À
confusão de interpretações sobre a troca de informações – escritas (de forma
tradicional e publicável) e outras aduzidas de comunicação pessoal (sobretudo
na forma digital) – entre um ministro e um potencial/ex-presidente dum banco,
surgiu esta expressão que vai, certamente, fazer furor nos tempos mais
próximos, particularmente quando estiver em causa algo que se pretenda
esconder: ‘erro de perceção mútuo’… podendo vir a ser de bom-tom pensar que
esta expressão pode servir para tudo e quanto se quiser… apensar-se-lhe!
= Até
agora estamos um tanto atónitos, pois só temos visto e ouvido uma parte do
‘mútuo’, isto é, aquela que fala e dá explicações sobre o que se terá passado,
mais desculpando-se do que elencando as causas, pois quanto às consequências
ainda não se vislumbra nada de essencial…
Não
deixa de ser sintomático para a nossa conduta coletiva que se possam usar
palavras mais ou menos aplicáveis a situações pessoais, que correm o risco de
se virem a generalizar…mesmo que do particular se entre na fulanização das
gravidades e dos agravos duns para com os outros!
= De
facto, quem não deixará de usar esta expressão até para poder – intencional ou
capciosamente – chamar mentiroso a outrem, só por que ele não conseguiu
entender o que lhe foi dito? Quem não se servirá – mais ou menos distraidamente
– desta expressão para corrigir a capacidade de entendimento do interlocutor,
só porque lhe dá jeito ou até favorece? Quem não hesitará – seja qual for a
intenção – em recorrer a esta expressão, se estiver em causa amedrontar os
adversários, condicionando-os e tentando-os manipular?
= Num
tempo e num país onde se gasta tanto tempo com coisas secundárias, fazendo crer
que são importantes, esta expressão – ‘erro de perceção mútuo’ – tem tanto
potencial para não dizer nada como para arranjar condições para dizer
tudo…mesmo podendo roçar a mentira e/ou alienando quem não pensa como quem usa
a dita expressão.
= Talvez
agora possamos aprender a tratar os assuntos da vida coletiva e pessoal com
mais acerto e profundidade, cuidando em que as questões não se resolvem com
superficialidades nem jogos-do-empurra, mas antes assumindo cada qual as
responsabilidades que lhe competem numa crescente atitude de adultez que sabe
enfrentar as consequências das suas decisões e que não se esconde sob a capa da
interpretação daquilo que os outros possam pensar… Aquela expressão – erro de
perceção mútuo – não poderá tornar-se uma espécie de alibi duns tantos irresponsáveis
para prolongarem uma certa impunidade perante tudo e todos… Com efeito, já
bastava termos de aturar a ascensão dalguns oportunistas para termos ainda de
condescender com a vulgaridade que reina e campeia…
=
Sabendo que nem todos assumem os seus erros e falhas – isso faz arrepender-se e
pedir perdão – precisamos de fomentar na nossa sociedade novos promotores (mas
não senhores) da verdade, onde a palavra dada é mesmo honrada e os atos são
paradigma da personalidade de quem os pratica. Efetivamente para que haja ‘erro
de perceção mútuo’ teremos de ser dignos de aceitar os erros, percebê-los e
perante os outros aceitá-los…Tudo o resto poderá ser conversa barata e discurso
sem nexo. Até quando iremos aturar tais desfaçatezes? Coerência,
precisa-se!
António Sílvio Couto
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