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segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

Eutanásia: individualismo coletivista


Pasme-se: quem mais defende a despenalização da eutanásia são os que perfilam, preferencialmente, ideias de teor coletivista, isto é, os promotores da eutanásia consideram que a escolha individual se sobrepõe à dimensão comunitária da pessoa.

Efetivamente o que está a ser proclamado pela despenalização da ‘morte medicamente assistida’ é um direito de âmbito individual usando os meios técnicos, humanos e recursos daqueles que clamam a absorção (impostos, taxas e cobranças) pelo Estado das economias das pessoas.

Aos que contestam a iniciativa privada e tudo quanto ela significa, reclamam agora que os meios estatais (e não só) possam servir o individualismo elevado à sua maior potência.

Situações há em que aos valores estatais para prosseguir os intentos da eutanásia são associados os de caráter particular, fazendo com que os ‘perigosos’ privados tenham de participar na feitura dos atos médicos em favor da eutanásia. Isto é, para cuidar da saúde são considerados abjetos, mas para concretizar a matança já podem constar da solução… 

= Com a evolução tremenda da medicina não seria expetável que houvesse melhores condições para cuidar da vida, sobretudo em situação de sofrimento e de dor? Não faltará, em muitas das discussões (vistas e ouvidas) sobre a eutanásia, uma noção mais apropriada da dor e do sofrimento nos nossos dias? Não andaremos ainda a discutir estes assuntos enfermando de preconceitos, de estereótipos e de razões pensadas, ditas e decididas em circuito fechado…de alguma bolha pseudocientífica? Por que haverá tanta arrogância por parte de alguns setores mais exaltados – tanto pró como contra a eutanásia – em vez de vermos humildade na escuta das razões alheias? A experiência pessoal da fragilidade, na doença, não nos fará (faria) mais humanos e sinceros, sem peias de pedantismo e/ou de falsa intelectualidade? Não será que querem esconder, sob a capa de ‘medicamente assistida’, a intenção de liquidar quem possa ocupar espaços considerados necessários no (dito) serviço nacional de saúde? 

= Com toda a frontalidade é preciso proclamar: a vida não se referenda nem pode andar ao sabor dos humores – muitas vezes mais negros (no sentido de fúnebres) do que coloridos – da maioria dos políticos ou dos devotos. A dignidade da pessoa humana não pode estar sujeita às conjunturas circunstanciais de certas forças, que não a cuidam devidamente durante a vida e querem reclamar essa dignificação na hora de matar. Com que facilidade vemos surgirem do esgoto – noticioso, social, político e mesmo cultural – certas figuras secundárias, que, como no caso do aborto, vieram trazer à liça os argumentos materialistas mais primários e onde a dimensão psicológico-espiritual não tem grande conceito de reflexão nem de aceitação vivencial.  

Não deixa de ser sintomático que a maioria dos órgãos de comunicação social – televisiva, radiofónica, impressa e até no âmbito da internet – ouça com mais regularidade – e talvez com maior apreço – quem defende a eutanásia como recurso de serviço de saúde e, de forma muito menos clara e habitual, quem apresente argumentos contra a onda da eutanásia...

Os dados apresentados em favor da ‘morte medicamente assistida’ surgem como uma tendência mais ou menos aceitável, embora não sejam ditos os números nem as categorias em que se enquadram. Os promotores da facilitação da eutanásia vão conquistando um certo ascendente não confirmado, mas aduzido pelos dados induzidos. Como tantas outras iniciativas não-claras, também esta sofre do perigo da manipulação duns entendidos sem rosto nem credibilidade. 

= É notório que hoje se discute tudo e o resto mais na base dos direitos individuais do que das relações e dos deveres interpessoais, onde cada um se considera (quase) o centro do mundo ou do ‘seu’ mundinho egoísta, egolátrico e fechado. Com que facilidade vemos tanta gente a reclamar para si aquilo para o qual não contribuiu minimamente. Nesta temática da eutanásia precisamos de não nos deixarmos resvalar para alguma emotividade, mas o assunto deve continuar na área da racionalidade, procurando cada um refletir sobre o sentido da sua vida, ontem, hoje e no futuro. Assim sejamos dignos daquilo que o porvir nos reserva!       

   

António Sílvio Couto

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