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quarta-feira, 13 de março de 2019

Falar de violência não gerará mais violência?


Algo se está a passar de muito grave na nossa sociedade. Algo aflitivamente complexo está a minar as relações entre as pessoas. Algo demasiado contundente para ser reduzido à frieza dos números de vítimas, à capturar dos réus e, sobretudo, para estarmos reféns dum ambiente atrozmente doentio.

Falamos da apelidada ‘violência doméstica’, naquilo que tem de visível, de noticiado e mesmo de explorado com cores excessivamente funestas. Será que, de repente, os casados passaram todos a estar desavindos e à pancada entre si? Será que as discussões se tornaram mortíferas e criminosas sem olhar a quem e em qualquer espaço? Será que, anteriormente, as coisas se passavam mais em surdina e pela calada do silêncio cúmplice e amordaçado? Este ‘boom’ de casos e de mortes não terá algo mais profundo a dever ser refletido por todos? Até que ponto é que a divulgação, a normalização das situações e mesmo a exploração dos dramas não é comandada por um guião que deseja, sobretudo, desacreditar a família e tudo o que ela representa ainda? Não será que algo descontrolou as reações das pessoas, tanto das propensas à agressividade como às outras sujeitadas à influência nefasta do ambiente em que nos vamos desenvolvendo?

Muitas outras questões poderiam ser levantadas, atendendo aos objetivos com que podemos e devemos analisar esta onda de violência manifestada no contexto familiar, tanto o dito normal como qualquer outro em que as pessoas se relacionam entre si.

Ninguém está fora das causas e tão pouco das consequências da dita ‘violência doméstica’: aquelas são multíplices e estas ainda não foram totalmente diagnosticadas. Com efeito, como será o comportamento de futuros adultos que viveram num quadro explícito ou tácito de violência entre pais? Como será a reação dos agora mais novos quando tiverem de criar laços com outros: não serão desconfiados e temerosos à mistura com sinais de agressividade latente e prestes a ser despoletada? De facto, a violência é uma espécie de granada ofensiva a quem já tiraram a espoleta e que poderá explodir ao mínimo contacto com outros e em idêntico panorama psicológico, social e cultural…  

= Perante o clima de agressividade com que temos de saber estar, viver e conviver, torna-se essencial – dizemo-lo duma visão cristã da vida, dos valores e da família – lançar sugestões sobre o modo como será desejável que tudo isto com que fomos confrontados diariamente possa encontrar pistas para se modificar. Desde logo é fundamental colocar Deus nestas convulsões. Sobretudo se atendermos à sua ausência compreender-se-á que falta respeito das pessoas entre si. O outro/a pode ser visto mais como adversário, concorrente ou até inimigo e, por isso, algo – quando deveria ser ‘alguém’ – a abater, senão física ao menos psicologicamente. Quem ousará fazer frente a quem não respeita o semelhante? Este, com facilidade, pode tornar-se obstáculo às pretensões e, por isso, será derrubado, dependendo das armas que possam usar e dos fins a atingir, sem olhar a meios.

Aquilo que antes era exceção, agora tornou-se regra, fazendo com que as pessoas se vão materializando e coisificando. Deus não norteia nem condiciona os comportamentos, mas poderá guiá-los e ser o sujeito que nos faz respeitar para ser igualmente respeitado. A exclusão de Deus da consciência e da vida de tantos dos os contemporâneos não explica, mas pode responder, à amoralidade com que se conduzem e mesmo vivem. Já nos dizia, de forma confrangida o Papa Bento XVI: ‘o pior do nosso tempo é as pessoas viverem como se Deus existisse’ e acrescentamos: fazendo de conta que não precisam d’Ele nunca!  

= Tendo como ponto de referência a teologia da casa na cultura judaica – infelizmente nem sempre seguida e vivida na dimensão cristã – será muito importante que façamos da casa de família esse espaço sagrado de convivência, de fraternidade e de comunhão, coisa que as notícias da dita ‘violência doméstica’ contradizem e denunciam. Como é importante sentir a casa como esse santuário da vida em família, como ‘igreja doméstica’ e ainda como o melhor lugar para aprender, viver e testemunhar o respeito entre todos – cônjuges, pais e filhos, irmãos e demais família – numa aprendizagem desde a mais tenra idade e até aos momentos últimos da vida terrena. Para quem tem boas experiências disso será de desenvolver novas oportunidades. Do resto, precisamos de emendar o vivido e modificar o que vamos vivendo…        

 

António Sílvio Couto



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