terça-feira, 27 de maio de 2025
‘Bebés reborn’ – ilusão disfarçada de ternura?
1. Qual a origem e o desenvolvimento destes ‘bebés reborn’? Parecem recém-nascidos, mas uma observação mais atenta revela detalhes tão meticulosos que rapidamente se percebe a diferença: trata-se de um boneco criado para se fazer passar por um ser vivo. Estas criações são o resultado de um trabalho artístico e técnico rigoroso, concebidas para se parecerem, sentirem e, até cheirarem como bebés verdadeiros. Este fenómeno dos ‘bebés reborn’ nasceu nos anos 90 do século passado, mas tem ganho nova popularidade nos últimos anos, impulsionado por comunidades online, artistas especializados e até um interesse crescente pelo valor emocional e terapêutico das peças. Estas bonecas/bonecos pesam pouco mais de um quilo e meio, são feitas/os a partir de misturas de silicone patenteadas. Os moldes podem ser esculpidos à mão ou até impressos em 3D a partir de bebés reais, o que contribui para um nível quase inquietante de realismo. Os rostos são meticulosamente pintados, a pele tem um toque aveludado, macio e maleável e o cabelo é implantado fio a fio. Estão perfumados com uma fragrância que evoca pó de bebé, pele nova e leite materno, numa combinação criada para despertar ternura quase instintiva.
2. Sendo algo que tem vindo a criar uma crescente e complexa aceitação, senão mesmo difusão nos meios virtuais, o que pode significar de mais profundo este fenómeno? Estaremos a vivenciar uma crise de identidade social mais complexa do que essa mera simpatia para com estes bonecos de faz-de-conta? O fascínio destes ‘bebés reborn’ parece revelar a evocação de outras emoções profundas, muitas vezes ligadas a experiências de vida, como o luto, a maternidade, ou simplesmente do desejo de cuidar, podendo ainda situar-se na linha de tentativas de colmatar uma certa maternidade frustrada, seja pela infertilidade, por alguma experiência de aborto ou por perda gestacional.
3. De entre tantas reações a esta onda de ‘rebonismo’, há quem contraponha a concomitância com tantas crianças abandonadas e sem haver que cuide delas atentamente. Outros ainda situam-se na linha de que estes ‘bonecos’ já trazem livro de instruções, coisa que as crianças de carne-e-osso não apresentam e, por conseguinte, os pais/progenitores têm de aprender a lidar com o ‘presente’, seja ele como for, é um ser vivo. Outros mais exagerados consideram que os ‘bebés reborn’ são ainda menos valiosos do que os animais de companhia, domésticos ou de estimação, pois, estes, como seres vivos, reclamam da não-atenção dada e podem tornar-se algo mais exigente até do que as crianças nascidas…
4. Há, no entanto, uma reflexão que exige capacidade de interpretação deste fenómeno dos ‘bebés reborn’: serão uma ilusão disfarçada de ternura, mais na incidência virtual do que real? Não serão mais uma substituição simbólica, transformada em realidade alternativa? Não será que a empatia gerada com e pelos ‘bebés reborn’ se está a tornar em alienação quase coletiva? O assunto é sério e exigente.
5. De facto, nota-se mais uma vez não só a inversão de valores, mas a sua confusão, privilegiando o que parece àquilo que é e fazendo com que se procurem compensações emocionais onde deveria haver simpatia e compaixão não com coisas – os ‘bebés reborn’ são material disfarçado – mas com pessoas, sentindo os seus sentimentos, quantas vezes baralhados por razões quase inexplicáveis. Sem nos darmos conta as emoções das pessoas foram-se tornando endurecidas e a sua expressão em faceta humana como que eivadas de sentimentos interesseiros e gananciosos. Urge humanizarmo-nos com humildade e verdade.
António Sílvio Couto
sábado, 24 de maio de 2025
Síndrome de ‘peter pan’ - sinais e desafios
A ‘síndrome de Peter Pan’ caracteriza-se por determinados comportamentos imaturos em aspetos de capacidades, psicológicos, sexuais ou mesmo sociais. No entanto, não há evidências de que esta síndrome seja uma doença psicológica real, e por isso não está referenciada nos manuais de transtornos mentais... A ‘síndrome de Peter Pan’ é uma condição em que a pessoa se sente insegura e insatisfeita com tudo e não assume responsabilidades...
1. Caraterísticas da ‘síndrome de Peter Pan’: a incapacidade de alguém em acreditar que é mais velho ou de se envolver num comportamento associado à idade adulta. Esta síndrome afeta pessoas que não querem ou se sentem incapazes de crescer, pessoas com corpo de adulto, mas mente de criança. Não sabem ou não querem deixar de ser crianças. O termo vem do personagem infantil fictício Peter Pan, que nunca envelhece... Embora seja mais comumente atribuído aos homens, pode afetar também as mulheres. Algumas características deste transtorno são: a incapacidade dos indivíduos de assumirem responsabilidades, de se comprometerem ou de cumprirem promessas, bem como o cuidado excessivo com a aparência e o bem-estar pessoal e a falta de autoconfiança, mesmo que pareçam não mostrá-lo e possa parecer exatamente o oposto. Além disso, eles estão constantemente mudando de parceiros e procurando os mais jovens.
2. Perante este panorama descritivo, algo complexo e difuso, não haverá por aí - mesmo na política mais recente - muitos ‘peter’s pan’s’ disfarçados, camuflados e não assumidos? Como poderemos contar com pessoas que dizem e se desdizem em tudo e o seu contrário em menos de poucas horas? Não haverá por cá muitos/muitas que precisam de se esconder nas suas fragilidades, ostentando mais as vaidades do que aquilo que de facto valem? Como diria uma mensagem publicitária: o que impede de mostrar o ‘peter pan’ que há em si’?
3. Quais as causas da ‘síndrome de Peter Pan’?
Existem muitas causas que podem gerar a ‘síndrome de Peter Pan’. Entre elas, problemas no período da infância são os que têm mais probabilidade de gerar como consequência uma pessoa que se recusa a amadurecer e entrar na vida adulta. Ter uma infância muito feliz, com poucas frustrações e um conforto muito grande, assim como pouco estímulo dos responsáveis para que a criança comece a ter mais responsabilidades e amadureça pode ser uma outra das causas dessa síndrome. Outro fator pode ser passar por uma infância muito conturbada, que não pode ser realmente aproveitada. Então, começar a trabalhar muito cedo ou a tornar-se responsável pela família sem poder escolher outra coisa... Pelo que podemos depreender a raiz da ‘síndrome de Peter Pan’ radica no tempo da infância, seja pelo maior protecionismo, seja pela menos rápida assunção de responsabilidades sem preparação adequada.
4. Como lidar com pessoas que apresentam (clara ou subtilmente) esta ‘síndrome de Peter Pan’? Quem tem esta síndrome comporta-se de forma impulsiva, sem tolerar frustração ou comentários negativos. Quem tentar criticar alguém com ‘síndrome de Peter Pan’ pode deparar-se com uma birra, igual àquela que uma criança faria, se for contrariada. Pessoas com ‘síndrome de Peter Pan’ costumam ser inseguras, tendo pouca confiança em si mesmas, procurando apoio nas figuras familiares, que irão ajudar na tomada de decisões ou em situações em que precise de segurança. Deste modo, papéis importantes (como ser pai, casar e trabalhar ou crescer profissionalmente) são evitados a qualquer custo... Não será que, neste tempo após a pandemia, a ‘síndrome de Peter Pan’ está mais viva do que nunca?
5. Uma sugestão: tente descobrir sinais desta síndrome à sua volta e poderá ter algumas surpresas.
António Sílvio Couto
quinta-feira, 22 de maio de 2025
Precisamos de políticos ‘profissionais’ (preparados, competentes, servidores)
Quem imaginaria ouvir e, sobretudo, submeter-se a alguém que fosse um médico ‘não-profissional’, isto é, que exercesse a profissão sem preparação ou sem dedicação exclusiva? Deixaríamos ir para escola crianças que não fossem ensinadas por professores ‘não-profissionais’? Entregaríamos o carro aos cuidados de um indivíduo que se dissesse mecânico e que não fosse ‘profissional’? Então porque entregamos as decisões sobre o nosso futuro coletivo a pessoas que afirmam que não são políticos ‘profissionais’, isto é, que estão na atividade política (pública) mas não se vinculam nas decisões pelos outros ou que usufruem de vencimentos pagos pelo erário público, mas que funcionam como ocasionais ou parecem predadores à la carte?
1. Em qualquer atividade da vida deveríamos exigir que se verificassem, entre outras, estas qualidades ou caraterísticas: vocação para o exercício da atividade, preparação (mínima, suficiente ou máxima) e sentido de serviço mais do que de usufruto de regalias ou de proventos materiais.
2. Vem esta deriva que aqui partilho, sem querer ofender nada nem ninguém, a propósito de frases algo desconexas no conteúdo e na forma, que se ouvem de pessoas que se apresentam (ou aparecerão) como querendo ser sufragadas pelo voto popular e que reclamam que não são políticos ‘profissionais’, que têm outra atividade e a ‘perninha’ que se propõem fazer na política – autárquica ou outra – é mais um lóbi ou forma de ocupar o tempo em entretenimento. Isto já foi habitual, mas não deveria ser aceite nem autorizado, pois, para além de vermos certos ‘patos-bravos’ de arribação chegarem e saírem muitas vezes de mãos cheias, corremos o risco de entregar, nem que seja por engano, os destinos de uma certa porção de decisões políticas a sujeitos que só querem tirar proveito da função em que se encontram, mesmo que temporariamente ou de beneficiarem os seus apaniguados ou correlegionários mais espertalhões...
3. Retomemos a caraterização daqueles que devem ser políticos ‘profissionais’, isto é, fazendo profissão com todas as condições exigências para o exercício do ato de estar na vida pública e trabalhando para o bem comum. Antes de tudo devem ter ‘vocação’, quer dizer chamamento em fazer algo pelo bem dos outros. Mesmo que possam vir do exercício de uma outra profissão, não podem renegar que, ao entrarem na vida política (serviço de cidadania), têm de manifestar vontade de dar antes de receber, de estar disponível antes de colher regalias ou benesses, de saber que aqueles que neles votaram esperam que dignifiquem a confiança depositada neles. Não será esta premissa uma espécie de utopia e quase desilusão para tantos dos nossos ‘políticos’ quase incompetentes?
4. Abona pouco ou nada em favor dos políticos ‘profissionais’ que não estejam preparados para a função que assumem. Embora possam ter assessores para certas tarefas específicas, os políticos ‘profissionais’ têm de ser arautos de humanismo, escutando mais do que decidindo à pressa. Se tivessem de ter preferidos deveriam ser os mais vulneráveis e indefesos do que os poderosos e caciques, que muitas vezes vegetam à volta da cadeira do poder. Com efeito, este, se não for exercido como serviço, tornar-se-á um antro de clientelismo, de favorecimentos e até de corrupção até ser tudo posto a descoberto...
5. Temos de corrigir, urgentemente, o chavão: os políticos são todos iguais! Há os que são mais honestos e os oportunistas (nestes incluo muitos dos ditos independentes). Há os que são dignos de credibilidade e os camuflados (nestes observo tantos que aparecem para cobrir favores e encapotar outros interesses). Há os que são sérios e os que só o parecem sê-lo quando não se riem (neste encontro os populistas e bem-falantes sem mensagem). Há os que sabemos quem são pelas provas dadas e outros que só os conheceremos se nos deixarmos enganar colocando-os no poder. Diz o povo e com razão: se queres conhecer o vilão põe-lhe o pau na mão!
António Sílvio Couto
Caminho das pedras
Os resultados na noite eleioral de 18 de maio podem ser lidos por muitas prespetivas e colocando-nos em diversos ângulos. Veio-me à lembrança uma passagem bíblica em que Pedro, solicitando a Jesus que o fizesse ir com ele caminhando sobre as águas(cf. Jo 6,16-21); então, aquele ao ver a força dos ventos e a profundeza do mar, começou a afundar-se, ao que (em jeito anedótico) o Mestre teria dito aos que viam temeroso em risco: João, ensina-lhe o caminho das pedras... para que ele não se afunde de vez!
De fato, há alguns dos intervenientes na resfrega eleitoral que precisam de seguir o conselho – aprender o caminho das pedras – para que não se afundem irremediavelmente e com eles o projeto político que dizem servir!
1. Antes de tudo vejamos a insignificância a que foram reduzidos os partidos da ‘dita’ esquerda: no futuro parlamento, no seu conjunto, são menos de um terço (do quadro geral): 70. Por seu turno os outros grupos (quatro no total) – apelidados/rotulados de ‘direita’, por contraste com os do outro lado – somam mais de dois terços do hemiciclo: 156... A balança desequilibrou-se de forma repentina e quase dramática. Este fenómeno exige reflexão para todos, desde os vencedores aos vencidos e, sobretudo, para quem não se deixe ficar pela espuma dos episódios mais ou menos simpáticos para as suas preferências
2. Houve agremiações partidárias que ficaram reduzidas ao mínimo e tornaram-se residuais naquilo que já foram num passado não muito longínquo. O BE que já teve dezanove deputados, fez festa por eleger apenas uma representante simbólica. Os comunistas que já tiveram quarenta e sete eleitos, depois de virem a diminuir de eleição para eleição, quedam-se por três resistentes bastiões de zonas em foram quase exclusivos. O partido mais expressivo da esfera da esquerda, para além de perder (vinte deputados desde a última eleição), pode ser ultrapassado por um outro partido que só tem seis anos de história...
3. Há questões que saltam à vista dos mais distraídos – e parecem que são tantos! – qual a explicação do fascínio que certas forças – do quadro da pretensa ‘direita’ – manifestam sobre boa parte da população mais nova? Sendo tantos o que têm mais de sessenta e cinco anos – que viveram a revolução de abril de 74 na sua adolescência – porque se foram afastando das ideias da esquerda ou pelo menos de uma certa esquerda mais radical? O que explica – colhendo as causas e não ficando-se pelas consequências – que ao sul do Tejo já não colham aceitação popular forças que se diziam defensoras ‘dos trabalhadores e do povo’? Mais uma vez as empresas de sondagens foram desacreditadas por parte significativa dos resultados finais – haverá encomenda ou os factos desmentem as pretensões? Não será que a forma de fazer política e, sobretudo, os meios de campanha eleitoral, estão esgotados e podem ser enganadores dos atores em bolha?
4. As pedras por onde têm de caminhar são mais visíveis para uns e algo subtis para outros. Dá a impressão que todos temos de refletir sobre a chegada do fenómeno do populismo a este recanto da Europa. Até agora víamos que lá fora certas forças vingavam à custa de ideias eivadas de intolerância, de propagação do medo, da manipulação contra a convivência entre os povos e as culturas, de uma certa supremacia dos residentes sobre os emigrantes... Tudo isto e muito mais subterrâneo está cá dentro e atingiu foros de arrogância, tanto nas palavras como nos gestos e ações.
5. Não vai ser fácil convencer algumas gerações que não voltaremos para traz, até porque muitos dos favores e regalias foram-lhes dados sem esforço nem como recompensa por qualquer trabalho realizado em favor dos outros. A Europa e a sociedade ocidental têm ajudado a fazer crescer a mediocridade, elevando-a ao poder. De muitas e variadas formas estamos em risco de colapso, se não soubermos perceber que o nosso futuro corre riscos, pois a maior parte vive sem valores morais/éticos e centrando-se no materialismo de vida.
António Sílvio Couto
quarta-feira, 21 de maio de 2025
Subsídios para a interpretação dos resultados das eleições
O país mudou no dia 18 de maio de 2025: os resultados algo inesperados trouxeram à luz do dia vários indícios de que os cidadãos e os políticos não leem pela mesma cartilha, usam um alfabeto desencontrado e antes de analisar as consequências é preciso descobrir as causas.
Para usar o chavão que todos citam, mas nem sempre seguem: o povo é sábio nas suas decisões e inteligente nas suas convicções. Com efeito, mais do que encontrar desculpas, urge refletir sobre os motivos que levaram a votar em forças diferentes das habituais e até em propostas que quase escandalizam os mais ortodoxos da nossa política, sem ser mera politiquice.
1. Algumas questões antes de tentarmos encontrar as tais causas mais profundas do que as impressões ainda superficiais. Por que se dá uma divisão de escolhas a norte e ao sul do Tejo? Por que as forças ditas até há pouco tempo ‘trabalhadoras’ (de uma certa esquerda) não têm expressão nos resultados apurados? Houve algo que fez mudar e nem todos perceberem o que aconteceu? Os trabalhadores – ditos proletários na linguagem marxista – deixaram de existir ou o seu lugar foi ocupado por máquinas e de outros manobradores delas, em menor quantidade? A pretensa invasão de imigrantes foi abjurada pelos residentes, que passaram a apoiar e rever-se naqueles que defendiam a contestação? Como pode uma certa sensação ou perceção de insegurança ter contribuído para votarem em forças que se apresentam como defensores – mais tácitos do que comprometidos – do controlo migratório?
2. Nota-se que muitos dos nossos ‘políticos’ usam uma linguagem de bolha, sem adequação à realidade e, nalguns casos, querendo impor uma forma de pensar, quando o povo não descodifica a comunicação. Que dizer da mensagem de combate – diziam: taxação – aos ricos, se foram os pobres que não escolheram aquilo que eles propunham. Décadas depois cumpriu-se, no nosso país, a proposta dos suecos que queriam acabar com os pobres, contrapondo com a pretensão de Otelo Saraiva de Carvalho que desejava irradicar os ricos. Em muitos casos os ‘pregadores’ contra os ricos vestem-se com roupas de marca e com isso desacreditam a mensagem pouco condizente com o exemplo.
3. Notou-se, na maior parte dos intervenientes, um discurso excessivamente negativo e sem perspetivas de sair do fosso para onde nos empurraram alguns dos atos de tantos, que agora até sairam derrotados, como nunca antes. Houve demasiadas invetivas a roçar a ofensa, senão mesmo uma espécie de ‘execução de caráter’, como foi colocado para com certas figuras. Com efeito, a vermos pelo terminar das eleições pareceu que tal atitude não foi recompensada para alguns.
4. Houve ruído a mais, quando se tratava de apresentar as propostas de futuro. À semelhança de outras épocas notou-se um certo entretenimento mais do que esclarecimento. Em certas manifestações de índole popular – como as ditas arruadas ou os desfiles de candidatos, a difusão de cartazes ou a proposta de debates – percebemos que havia mais interesse em confundir do que em explicar, em baralhar do que em dizer a verdade, com o cúmulo de um partido que nunca divulgou publicamente quem eram os seus candidatos – consta que boa parte dos eleitos tem problemas com a justiça – até à hora da votação. Será isto querer a verdade ou serve a manipulação? Poderemos permitir que volte a acontecer sem reflexo nos resultados?
5. É tempo de deixar de brincar às coisas-e-loisas da politiquice, pois rapidamente chegou ao nosso país a vaga de ideias que podem atrapalhar a pretensa democracia. Os princípios e valores da justiça, da segurança, da defesa – que é muito mais do que armamento, como diziam alguns dos mentores na recente campanha eleitoral – a educação, que é muito mais do ensino, as condições de vivência, que é muito mais do que a simples casa/habitação, as metamorfoses da saúde, que é muito mais do que a prossecução do atual serviço nacional de saúde…Não podemos falhar: queira Deus que saibamos cuidar do que ainda resta para que não venhamos a enterrar o que sobra.
António Sílvio Couto
domingo, 18 de maio de 2025
Papas com o nome ‘Leão’
Agora que temos um Papa que adotou o nome ´Leão’, qual é a lista – os outros treze – daqueles que o antecederam com o mesmo nome. Antes de cada nome incluímos o número na cronologia, desde São Pedro:
45) São Leão Magno (440 a 461)
80) São Leão II (682 a 683)
96) São Leão III (795 a 816)
103) São Leão IV (847 a 855)
118) Leão V (903)
123) Leão VI (928)
126) Leão VII (936 a 939)
131) Leão VIII (964 a 965)
152) São Leão IX (1049 a 1054)
217) Leão X (1513 a 1521)
232) Leão XI (1605)
252) Leão XII (1823 a 1829)
256) Leão XIII (1878 a 1903)
267) Leão XIV (2025…
= Se atendermos à divisão da História por milénios temos que no primeiro houve oito papas que escolheram o nome de ´Leão’, no segundo milénio houve cinco e já no terceiro milénio foi agora o Papa Leão XIV. De referir que da lista em cada milénio temos um santo – São Leão Magno ao final a Idade Antiga, com mais quatro papas canonizados – e um – São Leão IX – na transição para o segundo milénio, no contexto da designada Idade Média
= Vejamos agora algo de cada um destes Papas de nome Leão, atendendo ao contexto sociopolítico bem como à vivência ecclesial.
* Leão I ou são Leão Magno, foi papa entre 29 de setembro de 440 e sua morte em 10 de novembro de 461. Aristocrata de origem italiana. Foi ao encontro de Átila, chefe dos hunus, em 452, para persuadi-lo a desistir de sua invasão de Roma. É considerado ‘doutor da Igreja’, lembrado pelo "Tomo de Leão", um documento que foi fundamental durante os debates do Concílio de Calcedónia. Este concílio ecuménico tratou principalmente de questões cristológicas de definição de que Cristo é há hipostática de duas naturezas - humana e divina - unidas na única pessoa, "sem confusão e nem divisão".
* Leão II, papa de 17 de agosto de 682 a 28 de junho de 683, era siciliano de nascimento. Foi durante o pontificado de Leão II que a dependência da sé de Ravena da de Roma foi estabelecida definitivamente por um edito imperial.
* Leão III – foi o 96.º Papa e é um santo da Igreja Católica. Romano, de origem modesta,foi o responsável pelas roupas e pelos objetos preciosos da Basílica de Latrão, em Roma. No mesmo dia da morte do papa Adriano I (795), o clero, contrariando abertamente a nobreza romana, nomeou-o papa. A sua eleição provocou graves desordens em Roma, sobretudo entre os partidários do papa que morrera, que viam seus interesses ameaçados. A coroação imperial de Carlos Magno por parte de Leão III não teve precedentes e assinalou a retomada do Império Romano do Ocidente. No campo doutrinal, o pontificado de Leão III foi marcado por diversas disputas teológicas, dentre as quais se destacam a questão do adocionismo, que foi definitivamente condenado (799), e a questão do "Filioque".
* Leão IV foi consagrado como o 103.º Papa em 10 de Abril de 847. Morreu em 17 de julho de 855. Nasceu em Roma, onde foi educado no Mosteiro de São Martinho. Era monge beneditino. Fortificou com altas muralhas a colina do Vaticano e a zona em torno da basílica de S. Pedro, que tinha sido saqueada pelos sarracenos, criando a "Cidade Leonina". A fim de obter maior protecção consagrou imperador Luis II, o Jovem. Confirmou aos venezianos o direito de eleger o Doge. Foi o primeiro pontífice que pôs data nos documentos oficiais.
* Leão V foi consagrado o 118.º Papa em agosto de 903, sucedendo Bento IV. Filho de um humilde pastor. Alguns cronistas de documentos mais antigos alegam entre outras considerações, que teve esmerada educação devido à intervenção materna e de sua família. As facções em Roma estavam em ebulição. Leão V governou a Igreja menos de dois meses. Um dos partidos, não satisfeito com a escolha de Leão, insurgiu-se, criou tumultos pelas ruas da cidade, e, nessa desordem, o pontífice foi preso, arrastado para a prisão e morto misteriosamente. A causa da morte de Leão V permanece obscura. Pouco se sabe da sua vida, da sua eleição, do seu pontificado e das causas da sua morte.
* Leão VI foi o 123.º Papa da Igreja Católica, nascido em Roma, eleito em maio ou junho de 928, por vontade dos Teofilatos para substituir João X. Nada se sabe da primeira fase de sua vida, exceto que seu pai chamava-se Cristovão e era um dignitário da corte papal. Eleito papa quando seu predecessor o Papa João X ainda estava vivo, mas na prisão. De sua obra permanece apenas uma carta aos bispos da Dalmácia, onde exorta a obedecer o Arcebispo de Split. Fez todo o possível para pacificar Roma e lutou contra os sarracenos e contra os húngaros.
* Leão VII, provavelmente monge beneditino, era abade de São Sisto quando foi eleito o 126.º Papa a 3 de Janeiro de 936, por influência de Alberico II, príncipe e senador de Roma. As bulas papais consistiram na sua maior parte em garantir privilégios a vários mosteiros, especialmente aos da Ordem de Cluny. Escreveu aos bispos de França e da Alemanha dando directrizes para empreender uma reforma monástica. Tentou estabelecer o celibato sacerdotal e lutou contra o fenómeno dos bruxos e adivinhos. A sua morte ocorreu em 13 de julho de 939, após um ataque cardíaco. Depois da sua morte, Leão VII foi sepultado na Basílica de São Pedro.
* Leão VIII - Papa de origem italiana, foi ordenado na altura da sua designação pelo imperador Otão I. Com esta ocorrência abriu-se o precedente da indigitação pela pessoa do imperador, não se procedendo a uma eleição, como era costume. Este fato, criou descontentamento no povo romano, o que provocou uma revolução que o imperador abafou pela força. Este clima proporcionou o regresso do papa deposto, João XII, que anulou o pontificado de Leão VIII e as suas disposições num sínodo, realizado em 964. João XII morreu entretanto, e o imperador voltou então a Roma, repondo Leão VIII na cátedra de São Pedro, em junho de 964. Desta forma, o seu papado decorreu de 4 de dezembro de 963 a 1 de março de 965.
* Leão IX - Papa de origem francesa, era bispo de Toul e filho de um conde alsaciano. Eleito em dezembro de 1048, aclamado unanimemente em Roma e consagrado em fevereiro de 1049, este papa destacou-se por impulsionar decisivamente a reforma da Igreja. A simonia foi severamente condenada, assim como o não cumprimento do preceito da castidade. O papa foi preso em julho de 1053, no decurso da guerra contra os mercenários rebeldes normandos, tendo sido obrigado a assinar um contrato de reconhecimento do principado normando de Itália.
* Leão X - Com o falecimento do Papa Júlio II, Giovanni di Lorenzo de Medici foi eleito papa no dia 19 de março de 1513, adotando o nome de Leão X. Seu papado transformou Roma em um centro cultural e aumentou o poder papal no continente. Ele deu continuidade ao trabalho de seu antecessor e acelerou as obras da Basílica de São Pedro, ampliou a biblioteca do Vaticano e marcou a cidade romana como centro cultural do Ocidente. Leão X apoiou as tropas do imperador espanhol Carlos V e passou a agir de uma maneira que combateria os argumentos da reforma protestante. Para sustentar os gastos militares do conflito, o papa começou a vender indulgências. A postura do papa foi fundamental para compor as teses elaboradas por Martinho Lutero em crítica à Igreja Católica. Leão X deixou como legado a condenação da escravidão e defesa do abolicionismo, a ampliação da caridade, a reforma da universidade em Roma e com o patrocínio de artistas. Leão X faleceu aos 45 anos de idade.
* Leão XI - foi o Papa da Igreja Católica e Soberano dos Estados Papais de 1 de abril de 1605 à sua morte. Seu pontificado é um dos mais curtos na história, pois durou menos de um mês. Era da proeminente Casa dos Médici, originário de Florença. Na sua carreira, serviu como embaixador de Florença junto do papa, foi bispo de Pistoia. Arcebispo de Florença, legado papal da França, e como cardeal Prefeito da Congregação dos Bispos e dos Religiosos. Foi eleito para o papado no conclave papal de março de 1605 e foi o papa por 26 dias.
* Leão XII - Nascido numa família da nobreza que já tinha tido vários Papas, Leão XII teve problemas de saúde desde o momento da sua eleição até à morte, menos de seis anos depois. Foi um governante profundamente conservador, que aplicou muitas leis controversas, incluindo uma que proibiu os judeus de possuir propriedades. As finanças papais também eram ruins, embora ele reduzisse os impostos. Como resultado, o pontificado de Leão XII foi impopular e provocou amplo descontentamento nos Estados papais.
* Leão XIII - foi chefe da Igreja Católica de 20 de fevereiro de 1878 até sua morte em julho de 1903. Vivendo até os 93 anos, ele foi o papa mais velho...no posto. Foi ordenado sacerdote em 1837, em 1843 foi nomeado Núncio Apostólico para a Bélgica e ordenado bispo em 1843. Em 1846 tomou posse como bispo da Diocese de Perúgia, Itália, e em 1853 foi criado cardeal. Foi eleito papa em 20 de fevereiro de 1878 e coroado a 3 de março desse ano. A Doutrina Social da Igreja foi primeiramente iniciada por Leão XIII, com a encíclica ‘Rerum Novarum’. Em 1924 seus restos mortais foram transferidos para São João de Latrão. Depois de Bento XVI (emérito), que morreu com 95 anos, Leão XIII é o segundo papa com maior longevidade da história, falecido aos 93 anos.
* Leão XIV - Num dos mais breves conclaves da história – dois dias e quatro votações realizadas – foi escolhido, no dia 8 de maio passado, um novo Papa: o cardeal Robert Francis Prevost, escolhendo o nome de Leão XIV. Nascido em Chicago, nos EUA, em 1955, foi durante vários anos, como padre da ordem dos agostinhos, missionário no Peru (América Latina), do lado do Pacífico. O agora Papa Leão XIV foi ordenado padre em 1982, nomeado bispo de 2014 (com o lema – ‘in illo uno unum – no único Cristo somos um), feito cardeal em 2023 e também nesse ano prefeito do Dicastério para os Bispos. Trabalhou no Peru de 1985 a 1986 e de 1988 a 1998 como pároco, professor de seminário e administrador. Passou de 1987 a 1988 e de 1998 a 2001 nos Estados Unidos, radicado em Chicago,sua cidade natal , e trabalhou na ordem agostiniana (foi provincial e geral). O agora Papa Leão XIV tem formação em matemática, em teologia e em direito canónico. Iniciou o seu pontificado no dia 18 de maio…
António Sílvio Couto
quinta-feira, 15 de maio de 2025
‘Cultura’ sob égide ideológica?
É um dos assuntos que mais me intriga no espetro sociopolítico do nosso país: a dimensão cultural – teórica ou prática – está consignada a um setor ideológico que se julga dono e senhor de tudo quanto possa ser considerado cultura. Por vezes é de tal forma clamoroso que os proponentes nem veem a figura quase ridícula em que laboram. Quem foi ou tiver a cobertura da égide de esquerda brilha, o resto, mesmo que possa ter alguma qualidade será – pasme-se a arrogância dos cultos/as – censurado explícita ou tacitamente.
1. Um dos tristes episódios foi protagonizado no apelidado ‘festival da eurovisão’, e no que aos representantes portugueses concerne, onde os intérpretes portugueses pareceram escapar à bitola reinante… na ribalta e nas ditas ‘casas de apostas’. Embora tenham ganho a possibilidade de serem os nossos representantes em Basileia (Suíça), escaparam à onda da moda, cá dentro como lá fora: dados como descartáveis conseguiram ultrapassar a primeira eliminatória e chegar à final… de pouco me importa o resultado, questiona-me as trapalhadas pelo meio…Parece que o tema de ‘deslocado’ – título da canção – incomodou alguns. Parece que outras façanhas ‘culturais’ fizeram ofuscar o caso, mas que houve gente que ficou com azia notou-se.
2. Novamente tentando discernir a qualidade cultural daquilo que se produz em Portugal e/ou em língua portuguesa deste lado do Atlântico podemos ser levados a considerar que as temáticas sociais se sobrepõem às lengalengas românticas, que emergem quando a sociedade como que vegeta no quadro dos valores e dos critérios de conduta de vida. Decorridos mais de cinco décadas sobre a alteração política de abril-74 ainda não foi possível sacudir a tutela de alguns mentores – já defuntos ou saudosamente prolongados nas utopias revolucionárias – cujos tentáculos se estendem na vez (se a cor não condiz com o promotor) e na voz (entre a qualidade e os arranjos de estúdio): os cançonetistas pululam – em certos programas mais pulam – ao sabor dos trejeitos de habilidosos na roupagem mais do que na sofrível execução… em playback.
3. Que significa apelidar de ‘cultura’ umas canções, uns teatrinhos, umas declarações, uns convénios, umas farsas anticristãs ou ainda publicações de teor adverso ao catolicismo? Desde que inclua algo que menospreze ou ofenda os valores de índole do evangelho, já será considerada cultura? Desde que se arvore em progressista porque é multicolorido, já tem de ter o rótulo de cultura? Desde que injete noções e conduções contra o valor da vida, já pode ser dito cultural?
4. Desgraçadamente continuamos a ver em muitos intelectuais tiques de preconceito para com a noção de cultura, desde a mais básica e popular até à mais elaborada e erudita. Consultando fontes que nos possam ajudar a ‘definir’ cultura, encontrei esta: «A cultura refere-se ao conjunto de conhecimentos, crenças, práticas, valores e costumes compartilhados por um grupo social, transmitidos de geração em geração e que moldam a identidade e o comportamento dos seus membros. É uma construção social complexa que abrange tanto os aspectos materiais (como objetos e tecnologias) quanto os imateriais (como idiomas, rituais e crenças)».
Se atendermos aos aspetos aqui referidos não podemos desconsiderar expressão cultural algo que a mim não me diz nada, mas que pode se referência de um grupo ou de uma pessoa bem diferente de mim. Talvez seja eu que não estou sintonizado com aquela expressão cultural… Deste modo soa a manipulação, senão mesmo a ditadura, a imposição de uma cultura a outra que é diferente dessa.
5. É significativo e notório que a ‘cultura cristã’ – dentro e fora do ambiente eclesial – está a passar por uma crise, desde a criação até à compreensão, passando mesmo pela explicação dos sinais com que ela se exprime. Urge, por isso, descobrir a riqueza da expressão cultural cristã nos seus diferentes campos e modos de atividade. Para sermos capazes de ter futuro precisamos de compreender o nosso passado, discernindo a nossa cultura no presente. Assim o façamos com verdade e simplicidade!
António Sílvio Couto
segunda-feira, 12 de maio de 2025
Que esperar do Papa Leão XIV?
Num dos mais breves conclaves da história – dois dias e quatro votações realizadas – foi escolhido, no dia 8 de maio passado, um novo Papa: o cardeal Robert Francis Prevost, escolhendo o nome de Leão XIV. Nascido em Chicago, nos EUA, em 1955, foi durante vários anos, como padre da ordem dos agostinhos, missionário no Peru (América Latina), do lado do Pacífico. Francisco veio do lado do Atlântico, há doze anos… A geografia de procedência dos Papas mudou. Isto quer dizer muita coisa!
O agora Papa Leão XIV foi ordenado padre em 1982, nomeado bispo de 2014 (com o lema – ‘in illo uno unum – no único Cristo somos um), feito cardeal em 2023 e também nesse ano prefeito do Dicastério para os Bispos. Trabalhou no Peru de 1985 a 1986 e de 1988 a 1998 como pároco, professor de seminário e administrador. Passou de 1987 a 1988 e de 1998 a 2001 nos Estados Unidos, radicado em Chicago, sua cidade natal, e trabalhou na ordem agostiniana (foi provincial e geral). O agora Papa Leão XIV tem formação em matemática, em teologia e em direito canónico.
= Num tempo que tenta ler a ação da Igreja e do Papa em particular pelo prisma do social, Leão XIV tem algo nessa matéria, sobretudo no que se refere ao trabalho pastoral e às questões políticas na relação com os refugiados e os temas climáticos. Sobre temas de índole mais ético-moral Leão XIV (enquanto cardeal Prevost) é contra o aborto e a eutanásia e ainda contrário à promoção da ideologia de género… Afinal, algo na linha dos mais recentes papas e, concretamente, do Papa Francisco.
= Quando alguns – mais de fora do que de dentro da Igreja católica – viram este novo Papa pareceu que estavam a querer um sumo pontífice que fosse como o anterior. Isso nunca poderia acontecer, se bem que na Igreja não se dá saltos nem se entra – ao nível da doutrina – em contradição, vive-se e faz-se a reforma na continuidade, tendo sempre por referência o Concílio Vaticano II, terminado há sessenta anos.
Este Papa Leão XIV é o primeiro nascido, em 1955, depois do final da segunda guerra mundial. Sendo descendente de emigrados – italianos, franceses e espanhóis – sentirá no sangue a diversidade de culturas e a mistura de ser americano, embora com cidadania peruana. Isto pode fazer-nos perceber que a riqueza cultural não está na uniformidade, mas na salutar conjugação da diversidade.
= Se atendermos à escolha do nome ‘Leão’ podemos ver que este novo Papa quer fazer pontes com algo que vivemos no século vinte e no primeiro quartel do século vinte e um. O anterior Papa com o nome de ‘Leão’ foi na transição do século dezanove para o século vinte (1878-1903), Leão XIII, o Papa das questões sociais (autor da encíclica ‘Rerum novarum’), na crista da onda da revolução industrial e dos temas do proletariado e das revoluções subsequentes. Por isso, será de esperar que o Papa Leão XIV nos faça a todos – fiéis: clérigos, religiosos e leigos – continuar a refletir, verdadeiramente, sobre a sinodalidade, a colegialidade, a Igreja serva e peregrina, colocando-nos todos frente a frente para que sejamos dignos do tempo em que vivemos e não nos fiquemos no passado saudosista nem tentemos querer um futuro sem alicerces de compromisso…
= O início do ministério do Papa Leão XIV acontece a 18 de maio, data de aniversário do Papa João Paulo II, faria 105 anos de nascimento e na celebração litúrgica de um outro papa e mártir, S. João I, do século VI. Rezemos pelo nosso Papa.
António Sílvio Couto
Problemas dos ‘millenials’ e não só…
Numa época em que se vai rotulando os que vivem em cada tempo podemos e devemos descrever (numa espécie de definição) algumas das gerações de pessoas desde o final da década de sessenta do século passado e até à passagem do milénio, há mais de vinte e cinco anos.
Em resumo os epítetos e depois as caraterizações: geração X (de 1965 a 1980), geração Y (de 1981 a 1999), millenials (de 1980 a 2003) e geração Z (nascidos a partir de 2000).
Vejamos as vertentes gerais, tentando que cada um se possa encontrar nessas balizas etárias, analisando como se vê ou ainda como se revê:
* Geração X – A principal característica da geração X é a batalha pelos direitos iguais e pela liberdade, uma vez que muitos vivenciaram períodos de ditaduras ou de governos bastante rígidos em diversos países pelo mundo. Esta geração cresceu com a ideia de que todos devem ter os mesmos direitos e que nenhum poder se pode estabelecer acima da lei. Em relação à tecnologia, eles viram poucas mudanças drásticas em seu cotidiano. A televisão talvez tenha sido o maior impacto na vida dessas pessoas.
* Geração Y – A principal característica da geração Y é o conceito de mudança, principalmente em relação ao mercado de trabalho: aqueles que pertencem a esta geração estão sempre atrás de novos, seja pela questão monetária, seja simplesmente pela possibilidade de aprenderem algo novo. Outra característica marcante dessa geração é a facilidade para se adaptar a tantas mudanças, principalmente nas relacionadas com a tecnologia.
* Millenials – A geração de pessoas que nasceram entre os anos de 1980 e 2003. Os millennials adaptaram-se mais rapidamente às evoluções tecnológicas, como a chegada de smartphones e a presença constante de computadores conectados à internet durante a rotina, Eles são considerados disruptivos (causam rutura ou interrupção) e buscam constantemente por inovação. É, geralmente, considerado o primeiro grupo geracional a lidar com maiores recompensas por curto esforço, em relação aos seus pais que cresceram numa sociedade pautada pelo trabalho.
* Geração Z – Formada por todos que nasceram a partir de 2000, a geração Z já nasceu com uma boa parte das tecnologias que transformaram nossos hábitos, principalmente aquelas relacionadas com o nosso dia-a-dia on-line. São pessoas acostumadas com as redes sociais e que se adaptam facilmente com novas plataformas ou grandes mudanças. São pessoas que costumam ter uma ligação maior com causas políticas, sobretudo as relacionadas com o meio ambiente e a defesa dos seus direitos. Em relação ao mercado de trabalho, são pessoas que não tratam uma carreira profissional dentro de uma empresa como prioridade.
= Feita esta apresentação descritiva das várias ‘gerações’ inter-séculos, há problemas que se colocam mais a umas do que a outras, sobretudo se tivermos em conta o mundo do trabalho, as preocupações com as gerações vindouras e mesmo atendendo às questões – mais acentuadas no após-pandemia – com a saúde psicológica e mental. Têm surgido estudos sobre esta matéria e os dados são algo sombrios.
- Os profissionais da geração millenium (30 a 45 anos) são os que têm maior risco ao nível da saúde mental e os da geração babyboom (nascidos após a segunda guerra), próxima da reforma, têm mais fatores de proteção relacionados com ambiente de trabalho saudáveis.
- As gerações do meio já estão há algum tempo a trabalhar e com casa e filhos ‘ficam mais afetadas na sua saúde mental’. Segundo um estudo de uma entidade nacional, os millenials, ‘além de se preocuparem consigo, têm de se preocupar com os filhos, porque hoje em dia a vida não é fácil, por exemplo, é ver o preço das casas, e também têm de se preocupar em muitos casos já com os pais, que estão a ficar idosos. São os mais sobrecarregados’. E isto deixa marcas em todos.
As várias gerações não são camadas à maneira de cebola, mas etapas onde todos convivem e se ajudam!
António Sílvio Couto
sexta-feira, 9 de maio de 2025
Habitação – quem a não quer ou a não têm?
Como pode um mentor político falar com propriedade do tema da habitação se a casa (ou casas) que tem lhe foi oferecida pelos pais? Saberá apreciar a casa onde mora? Como será capaz de ajudar outros a tentarem ter casa, se ele não passou por processo algum de risco ou de algum plano para ser autónomo, mesmo através do aluguer? Não andará, por aí muita gente, a encher a boca com a questão da casa, mas não ergueu uma palha para que tal fosse assumido por si? Até onde irá a chantagem de certos setores, que nunca investiram – para além do paleio barato – num assunto tão simples quão melindroso?
1. Façamos o diagnóstico do tema da casa no nosso país e na União Europeia:- Em 2023, cerca de 76% da população portuguesa era proprietária de habitação, o que representa mais de 2,9 milhões de habitações familiares. Este valor é superior à média europeia de 69,1%, onde a maior parte das pessoas vivem em casa própria;- A taxa de propriedade de habitação em Portugal diminuiu para 73,40% em 2024, em comparação com os 76% em 2023. A taxa de propriedade de habitação teve uma média de 75,19% de 2004 até 2023, atingindo o máximo histórico de 78,30% em 2021 e o mínimo recorde de 73,90% em 2019;- De acordo com os dados do gabinete estatístico da UE, a maioria das pessoas na União Europeia (UE) vive em casa própria (69,1%) e apenas 30,9% arrendam a habitação, com Portugal acima da média de proprietários (77,8%) e contra 22,2% que são inquilinos da habitação, colocando-nos no décimo primeiro lugar entre os vinte e sete.
A Alemanha (53,5%) é o único país da UE onde há mais pessoas a viver em casas arrendadas do que em próprias. 52% dos habitantes na UE vivem em moradias, 47,5% em apartamentos e 0,5% noutro tipo de habitação, como caravanas, barcos ou tendas. A maioria dos espanhóis vive em apartamentos (65,6%), seguindo-se os alemães (62,5%) e os estónios (60,8%). Portugal está no 15.º lugar desta tabela, com uma maioria de 53,3% pessoas a viverem em moradias e 46,7% em apartamentos.
2. Perante este panorama geral teremos de saber gerir as questões da habitação e não andarmos a reivindicar soluções onde queremos que sejam os outros a assumirem as nossas responsabilidades. De facto, a deslocação das pessoas do meio rural para as franjas das metrópoles de Lisboa e do Porto criaram problemas que não podem ser resolvidos com promessas eleitoralistas nem servindo os intentos estatizantes dos mais básicos e primários...populistas. Muitas pessoas deixaram-se ir na cantiga da ‘casa para todos’, mas não assumem a sua parte, continuando a viver à custa dos outros e de quem tenha investido a suas economias - como em certas épocas alguns emigrantes - na construção da casa para alugar e agora se sente defraudado pelas tendências coletivistas e de âmbito estatal...
3. Outra questão sobre a casa, que não é de somenos importância, é o arrendamento. Segundo uma entidade de defesa do consumidor, os dados seriam estes: em 2021, 22% dos alojamentos familiares clássicos (cerca de 923 mil) estavam arrendados para residência habitual, sendo, fundamentalmente, propriedade de particulares ou de empresas privadas. Destes, dois terços eram ocupados pelos mesmos inquilinos há menos dez anos. Em contrapartida, 13% dos arrendamentos duravam há 40 ou mais anos. Os restantes alojamentos (22%) eram alvo de arrendamentos com duração entre dez e os 39 anos. O valor médio mensal de renda no país era de 334 euros, mas 29% dos alojamentos estavam associados a rendas superiores a 400 euros mensais, sendo que 2% apresentavam uma renda superior a mil euros. Dois quintos dos alojamentos tinham rendas mensais que oscilavam entre 200 e 400 euros e um décimo encontrava-se abaixo dos 100 euros mensais.
4. O tema da habitação precisa de mais seriedade na discussão pública e disputa política. Tudo o resto soa a manipulação de campanha eleitoral...agora ou no futuro!
António Sílvio Couto
terça-feira, 6 de maio de 2025
Uma em cada três pessoas sofre de misocinesia
Bater com os dedos numa mesa, balançar a perna, morder a tampa da caneta ou enrolar o cabelo com os dedos são exemplos de comportamentos repetitivos que podem causar aversão ou irritação intensa a quem os observa. Segundo um estudo recente sobre esta alteração psicológica, realizado numa universidade do Canadá, designada de misocinesia, esta doença afeta uma em cada três pessoas.
1. O que é a misocinesia? Quais os síntomas? Estaremos preparados para detetarmos tal doença de índole psicológica? Como se pode ‘curar’? Será uma doença fácil de conviver? Estas e outras questões vamos tentar atender na abordagem a um tema que pode e deve ser aprofundado, particularmente para quem tem trato com outras pessoas e sobre elas fazer alguma avaliação...
2. Com raízes gregas, ‘misokinesia’ vem de “miso”, que significa ódio, e “kinesia”,que se refere a
movimentos. A misocinesia é a rejeição dos movimentos pequenos e repetitivos de outras pessoas. Eles provocam uma reação de forte intensidade. Segundo especialistas sobre este tema dizem que quem sofre desta perturbação é afetado ‘emocionalmente de forma negativa e experimenta reações como a raiva, a ansiedade ou a frustração, bem como um menor prazer em situações sociais, no trabalho e em ambientes de aprendizagem’. Ainda segundo psicólogos especialistas nesta matéria algumas pessoas ‘chegam mesmo a evitar atividades sociais por causa dessa perturbação’.
Os sintomas da misocinesia podem variar de pessoa para pessoa. No entanto, os principais sintomas são:
- Nervosismo e irritação com os movimentos repetitivos dos outros,
- Desconforto, querer sair do local ou se afastar da pessoa que realiza os movimentos repetitivos,
- Isolamento social como medida para evitar a exposição a movimentos repetitivos,
- Dificuldade de concentração e conclusão de tarefas devido ao desconforto.
3. Sendo esta doença bem mais comum do que se julgava – basta reparar que atinge uma em cada três
pessoas –, talvez seja conveniente olhar para ela com uma visão mais holística e tendo em conta a pessoa toda, isto é, na sua configuração psicológica, somática e mesmo espiritual. Sobretudo neste tempo após a pandemia tornou-se mais acutilante ter em conta as reações das pessoas aos mais díspares movimentos de reação psicológica de todos e de cada um de nós. De uma forma quase sintomática passamos a estar sob a possibilidade de nos desequilibrarmos nas pequenas como nas grandes coisas. Os outros tornaram-se para nós mais do que um espelho da nossa complexidade de trato mas também uma forrma de nos aferirmos uns diante dos outros.
4. Quem não terá já reparado que cada um de nós também reflete o ambiente em que vive. Ora, por vezes, nem sempre esse ambiente é (ou será) tão equilibrado quanto seria desejável. Também as circunstâncias de família ajudam ou complicam as condições para que o nosso desenvolvimento seja salutar.
Sem pretender desviar a atenção do tema que temos estado a refletir, dizia alguém sobre uma senhora que intervém na ‘campanha eleitoral’ sempre – a propósito ou a despropósito – traz a ‘violência doméstica’ à liça, como que dando a entender que, ou foi vítima dessa violência ou das pessoas com quem vive ou habita pode estar sujeita à tal violência... de outra forma não se compreende a fixação no tema a toda a hora e momento.
5. Temos, então, de aprofundar esta misocinesia, na medida em que, estando em condições sociais de interdependência, precisamos de cuidar uns dos outros para que consigamos construir uma sociedade – ambiente social, espaço familiar, nas condições de trabalho e até na vivência em Igreja – mais atenta aos problemas dos outros, dado que interferem com a nossa condição relacional. Seremos capazes de ajudar-nos, assim, fraterna e solidariamente?
António Sílvio Couto
sexta-feira, 2 de maio de 2025
Às mães - símbolo supremo da esperança
Convencionaram dedicar-vos um dia no calendário do ano, mas todos os dias são ‘dia da mãe’ e vós sois o símbolo supremo da esperança. Não era desta forma simples - ‘está de esperanças’ - que se vos dirigia quem vos visse em estado de gravidez? Pois, se ainda antes de nascer o/a filho/a eram vistas como sinal de esperança tanto mais o são no resto dos dias para os vossos filhos e para toda sociedade.
Com especial gratidão desejamos àquelas que são mães dizer-lhes um obrigado pela comunicação do dom da vida, claro em consonância com os pais dos vossos filhos. Sois e continuais a ser a visualização mais clara do Deus da vida, feito presença, reconhecimento e desafio: presença de um Deus que comunica a força mais intrínseca da sua essência; reconhecimento por acolherem tal dom com dedicação e cuidado; desafio a que tudo decorra voltado para Ele, senhor da vida e mestre da História.
Queridas mães, não deixeis morrer a esperança que há em vós e que nos comunicais cada vez que sois, de verdade, mães. O mundo precisa do vosso contributo para que a esperança esteja em atualização contínua e permanente. A Igreja correrá perigo sem o vosso testemunho de esperança: com gestos, palavras e sinais difundi ao longe e ao largo a força da esperança...
Saudação e cumprimentos para todas mães, hoje e para sempre!
António Sílvio Couto