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segunda-feira, 10 de junho de 2024

Equívocos (destas) eleições europeias

 

Três meses depois de termos votado para as eleições legislativas antecipadas, a 10 de março, fomos chamados - como estava previsto - a eleger os nossos vinte e um representantes no Parlamento Europeu. Dada a proximidade entre os dois atos eleitorais, houve quem quisesse fazer das ‘europeias’ a segunda volta das legislativas, com dados suscetíveis de a tal conduzirem, foram introduzidas diversas nuances entre uma e outra eleição e logo será necessário não fazer do que é diferente algo que pareça igual. Ou só se atende ao que beneficia quem ganha, mesmo que modificadas as regras?

1. O método de votação mudou: agora, em junho, teve a modalidade de votação em mobilidade, que estava a ser preparada para este ato e não tinha condições por ocasião de março. Facilitou a procura do exercício cívico, mas, mesmo assim, não foi tão expressivo que como seria desejável. A abstenção em março foi de 40,2%, agora em junho cifrou-se nos 62,94%, mesmo assim abaixo do que acontecera nas eleições europeias de 2019, onde foi atingida a mais alta fasquia de não-participação (68,89%) neste tipo de eleições. Certamente que esta experiência do voto em mobilidade poderá ser valorizada em próximos momentos de votação, mesmo que isso possa desvirtuar a real inserção de quem vota, onde...

2. Resultados e percentagens - comparável ou descartável? Nas eleições de março a AD ganhou com 29,05 % e o segundo classificado com 28,66 %; em junho, o PS conseguiu 32,09 % contra 31,12 % da AD. A diferença em votos em março foi de 51.480 votos e agora em junho foi de 38.511 em favor do PS. De todos os casos o mais flagrante foi a acentuada descida do Chega em junho com 9,79% (386.379 votos), enquanto em março conseguira 18,06% (1.108.797 votos). Neste breve espaço de três meses já podemos verificar mudanças, umas circunstanciais e outras podendo ser conjunturais, sobretudo se isso quiser falar mais para o futuro do que esmiuçando o passado...

3. Haverá uma onda protecionista a certas figuras e ideologias? Depois de tantas vezes a acertar pelo mesmo diapasão nota-se uma vaga de fundo quanto a alguns setores da esquerda, seja mais tácita (ou tática) ou orientada: a cobertura das campanhas e iniciativas estão sob a influência de filtros mais ou menos detetáveis. Para quem já andou nessas lides - há cerca de quarenta anos - e aprecia as ´noites eleitorais’ não custa a ver que pequenos nadas fazem a diferença, desde o ângulo da imagem até às declarações selecionadas, passando - por que não! - pela forma como é apresentada a notícia. o facto, o fait-divers ou mesmo o singelo comentário de remate da peça, televisiva, radiofónica ou escrita... tudo tem uma intenção. Importa descobrir qual é ou o que pretende... A máquina montada para exaltar o candidato da IL foi, nestas eleições um exemplo acabado de como se pode vender um produto mesmo que dele não precisemos: houve excelso de adjetivos quando se falava desta força e do que lhe estava adstrito. Muitos jornalistas vestiram a fatiota de jornaleiros para não deixarem cair uns ou para atulharem outros...

4. Temas afunilados e medos empolados? Estando a escolher quem nos vai representar no Parlamento Europeu - 21 em 750 - não deixamos de nos entretermos com questiúnculas de lana-caprina das tricas intestinas. Habilidosamente - como sempre nesta arte da manipulação - fomos atrás de temas de somenos: alguns não conseguiram sair da cassete com anos de rotação. Outros andaram a escarafunchar subprodutos de baixa ética e pior moralidade. Vivemos numa espécie de carnaval ao retardador ou num big brother intriguista. Enquanto se fala da extrema-direita, evita-se perceber os riscos da esquerda radical. Enquanto se traz para a rua a questão dos emigrantes não se enfrentam as possíveis consequências do inverno demográfico na Europa. Enquanto se olha para o que divide (povos, nações, países e culturas) corre-se o risco de não se construir o que, de verdade, nos une.

5. Numa visão global sobre estas eleições europeias poderemos considerar: na noite em que, se dizia, tudo ia mudar foi, afinal, a noite em que quase tudo ficou na mesma!



António Sílvio Couto

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