Foram
imagens assaz repetidas essas da libertação de alguns animais apanhados pelos
fogos. Dizemos fogos florestais e outros mais incandescentes em maré de
promoção de uma nova cultura, essa onde dá a impressão que a vida humana está
subjugada aos interesses animais, seja qual for a ideologia onde se alicerça,
seja o espaço onde se tenta implantar tal regime…Dá a impressão que estamos a
caminha segundo um projeto de neo-paganização, não só pelos critérios de vida e
de moral, como pela exaltação do culto dos animais, onde cada um simboliza um
deus, capaz de satisfazer as pretensões (ditas) culturais…dos humanos.
Eis que,
de repente, emergiram do tugúrio do anonimato certos defensores pela reclamação
de que umas dezenas de cães e gatos estariam em risco de vida. Mas por onde
andavam, quando ninguém cuidou deles e os conseguiu recolher? Não sei nem me
importa se, quem tinha arrecadado os animais, recebia algum subsídio por
exercer tal função. Se recebia, devia ser fiscalizado, se não usufruía de nada
e dispunha dos seus meios para fazer tal ação, questiono onde estiveram todos –
incluindo autoridades sanitárias e de segurança – sem terem visto tal perigo,
antes que isto viesse a acontecer.
Foi algo
revelador dessa nova mentalidade/cultura que para salvar alguns animais se
possa colocar em causa a vida humana. Independentemente de quem recolheu os
animais dever ser chamado à responsabilidade, não pode admitir que haja
agressões às pessoas, pondo, inclusive, a vida em perigo. Os excelentíssimos
animais saíram da jaula e andam à solta a fazer justiça pelas próprias mãos. Os
venerabilíssimos animais tomaram o foro de personalidade jurídica, subjugando
os miseráveis humanos e quem ainda os possa considerar com dignidade.
Quando
via as imagens enternecedoras dos salvadores dos animais, bailava no meu
interior um questionamento atroz…numa catadupa de sentimentos, de perguntas e
até de medos sobre o nosso futuro coletivo:
- fariam
aqueles heróis por uns velhos em incêndio do lar (tanto em casa como nalguma
instituição) aquilo que tão arrojado faziam pelos animais? A ver pelo desprezo
a que muitos velhos são votados, eles não valerão muito menos do que tantos
animais?
- Os
critérios de vida dos nossos contemporâneos não estarão a modificar-se, tendo
mais em conta os seus interesses mais sórdidos do que os valores humanos
básicos?
- Muitos
dos cultivadores da cultura exaltadora dos animais não andarão com as emoções
submergindo a racionalidade pessoal e a inteligência alheia?
- A
psicologia da substituição do filho pelo cão/gato não nos fará pagar caro esta
confusão de ideias e de comportamentos?
- Serão
os cães/gatos de companhia e de estimação que suportarão o futuro da segurança
social e das reformas dentro de parcas décadas?
Muitas
outras questões continuo a ter, mas receio que possa ser considerado fora do
tempo ou até podendo receber algum epíteto terminado em ‘fobia’! No entanto,
penso que, mesmo defendendo os animais, não podemos questionar a nossa
civilização, ainda feita por homens e mulheres, que são conduzidos pela
racionalidade, guiados pela emoção/afetividade e ancorados na vontade… tudo o
resto poderá ser perigoso a médio e a longo prazo!
António
Sílvio Couto
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