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segunda-feira, 15 de abril de 2024

Rebuscos ao ’25 de abril’

Com a aproximação ao cinquentenário da revolução do ’25 de abril’ emergiram sinais de análise que nos devem fazer refletir: o que é a liberdade? Há donos e senhores da liberdade? O que é a democracia? Quem pode ser considerado democrata? A cultura tem de ser só de esquerda? Quem não perfila os valores marxistas-leninistas-trotskistas tem direito a ter opinião? Onde começa e como acaba a definição de respeito pela vontade popular? O conceito de ditadura será unívoco ou tem abrangência plural? Deve-se cultivar a meritocracia ou temos de suportar quem é apresentado à votação? O que teve maior significado – social, cultural e económico – a ‘revolução de abril? (de 1974) ou a adesão à União Europeia (em 1986)?

1. Liberdade – entre a cantarolice e o exercício deste salutar direito e dever, respeitando e sendo respeitado – muitos clamam ‘liberdade’ mas só conhecem os trâmites da sua, por vezes, nem sempre respeitadora das diferenças (opiniões, posições e pontos de vista) dos outros. Certos tiques sobre a ‘liberdade’ não passam de arremedos de ditaduras. Repare-se nas lutas em favor da liberdade nalgumas latitudes, que se convertem em promoção da intolerância noutros espaços. Um facto incontornável é o prolongar do exercício autárquico, sobretudo ao sul do Tejo, nalgumas situações quase prefazendo os mesmos anos da ditadura derrubada no ’25 de abril’… Certas povoações viveram cerca de um século em regime ditatorial, antes no ‘estado novo’ (48 anos) e depois (outros tantos) sob a tutela de forças opostas àquele. Liberdade é algo mais alto e profundo do que slogans na ‘descida da avenida’ em Lisboa…

2. Da democracia conhecemos os resultados – em cinquenta anos tivemos seis governos provisórios e vinte e quatro governos constitucionais… com sete presidentes da república – que, por serem tão lestos no poder, quase confundem governar com o estar no poder ao serviço dos seus. Há quem duvide em que ‘república’ estamos, se na terceira ou na quarta, isto é, tendo em conta as tendências ideológicas mais ou menos reinantes e imperiosas. Efetivamente o conceito de ‘democrata’ flutua ao sabor das maiorias no parlamento ou na sociedade. A (dita) polaridade entre direita e esquerda serve como que a um jogo de luzes-e-de-sombras nem sempre claras e tão pouco clarificadas. Cinco décadas decorridas temos um longo caminho a percorrer, sabe-se lá com que resultado ou futuro…

3. De entre os diversos critérios e valores difundidos pela psicologia derivada do ’25 de abril’, a ‘cultura’ serve para o que a cada um interessa, deixando quase em manifesto que muitos são ignorantes com verniz cultural a gosto. Sem grande esforço se percebe que a ‘cultura’ tem de ter as marcas da ideologia de uma esquerda mais ou menos anti-cristã: vivem os criadores culturais sob o chapéu do estado, clamando por subsídios e às custas do que cai da mesa do poder, mesmo autárquico… Pouco ou nada que tenha marca dos valores cristãos tem acesso à classificação de ‘cultural’, embora muitas das produções possam ser de qualidade, mas fora da caixa da normalidade marxista reinante… O exemplo mais recente é a publicação do livro: ‘Identidade e família’, como o retrato bem claro de que nós, os cristãos, temos de respeitar as opiniões dos outros, mas o inverso não se coloca!

4. No conjunto destas cinco décadas de ‘democracia’ fomos chamados, ao nível nacional, a votar muitas e diversas vezes: em dezassete momentos nas legislativas; dez para as presidenciais; treze para as autárquicas; oito para as europeias e ainda três referendos (dois sobre o aborto e um sobre a regionalização), estes não vinculativos porque com participação inferior a cinquenta por cento do recenseados… Embora a abstenção tenha sido o ‘setor’ mais representativo, em muitos destes atos eleitorais criou-se a mentalidade de que votar ou não votar tinha o mesmo significado. Por vezes fomos assistindo a leituras enviesadas dos resultados, com partidos a ganharem sempre, embora derrotados e, noutros casos, a criar soluções pouco respeitadoras da vontade popular expressa.

5. Cinquenta anos cumpridos sobre o ‘25 de abril’, talvez este não fosse possível nas condições atuais!



António Sílvio Couto

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