar aspetos de âmbito humano e cultural, colocamos breves questões:

. Como se poderá chamar à responsabilidade quem cria, gere e difunde situações de difamação? Será que tudo vale para atingir os fins sem olhar a meios?

. Sem querer julgar os difusores da difamação, como poderemos enquadrar na linguagem cristã do perdão quem ofende sem medir as consequências? Será que Deus perdoa quem abusa da benevolência dos difamados? Esses mentores da difamação serão pessoas equilibradas ou doentes? Lá por serem mais ou menos doentes não poderão ser castigados judicial e moralmente?

. Como poderá defender-se alguém que seja vítima de difamação – seja qual for o campo de atuação – se se continuar a dar cobertura aos prevaricadores sem haver quem os castigue?

 

= Aspetos de âmbito ético cristão

Atendendo a que a difamação e mais amplamente a maledicência pode ser algo de grave – cristãmente dizemos: pecado – contra os outros, deixamos algumas perguntas numa espécie de exame de consciência:

. Tenho sempre presente que o respeito pela fama e o bom nome do próximo constitui um dever básico de justiça? Estou consciente da gravidade que encerra lesar injustamente a boa fama de alguém?
. Antes de julgar ou comentar os defeitos dos outros, procuro ver os meus e lutar por corrigi-los? Percebo que só a pessoa humilde e sincera, que se conhece a si mesma, tem condições de compreender e avaliar com misericórdia os outros?
. Compreendo que muitos juízos e críticas negativas são simples reflexo do mal-estar que podem deixar na minha alma o orgulho, a inveja ou o ressentimento?
. Evito sempre qualquer tipo de crítica negativa feita com irritação, zombaria ou desprezo, que possa denegrir a imagem ética da pessoa verbalmente agredida?
. Procuro seguir o conselho: de calar, não te arrependerás nunca; de falar, muitas vezes’? Evito qualquer tipo de crítica que não seja construtiva?
. Tenho consciência de que divulgar – sem um motivo justificado e grave – erros cometidos pelos outros, é um pecado de difamação e que tenho a obrigação de reparar o mal causado com esses comentários?
. Deixo-me levar por informações superficiais, mexericos ou opiniões levianas ao falar de pessoas ou instituições? Percebo que esses comentários precipitados podem ser calúnias?
. Faço tudo quanto é preciso para reparar o mal que os meus comentários podem ter causado à fama e à honra de outros?

. Estou consciente de que não basta pedir perdão a Deus por essa falta, mas que é um dever de justiça – também diante de Deus − restabelecer tanto quanto possível a fama lesada?

 

António Sílvio Couto

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