São daquelas expressões que nos ficam após
esquecermos tudo – chamam a isto ‘cultura’, o que fica depois de se esquecer
tudo! – as que fazem título desta despretensiosa reflexão.
‘Rideo te’ – rio-me de ti; ‘rideo tibi’ – rio-me
para ti…fazendo a diferença entre um riso jocoso ou sarcástico e um outro
conotado com alguma simpatia e/ou boa disposição.
De facto, o contexto de carnaval pode configurar uma
das duas interpretações: rio-me daquilo que fazes de ridículo e com isso te
ridicularizo ou exprimo a minha concordância, aceitando as coisas que me fazem
rir contigo.
Muito daquilo que vemos, vivemos e sentimos na maré
do carnaval pode entrar no anedótico nacional ou pode, quando menos bem
entendido, gerar anedotas que, sendo pessoas, se podem tornar algo do
agravado…sobretudo se se entrar na (pretensa) máquina daquilo que faz a onda da
maledicência e até da malquerença.
= Diz a voz do povo e com razão: mais vale cair em
graça do que querer ser engraçado. Este tem uma duração mínima, enquanto aquele
pode flutuar por sobre tropelias e possíveis menos boas intenções,
entendimentos e prestações.
Ora, na cotação dos assuntos ditos de âmbito social,
podemos encontrar quem pode dizer tudo e o resto quase ofensivo, que lhe acham
graça, os aplaudem e como que fazem moda, enquanto a outros pouco mais bastará do
um suspiro desajeitado, uma intervenção infeliz ou mesmo inoportuna para lhe
caírem em cima todos e os demais, condenando, vituperando e ofendendo sem apelo
nem agravo.
É isto que tem vindo a acontecer na nossa
configuração sociopolítica, onde há governantes que se prestam para programas
de ridículo, de jocoso e de entretenimento barato e não caem em
ridicularização; onde uns tais se prestam para selfies e afins e são tidos como
populares, embora teçam meças ao mais rasca populismo; onde outros mais se vão
travestindo de figuras à medida daquilo que a populaça admira e por aí medem as
sondagens que julgam ter; onde (várias, dispersas e, quando se percebe,
conjugadas) forças subterrâneas da ideologia de género combatem e manipulam sem
apelo nem vergonha factos, situações e suposições, enquanto os consumidores de
notícias não conseguem distinguir entre a verdade e a mentira, servindo mais
esta e atropelando aquela…
= Contrariamente ao que se diz: ‘no carnaval ninguém
leva a mal’, considero que há questões – na sua maioria do âmbito do bom senso
e da mera civilidade – que não podem entrar nesta espécie de forrobodó com que
são tratados alguns problemas, desde os mais simples até aos mais
significativos da nossa conduta social e cultural…coletivas. Num tempo ávido de
escândalos e de casos de fora-da-normalidade, será de todo inexplicável que
haja governantes a aproveitarem-se do lugar que ocupam para querem amedrontar
quem deles discorda, abusando das informações privilegiadas que possuem e da
ascendência sobre dados não-disponíveis para outros. Agora que já estamos em
campanhas para votações torna-se desonesto e antidemocrático tudo isso com que
certos tiques de sarcasmo percorrem vários comportamentos…
Pior de que tudo isto esteja a acontecer é a
conivência com que certa comunicação social cala os abusos e vai camuflando as
tentativas de compra dos seus silêncios, no mínimo, cúmplices.
Dá ainda a impressão que, em determinadas situações,
os intervenientes já perderam a compostura que se exige a quem está na vida
pública, criando-se a sensação de que a desvergonha passou a ser outro passo da
conduta em maré de se estar por cima, tanto pela governança como pela
deseducação.
Com razoável desmedida se vê alguma falta de
aceitação das opiniões alheias, gerando-se sem grande pejo um ambiente de quase
delito de opinião, desde que ela seja contrária à da maioria reinante ou à da ideologia
de serviço. Quem conhecer a História saberá que foi deste modo que foram
germinando as ditaduras, nunca às claras, mas servindo-se do politicamente
aceitável… Afinal, merecemos muito melhor!
António Sílvio Couto
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