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sábado, 12 de agosto de 2023

‘Porsche’ ousou censurar ‘Cristo-Rei’?

 

Decorria a semana das Jornadas Mundiais da Juventude (JMJ), em Lisboa, quando a marca automóvel ‘porsche’, num spot publicitário – de dois minutos e vinte e nove segundos, aos 43 segundos – aparece a ponte sobre o Tejo e o monumento a Cristo-Rei só no pedestal, isto é, sem a estátua alusiva… Três dias depois – ainda decorriam as JMJ – e a falha foi corrigida, colocando Cristo-Rei no pedestal e com a ponte a figurar também…

1. Vamos às (possíveis) ‘razões’ de uma e de outra das posições. A pretensão da publicidade daquela marca de carros dizem era para fazer a diferença daquilo que aconteceu há sessenta anos. Recordemos, então, as datas relativas ao monumento a Cristo-Rei, inaugurado a 17 de maio de 1959 e a ponte (rebatizada mais tarde) de 25 de abril foi inaugurada a 6 de agosto de 1966…Se atendermos à comparação veremos que o monumento tem sessenta e quatro anos e a ponte cinquenta e sete, isto é, sete breves anos de diferença, mas significativos de acontecimentos sociais, políticos e mundiais, como a edificação do ‘muro de Berlim’, em agosto de 1961 ou o início da ‘guerra colonial’, em março também de 1961… à mistura com o Concílio Vaticano II ou o movimento hippy, sem esquecermos o surgimento daquilo a que, hoje, designamos de União Europeia por contraste com o bloco comunista de Leste…

2. Mesmo que de forma mais ou menos atenta poderemos considerar que aquele anúncio da ‘prosche’ pretendia atrair a atenção de quem se deixa fascinar por carros, só que não seria necessário provocar com limpeza de imagens como se fazia em certos regimes ditatoriais…quando não interessava certa figura era retirada do boneco. Foi isso que tentou, de forma notoriamente deficiente, fazer alguém que não conseguiu esconder não só a má arte como a artimanha antirreligiosa primária, pois se pretendia limpar não deixava o pedestal, tirava tudo…

3. Soube-se que a fabricação comemorativa do sexagésimo aniversário do veículo produzido em 1963 vai ter somente este número de unidades ao custo, em Portugal, de trezentos e setenta e dois mil euros cada um… Não será esta uma exaltação escusada de um certo capitalismo em regime de exclusão do resto da população? Não representará uma ofensa tal custo e com pretendentes reduzidos? Quais os critérios (valores) de quem se olha e vê os outros pela perspetiva do económico e no sentido materialista?

4. Há setores da nossa sociedade para os quais os outros não contam, podendo esquecer-se de que essa ofensa aos outros não está só no desprezo que manifestam para com eles, mas também na forma provocatória como tentam exibir-se e às coisas (casas, carros, adereços de moda, locais que frequentam) nas quais colocam a sua confiança e mesmo poder. Quase sem nos darmos conta somos levados e embarcar nesta onda de pretensa riqueza, onde boa parte da população não tem lugar nem cabe ostensivamente. Quando se poderia pensar que caminhávamos para uma justiça social, vemos emergirem sinais preocupantes de crescente desigualdade: os pobres não têm espaço e a pouca voz que poderão acrescentar quedar-se-á pela revolta, a reivindicação ou o protesto…ou, desgraçadamente uma certa resignação.

5. Dizia um padre da Igreja (S. Basílio): as riquezas que tens a mais não te pertencem são dos pobres a quem a deves retribuir. Se pensarmos bem: de que adianta querer ostentar mais do que os outros se todos haveremos de deixar tudo neste mundo, não levaremos nada. Como refere, por diversas vezes, o Papa Francisco: a mortalha não em bolsos! O cristianismo é muito mais do que um projeto social, é, antes de tudo, um anúncio da pessoa de Jesus, que nos irmana com todos e faz com que os outros sejam nossos companheiros – na etimologia de ‘comer do mesmo pão’ – de caminhada neste tempo que passamos por esta terra. Mal vai a nossa sociedade se só vir o cristianismo como algo que faz aos outros ações de benemerência sem neles ver o Cristo chagado e pobre, doente e necessitado, precisando cada um de nós dos outros para que se faça relação e não competição ou concorrência. Porsche, não obrigado!



António Sílvio Couto

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