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quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

Discussões numa sociedade envelhecida e podre


Há dias conversava com um padre africano e chegamos à triste conclusão que muitos dos nossos problemas, na Europa e por especial incidência em Portugal, são próprios e típicos de uma sociedade velha e envelhecida, podre embora pretensamente rica, vazia de valores à mistura com questões de quem se entretém com o secundário em vez de atender ao essencial.

A questão da eutanásia como que consubstancia estas diversas ramificações e os tentáculos mais complexos…deixando pouco espaço para percebermos que somos guiados por outros interesses que não sejam ideológicos e quase maquiavélicos.  

Enquanto noutras partes do mundo se tomam medidas para controlar a natalidade – nalguns casos através da laqueação não autorizada ou da vasectomia invasiva – aqui entretemo-nos a discutir quando se pode retirar a vida com ou sem consentimento da família. Quando em tantos lugares da Terra se tenta salvar vidas, correndo os maiores riscos daqueles que intervém, por cá fazem-se discussões e projetam-se leis para permitir matar a pedido ou sem autorização. Quando se tenta sobrepor o individual ao mais correto da convivência interpessoal, não estaremos a entrar em colapso cultural, escavando a sepultura de todos? Quando vemos a interferência da legislação no campo da consciência e da ética, não estaremos a estatizar tudo e todos, submetendo-os aos interesses de maiorias nem sempre lícitas?  

= Já dizia Nicolau Maquiavel no seu célebre livro: O príncipe – ‘não se pode chamar de valor assassinar os seus cidadãos, trair os seus amigos, faltar à palavra dada, ser desapiedado, não ter religião. Essas atitudes podem levar à conquista de um império, mas não à glória’.

Efetivamente, muitos daqueles que nos governam precisariam de umas lições mínimas para serem capazes de perceberem que, por muito que tentem disfarçar, não conseguem esconder quais os objetivos que os movem e que, muitas das vezes, são demasiado pouco subterrâneos para não serem percetíveis nas propostas que levam a serem votadas no lugar da aprovação das leis. Neste caso da discussão trazida outra vez para o público da eutanásia percebe-se que será um novo fait-divers para esconder os problemas de não entendimento em matérias laborais, após o congresso da central pró-comunista e numa quase antecipação do carnaval, cujos eflúvios já se notam… Não basta parecer, se não se é!

Claramente se vê que isso não é sério nem se pode ser levado com seriedade, pois não passa pela cabeça de ninguém que se autorize a matar – pasme-se mais uma vez o eufemismo de ‘despenalização da morte medicamente assistida’ – como se um médico possa prestar-se para matar, quando a sua função é, digna e altamente, salvar vidas. Não brinquemos com as palavras para que estas possam ainda tomadas como forma de comunicação entre os humanos… 

= Por entre tantas posições – a favor ou contra a eutanásia – é digna de reflexão a recente da Conferência Episcopal Portuguesa. O comunicado do conselho permanente diz: «Queridos profissionais da saúde: qualquer intervenção de diagnóstico, de prevenção, de terapêutica, de investigação, de tratamento e de reabilitação há de ter por objetivo a pessoa doente, onde o substantivo “pessoa” venha sempre antes do adjetivo “doente”. Por isso, a vossa ação tenha em vista constantemente a dignidade e a vida da pessoa, sem qualquer cedência a atos como a eutanásia, o suicídio assistido ou a supressão da vida, mesmo se o estado da doença for irreversível». A opção mais digna contra a eutanásia está nos cuidados paliativos como compromisso de proximidade, respeito e cuidado da vida humana até ao seu fim natural».

Esta proclamação poderá parecer uma espécie de atitude de ‘bombeiro’ a tentar apagar um fogo já a lavrar em incêndio sem controlo. Talvez devêssemos ter tido uma ação mais preventiva sobre o tema e não de conjuntura meramente reativa como nesta em que estamos. Não soubemos colher as lições – mesmo de mobilização, de esclarecimento e de dinamização – na década em que foi discutido e votado o tema do aborto. Se a vida não se referenda, e bem; então, não se peça nunca o estratagema do referendo. Se não conseguimos apresentar a vida como valor essencial e transcendente, então de pouco adiantam estes recursos…quase dilatórios. Até quando andaremos a manquejar entre a verdade e os feitiços da mentira?           

 

António Sílvio Couto

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