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terça-feira, 30 de dezembro de 2014

De alma retalhada…


Na nossa vida há momentos que deixam marcas. Na nossa experiência de vida podemos viver, muitas vezes, situações que nos fazem refletir (sobre o presente, diante do passado e para com o futuro), criando condições para nos irmos conhecendo e com a repercussão daquelas pessoas que se cruzam no nosso caminho… de forma esporádica ou modo mais ou menos estável.

Tenho por princípio que não me ofende quem quer, mas a quem eu deixo… pois, pode haver circunstâncias e fatores que fazem com que quem me pretende ofender possa esbarrar na barra da indiferença – esta é uma virtude, como nos ensina a espiritualidade inaciana e não o defeito do desprezo, à maneira do mundo – e outros momentos em que uma simples palavra ou um gesto de quem esperávamos compreensão e ânimo nos possa destruir senão o espírito ao menos a alma, melindrando até a dimensão corporal.

Nem tudo pode ser valorizado de igual modo, mas há etapas da nossa vida em que podemos estar mais vulneráveis e sensibilizados para pequenas (que não mesquinhas) ‘ofensas’… quantas delas caldeadas com a necessidade de sabermos entender a vida e os sinais da condução de Deus para connosco.

= Em jeito de balanço… e projeção

Tudo isto pode ser mais acutilante ao final de um ano civil, pois os dias e os meses acumulam em nós boas e más experiências, razoáveis e diversas vivências, onde cada aspeto pode ganhar outro significado devido às expetativas que podemos ou não alcançar.

Pelo espaço de cinco anos aconteceu na mesma data – isto é, por estes dias – a perda de dois padres bastante idosos. Num como noutro caso senti-me entristecido, tanto pela perda, quanto pelas consequências na não-substituição por outros mais novos nos seus lugares…

Há cinco anos como agora, tenho estado a rezar a via-sacra para a próxima quaresma. É um hábito que tenho vindo a viver: no tempo de natal estou a preparar a vivência da páscoa. É algo interessante e de frutuosa ‘ginástica’ espiritual: o nascimento e a morte de Jesus unem-se em mistério de encarnação redentora.

Neste ambiente como que se sacode a consciência: como podemos ser insensíveis aos outros, quando Jesus veio tomar carne humana e pelo sofrimento redentor deu sentido aos pequenos achaques do nosso dia-a-dia! Há como que uma luta contra a superficialidade com que tantos correm para sorverem a espuma do espumante e do tempo que escorre, deixando perder a possibilidade de viver o essencial… Não há nisto qualquer juízo sobre nada nem sobre ninguém, mas antes uma simples inquietação para perceber como, no tempo que passa, podemos deixar escapar (ou não) a eternidade em cada momento de vida.

De alma retalhada vejo e sinto tanta gente que sofre (doenças e solidões)… e poucos lhe ligam, pois estão ocupados consigo mesmos.

De alma retalhada vejo e acolho as vítimas da difamação… enquanto os acusadores se escondem.

De alma retalhada escuto e sinto quantos são vítimas do ódio humano e das tragédias da natureza… e confio ao Deus da misericórdia que lhes dê paz e consolo.

De alma retalhada observo as futilidades de tantos que se divertem sem olhar a meios nem a recursos… como se não houvesse amanhã.

De alma retalhada sinto a dor de tantos que desconhecem, abandonam ou desprezam Deus… Esse que é capaz de dar resposta e de motivar a mudança de vida e de comportamentos, já.

 

António Sílvio Couto

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